Alguns ratos expostos ao tipo de radiação que astronautas terão de suportar durante longas missões no espaço profundo – região do espaço bem além do sistema solar – desenvolveram lapsos de atenção e mostraram uma diminuição no tempo de reação, mesmo quando a exposição foi em seu nível mais baixo, dizem os pesquisadores.
“Esses distúrbios cognitivos – encontrados em alguns dos ratos testados, mas não em todos – parecem estar ligadas a mudanças que ocorreram nas proteínas dos cérebros dos ratos afetados”, disseram os pesquisadores.
“Se ocorrer o mesmo aos humanos, será possível evitar que astronautas, que têm esse fator biológico que os torna vulneráveis à radiação, sejam escolhidos para serem enviados ao espaço profundo”.
“Quando os astronautas estão fora do campo magnético da Terra, as naves espaciais oferecem alguma proteção à exposição à radiação”, disse o líder do estudo, Robert D. Hienz, professor de biologia comportamental na Faculdade de Medicina da Johns Hopkins University.
“No entanto, quando eles fazem caminhadas espaciais ou quando trabalham fora da nave espacial, eles estão totalmente expostos aos efeitos da radiação proveniente de explosões solares e de raios cósmicos”, disse o professor Robert. Uma vez que nem a Lua nem Marte tem um campo magnético de abrangência planetária, os astronautas que pousarem neles estarão expostos a níveis elevados de radiação. No entanto, nem todos serão afetados pela radiação, conforme as pesquisas do professor Robert revelam.
“Nos ratos que irradiamos, descobrimos que somente de 40% a 45% deles tiveram deficit de atenção; os demais não mostraram sinais de terem sido afetados”, diz Robert. “Se isso também ocorrer em humanos, poderemos identificar aqueles mais susceptíveis aos efeitos da radiação antes de eles serem danosamente expostos à radiação em missões espaciais, e assim, seremos capazes de mitigar os danos”.
Se os limites biológicos desse fator responsável por essa susceptibilidade à radiação puderem ser identificados nos seres humanos, isso poderá ter implicações que que vão além das viagens espaciais. Poderá, por exemplo, ajudar os médicos a determinarem a melhor forma de tratar pacientes com tumores cerebrais ao identificar aqueles com maior sensibilidade a tratamentos por radiação.
Estudos anteriores mostraram que ratos expostos à radiação apresentam deficiências na realização de tarefas básicas de aprendizagem e em tarefas em labirintos. O novo estudo, publicado na Radiation Research, concentrou-se em testes, semelhantes aos autotestes que os astronautas da Estação espacial International fazem antes de tarefas críticas, para determinar se estão aptos a realizá-las, por exemplo, para saber se estão aptos a fazerem caminhadas espaciais. Testes semelhantes são usados também em soldados, pilotos de avião e caminhoneiros que realizam longos trajetos.
Sensibilidade à radiação
Num desses testes, o astronauta deve tocar na tela de um dispositivo portátil toda vez que a luz dos LEDs de um contador luminoso aparecer na tela. Um tempo de reação considerado como normal é inferior a 300 milissegundos. Os ratos testados, de modo semelhante, foram ensinados a tocar com seus narizes num botão luminoso toda vez que o botão era aceso para, assim, medir o tempo de reação deles.
Os ratos foram primeiramente treinados para os testes na Johns Hopkins University e depois levados ao Brookhaven National Laboratory, em Upton, Nova York, onde há um aparelho que produz prótons de alta energia e partículas iônicas de forte radiação iguais às normalmente encontradas no espaço profundo. As cabeças dos ratos foram expostas a diferentes níveis de radiação aos quais os astronautas estão normalmente expostos durante missões de longa duração. Os ratos foram então trazidos de volta para a Universidade Johns Hopkins para serem estudados todos os dias durante 250 dias.
Todos os animais sensíveis à radiação (19 ratos de 46) mostraram ter deficiências cognitivas, as quais começaram entre 50 e 60 dias depois de a exposição à radiação e que continuaram até o final do estudo.
Dos animais sensíveis à radiação, 64% mostraram lapsos de atenção, 45% mostraram elevações nas respostas a estímulos e 27% mostraram tempos de reação mais lentos. Os problemas não dependeram da dose da radiação a que foram expostos. Alguns dos ratos não se recuperaram totalmente de seus deficits cognitivos, enquanto que outros tiveram alguma recuperação ao longo do tempo.
Precauções nas caminhadas espaciais
“O sistema de transporte da dopamina parece ter sido afetado nos cérebros dos ratos sensíveis à radiação”, disse Catherine M. Davis, uma pós-doutorada em psiquiatria e ciências comportamentais, e autora principal do estudo. “Muito provavelmente, esse neurotransmissor [dopamina], que desempenha papel nas funções de vigilância e atenção, não é transmitido do modo que deveria ser para que o cérebro funcione adequadamente”, disse ela.
“Os seres humanos com maiores variações genéticas relacionadas ao transporte da dopamina”, acrescentou ela, “foram os que apresentaram piores resultados nesse tipo de teste de adequação mental dadas aos astronautas e, de modo semelhante, aos ratos”.
Catherine disse que não gostaria de ver astronautas sensíveis à radiação sendo impedidos de participar de futuras missões espaciais à Lua ou a Marte, no entanto, ela quer que os astronautas saibam do problema para assim poderem tomar precauções especiais para proteger seus cérebros, isto é, vestindo roupas com blindagem extra ou, até mesmo, não realizando caminhadas no espaço.
“Tal como acontece em outras áreas da medicina personalizada, nós procuramos criar tratamento e planos de prevenção individuais para os astronautas que acreditamos seriam mais susceptíveis a deficits cognitivos da exposição à radiação”, disse ela.
“Atualmente, os astronautas não são tão expostos aos efeitos nocivos da radiação”, disse Catherine, “porque a Estação Espacial Internacional voa numa órbita baixa o suficiente para que o campo magnético da Terra possa fornecer certa proteção. Porém, a NASA, trabalhando a partir de metas traçadas na Política Espacial Nacional dos EUA, está desenvolvendo planos para enviar seres humanos a um asteróide em 2025 e para Marte em 2030”.
Outros pesquisadores da Johns Hopkins University e da American University também contribuíram para a realização do estudo. Enquanto equipes dessas Universidades estudam os efeitos da radiação sobre o cérebro no espaço profundo, outros grupos de pesquisa financiados pela NASA estão olhando para os efeitos potenciais sobre outras partes do corpo e sobre os possíveis riscos de câncer.
National Space Biomedical Research Institute da NASA é quem financia o estudo.
Fonte: Johns Hopkins University.