Exclusivo: Por que Bo Xilai caiu e Xi Jinping desapareceu (Parte 2)

31/10/2012 17:40 Atualizado: 20/04/2014 21:32
A história do desaparecimento de 14 dias de Xi Jinping
O vice-presidente chinês Xi Jinping em 29 de setembro de 2012. (Feng Li/Getty Images)

Em 15 de agosto, um grupo de 14 pessoas conduziu barcos de Hong Kong para as ilhas Diaoyu, chamadas Senkaku no Japão. Sete do grupo desembarcaram carregando bandeiras chinesas e declararam que as ilhas pertenciam à República Popular da China. Eles foram quase imediatamente detidos pela guarda costeira japonesa.

O desembarque nas ilhas foi uma faísca na palha seca do nacionalismo chinês e no ódio pelo Japão e a China entrou em erupção. Manifestações anti-Japão em massa eclodiram em grandes cidades por toda a China. Entre os slogans que os manifestantes carregavam estava, “As ilhas Diaoyu pertencem à China, Bo Xilai pertence ao povo.”

A mídia mundial informou sobre estas manifestações como a última expressão do nacionalismo chinês e os entendeu no contexto das tentativas da China de afirmar reivindicações no Mar da China Meridional. Fontes com conhecimento das deliberações nos níveis mais altos do PCC, consultadas pelo Epoch Times para este artigo, contam uma história diferente.

Hu Jintao, o líder do Partido Comunista Chinês (PCC), viu o desembarque nas ilhas como uma declaração de guerra da facção de Zhou Yongkang e do ex-líder chinês Jiang Zemin contra Hu Jintao, o premiê Wen Jiabao, o indicado próximo líder Xi Jinping e seus partidários.

Uma reunião em maio no Hotel Jingxi em Pequim foi destinada a trazer a paz entre os dois grupos beligerantes. Hu Jintao se reuniu com 200 das figuras do topo do PCC e fez um acordo.

Zhou Yongkang e outros seriam autorizados a se separarem de Bo Xilai e não seriam implicados em sua queda. Zhou Yongkang poderia ter uma presença pública até o 18º Congresso do PCC, mas se aposentaria completamente após o congresso. Ele também abriria mão do direito de nomear seu sucessor como chefe do Comitê dos Assuntos Político-Legislativos (CAPL), um órgão todo-poderoso do PCC que controla quase todos os aspectos da aplicação da lei.

Os linhas-duras do PCC concordaram em apoiar limitadas reformas políticas, que incluiriam “eleições livres de alto nível”, e a província de Guangdong seria usada como área de teste para as reformas. Os líderes veteranos do PCC ajudaram a promover a reunião de Jingxi, mas os dois lados apresentaram agendas diferentes.

Nos meses após a tentativa de deserção de Wang Lijun em 6 de fevereiro, Zhou Yongkang foi fortemente pressionado por Hu Jintao e Wen Jiabao. Ele foi colocado sob controle interno e não mais deliberava no CAPL. Os mais próximos dele na poderosa organização foram removidos e mudanças institucionais foram acordadas para reduzir o poder da organização no futuro.

Zhou Yongkang tinha razão para temer que, se ele não aceitasse um acordo, ele seria processado como Bo Xilai. Hu Jintao havia percebido que os crimes de Bo Xilai envolviam inúmeros oficiais do PCC. Se todos os culpados fossem julgados, o PCC se fragmentaria. Hu Jintao concordou com o negócio de Jingxi para salvar o PCC.

Ao mesmo tempo, as notícias econômicas na China eram terríveis. O chefe de gabinete do Conselho de Estado disse numa reunião que os dínamos econômicos da China, as províncias de Shanghai e Zhejiang, não registraram crescimento de 7% em relação ao ano passado como foi relatado, mas que suas economias na verdade haviam contraído.

Muitas empresas na cidade outrora próspera de Dongguan foram à falência. Os governos locais estavam tendo problemas com a folha de pagamento. Economistas previam um “pouso forçado” para uma economia chinesa que de repente parecia estar em queda livre. Ambos os lados reconheceram que as más notícias econômicas eram uma ameaça para o próprio PCC e assim concordaram em trabalhar juntos.

Lei marcial

O acordo, porém, não mudou a situação básica enfrentada pela facção de Jiang Zemin. Zhou Yongkang, o ministro da propaganda Li Changchun e outros da facção de Jiang Zemin não podiam aceitar perder o poder.

Se o PCC fosse liderado por Xi Jinping, que não estava diretamente envolvido na perseguição ao Falun Gong, ele poderia acabar com a campanha. Uma vez que a perseguição acabasse, a pressão para responsabilizar os culpados pelos crimes cometidos durante a perseguição seria imensa.

Milhões de chineses foram torturados e submetidos à lavagem cerebral. O Centro de Informações do Falun Dafa pode confirmar a morte de mais de 3.500 praticantes de Falun Gong por abusos, mas reconhece que o número real é de dezenas de milhares. Muitos mais foram gravemente feridos.

De acordo com pesquisas feitas por David Kilgour, o ex-secretário de Estado canadense para a Ásia-Pacífico, e pelo advogado canadense dos direitos humanos David Matas, entre 2000-2005, pelo menos 41.000 praticantes foram assassinados por meio da colheita forçada de seus órgãos. De acordo com Matas, a cada ano cerca de 8.000 praticantes são assassinados para a colheita de órgãos, o que significa que o número total já se aproxima de 100 mil. Uma geração de órfãos foi criada, famílias em toda a China foram destruídas; carreiras e meios de subsistência arruinados; casas perdidas.

Para evitar ser responsabilizada pelas atrocidades, a facção de Jiang Zemin sabia que tinha de manter um controle rígido do poder. Após a reunião de Jingxi, os líderes da facção frequentemente se reuniram, discutiram e esperaram uma oportunidade.

Com o renascimento da controvérsia sobre as ilhas Diaoyu, a facção viu sua chance. Naquele verão, barcos que pretendiam levar chineses numa missão para recuperar as ilhas foram várias vezes interceptados pelo regime chinês.

O desembarque de 15 de agosto foi autorizado pelo chefe-executivo de Hong Kong, Leung Chung-ying, que trabalhando com o Departamento de Trabalho da Frente Unida (DTFU), arranjou barcos de pesca de Hong Kong para a empreitada.

Leung Chung-ying era um protegido de Zeng Qinghong, que por sua vez era um dos principais aliados de longa data de Jiang Zemin. Zeng Qinghong, um ex-membro do Comitê Permanente do Politburo e atual chefe do Congresso Nacional Popular, há muito dava as cartas em Hong Kong.

O DTFU é responsável por fazer alianças com organizações afiliadas secretamente ao PCC e trabalhar com elas para atacar inimigos do PCC. Esse departamento também controla uma ampla rede de espiões. O DTFU era a última instituição do PCC ainda controlada pela facção de Jiang Zemin e era liderado por Du Qinglin, um leal a Jiang Zemin.

A Frente Unida usou a mídia chinesa no estrangeiro para aumentar a temperatura na controvérsia sobre as ilhas Diaoyu, evocando emoções nacionalistas e exigindo ação.

A facção de Jiang Zemin queria usar os protestos em massa para pressionar Hu Jintao e Xi Jinping. Ao trazer a China à beira da guerra com o Japão, a facção poderia então pedir preparativos de guerra, que incluiriam instituir lei marcial. O 18º Congresso do PCC e a instalação da nova liderança teriam de ser adiados e Zhou Yongkang e outros poderiam permanecer no poder por um longo tempo.

Uma guerra de informação aumentou a pressão. No final de agosto, a facção de Jiang Zemin usou seus contatos na Frente Unida para espalhar mundialmente o boato de que Hu Jintao cederia o controle sobre os militares após o 18º Congresso, aumentando a sensação de que os eventos estavam fora de controle.

Zeng Qinghong rondava privadamente entre os oficiais do PCC, argumentando que o PCC tinha de recorrer à lei marcial para lidar com as ilhas Diaoyu e as crises econômicas. Eventos em Hong Kong adicionaram pressão sobre Hu Jintao, Wen Jiabao e Xi Jinping.

Leung Chun-ying, ao assumir seu gabinete em 30 de junho, começou imediatamente a promover o Plano Nacional de Educação. Este currículo é considerado em Hong Kong como uma tentativa de fazer lavagem cerebral nas crianças da cidade e provocou semanas de grandes protestos em Hong Kong. A promoção da Educação Nacional visava irritar o povo de Hong Kong, causar tumulto e criar problemas para Hu Jintao e Wen Jiabao antes do Congresso Nacional.

Quando Gu Kailai, a esposa de Bo Xilai, recebeu uma sentença suspensa em 20 de agosto pelo assassinato do empresário britânico Neil Heywood, espiões da Frente Unida começaram a plantar histórias em todo o mundo, a fim de deslegitimar seu julgamento e qualquer ação disciplinar contra Bo Xilai.

Informações foram divulgadas de que a réu que apareceu no julgamento de Gu Kailai não era ela, mas uma sósia. Uma história foi plantada de que o julgamento de Gu Kailai foi “sequestrado” pelos inimigos de Bo Xilai e estava sendo usado como parte de um esforço para destruí-lo. Também foi espalhado o boato de que Zhou Yongkang ajudaria Bo Xilai a reverter o veredito original e obter um novo julgamento para Gu Kailai.

Websites de língua chinesa fora da China citaram um dos “assessores de confiança” de Zhou Yongkang em 3 de setembro, dizendo que Zhou Yongkang disse privadamente muitas vezes que Gu Kailai não assassinou Heywood. O assessor também disse que Zhou Yongkang visitou Bo Xilai e Gu Kailai algumas vezes nos últimos meses. Zhou Yongkang teria dito que Bo Xilai acredita que a escuridão passará rapidamente e que ele definitivamente verá o sol nascer.

Contra-ataque

Em 29 de agosto, o voo CA981 da Air China foi forçado a fazer uma volta de emergência para Pequim depois de voar por sete horas para Nova York. Uma fonte disse ao Epoch Times que uma espiã chamada Sra. Ding, que trabalha para o DTFU, foi presa assim que o avião pousou em Pequim e Hu Jintao ordenou pessoalmente o retorno do voo.

Em 1º de setembro, o PCC anunciou três grandes mudanças de pessoal em um dia, um acontecimento bastante incomum. Du Qinglin foi subitamente retirado de seu posto como diretor do DTFU. Ele foi substituído por Ling Jihua, o chefe de gabinete de confiança de Hu Jintao que conduziu o trabalho para derrubar os comparsas de Bo Xilai. Li Zhanshu, um aliado da facção da Liga da Juventude Comunista de Hu Jintao e íntimo de Xi Jinping, sucedeu Ling Jihua como chefe de gabinete.

Em 5 de setembro, a mídia estatal Xinhua anunciou que Wang Lijun seria julgado. Também em 5 de setembro, Hu Jintao proibiu que Leung Chun-ying fosse à Rússia participar da reunião da APEC. Isso deixou o novo chefe-executivo de Hong Kong muito mal internacionalmente, mostrando como os oficiais do PCC desconfiavam dele. Este ato também sinalizou para o povo de Hong Kong que Leung Chun-ying que não estava seguindo ordens de Hu Jintao ou Wen Jiabao. Em 9 de setembro, Leung Chun-ying anunciou o Plano Nacional de Educação seria suspenso em Hong Kong.

As ações da facção de Jiang Zemin colocaram Xi Jinping e seus aliados contra a parede. Xi Jinping podia ver claramente que se os eventos continuassem sem controle como vinha acontecendo, ele e seus aliados seriam criticados dentro e fora do PCC. Não podendo recuar, Hu Jintao e Xi Jinping se reuniram para atacar.

Problema de saúde de Xi Jinping

Enquanto isso, Hu Jintao e Xi Jinping começaram a contra-atacar a facção de Jiang Zemin; Xi Jinping pediu para ser deixado fora de se tornar o próximo líder chinês.

Numa reunião do Politburo no final de agosto, Xi Jinping disse que só estava disposto a ser um membro do Comitê Central do PCC e de participar na construção e desenvolvimento do PCC. Isso chocou a todos em Zhongnanhai, o complexo da liderança do PCC em Pequim, e a qualquer outra pessoa que o conhecia.

Em 4 de setembro, Xi Jinping cancelou uma reunião com a secretária de Estado estadunidense Hillary Clinton e sumiu de vista e todos começaram a especular sobre o que estava acontecendo. Xi Jinping foi originalmente escolhido porque ele era aceitável para ambos os lados. Não havia ninguém para substituí-lo e, se ele recuasse, ambas as facções julgavam que o PCC ruiria imediatamente.

Veteranos do PCC surgiram e tentaram mediar. Qiao Shi, Li Ruihuai, Zhu Rongji e a poderosa família de Ye Xuanning chegaram a um acordo e expressaram seu apoio a Xi Jinping.

Durante os 14 dias do desaparecimento de Xi Jinping da vista pública, um novo consenso foi alcançado no PCC: o 18º Congresso se reuniria em 8 de novembro; a vida política de Bo Xilai estava acabada; o PCC eliminaria sistematicamente a influência residual da Grande Revolução Cultural e gradualmente descartaria o pensamento de Mao Tsé-gung, o marxismo-leninismo e assim por diante.

Em 19 de setembro, Tung Chee-hwa, o ex-chefe-executivo de Hong Kong, inesperadamente deu uma entrevista à CNN. Ele disse que Xi Jinping machucou as costas quando nadava, o que o levou a desaparecer por duas semanas. Além disso, o Tung Chee-hwa mencionou casualmente a opinião comum de que o Xi Jinping certamente se tornaria chefe do PCC.

Sombra de Bo Xilai

Desde que Wang Lijun, o vice-prefeito, chefe de polícia e capanga de Bo Xilai, fugiu para o consulado dos EUA em Chengdu em 6 de fevereiro, a liderança do PCC tem visto suas opções gradualmente se estreitarem.

Expor as atrocidades cometidas pela facção de Jiang Zemin produzirá tal descrédito no PCC diante do povo chinês, que ele perderá sua capacidade de governar. Não expor as atrocidades da facção de Jiang Zemin permite que ela permaneça politicamente viável. A facção de Jiang Zemin sabe que se perder o poder, poderá ser acusada de crimes terríveis. Ela só pode se proteger tomando o poder.

Mas, se a facção de Jiang Zemin for autorizada a continuar no poder, todas as esperanças pela reforma na China acabariam. Com o descontentamento popular crescendo diariamente, a ausência de reforma também significa o provável fim do PCC.

No Hotel Jingxi em maio, Hu Jintao tentou se equivocar: a facção de Jiang Zemin seria preservada em troca do fim das lutas internas e pelo início da reforma política. Mas o verão na China viu mais uma tentativa da facção de Jiang Zemin de manter o poder e ameaçar Hu Jintao e Xi Jinping.

Na primeira quinzena de setembro, após a tentativa de Xi Jinping de renunciar, o PCC optou por prosseguir com o caso de Bo Xilai. A preocupação, mais uma vez, era encontrar uma maneira de salvar o PCC. A reação ao anúncio da Xinhua em 28 de setembro que Bo Xilai será basicamente acusado por corrupção mostrou como é realmente frágil o novo consenso do PCC. As autoridades provinciais não mostraram, como fizeram quando Bo Xilai foi removido do poder em Chongqing em 15 de março ou do Politburo em 10 de abril, “um apoio entusiástico pelo Comitê Central do PCC”.

Os crimes dos quais Bo Xilai está sendo acusado são comuns entre os oficiais do PCC. Muitos poderiam facilmente ser acusados como Bo Xilai foi. Além disso, denúncias de corrupção em si mesmas não acabarão com a carreira política de Bo Xilai. Elas deixam em aberto a possibilidade de um retorno. Ao mesmo tempo, incriminar Bo Xilai sem eliminar a facção que o apoia torna possível que no futuro Hu Jintao, Wen Jiabao e Xi Jinping possam ser cobrados por serem “incapazes” de resolver o caso de Bo Xilai.

Após o 18º Congresso Nacional, se Xi Jinping ainda estiver em minoria e não for capaz de eliminar seus adversários políticos, as autoridades locais podem querer se proteger e hesitar expressar fidelidade a ele. Os maoístas do PCC não desapareceram. Nas manifestações anti-Japão em massa em meados de setembro, o slogan “Bo Xilai pertence ao povo” estava mais uma vez bem visível.

Assim como membros da facção de Jiang Zemin são forçados pela lógica de sua situação a tentar manter o poder para sua sobrevivência, assim também Xi Jinping poderá descobrir que sua sobrevivência depende de responsabilizar aquela facção por seus crimes.

Epoch Times publica em 35 países em 19 idiomas.

Siga-nos no Facebook: https://www.facebook.com/EpochTimesPT

Siga-nos no Twitter: @EpochTimesPT