Estudo aponta contínuo aumento da violência e uso de armas de fogo no Brasil

13/03/2013 15:53 Atualizado: 14/03/2013 12:10
Policiais da Coordenação de Recursos Especiais do Rio de Janeiro (CORE), fazem varredura no primeiro dia de ocupação do Complexo do Alemão, atrás de traficantes, drogas, armas e munições no Rio de Janeiro em 29 de novembro de 2010 (Marcello Casal Jr./ABr)
Policiais da Coordenação de Recursos Especiais do Rio de Janeiro (CORE) fazem varredura no primeiro dia de ocupação do Complexo do Alemão, atrás de traficantes, drogas, armas e munições no Rio de Janeiro em 29 de novembro de 2010 (Marcello Casal Jr./ABr)

Resolvendo os conflitos por meio da violência. Esta é a tendência que temos observado no Brasil. De acordo com o Mapa da Violência 2013 – Mortes Matadas por Armas de Fogo, estudo finalizado recentemente pelo sociólogo Julio Jacobo Waiselfisz, a violência continua crescendo de forma preocupante no Brasil, sendo comparável a países que vivem em conflitos e guerra.

O estudo, que abrangeu as últimas três décadas, de 1980 a 2010, constatou que houve um aumento percentual significativo do número de assassinatos no país, sendo as armas de fogo o meio responsável pela quase totalidade dos casos.

Somente no ano de 2010, 38.892 pessoas foram mortas por armas de fogo (AF) no Brasil, o que resulta num número de 108 mortes por dia. Vítimas de homicídio atingiram cerca de 94% de casos em 2010, sendo que em 1980, os homicídios como causa de morte por AF eram 70% dos casos. Outras causas de mortes por AF são o suicídio, os acidentes etc.

De acordo com o estudo, tivemos, nesses 30 anos, um crescimento de cerca de 502% na taxa de homicídios no Brasil e também um aumento definitivo do uso de armas de fogo como meio quase que exclusivo para os assassinatos. Isso mostra que a violência armada indiscriminada no Brasil transformou-se num caso extremamente sério, sendo comparável ou, muitas vezes, superior a países que vivem em guerra, que passam por genocídios, conflitos étnicos, entre outros motivos.

O próprio autor do estudo utiliza um relatório publicado em 2011 pelo Secretariado da Declaração de Genebra, Relatório sobre o Peso Mundial da Violência Armada, como forma de comparação para entendermos os números da violência no Brasil. O relatório mostra todos os 62 conflitos armados (entre esses: Afeganistão, Colômbia, Somália, Israel-Palestina, Iraque, Sudão, etc) que ocorreram no mundo, entre 2004 e 2007. O número de mortes total foi de 208.349. Nesse mesmo período, o número de homicídios no Brasil foi de 192.804. No Brasil alcançamos, praticamente, o mesmo número de assassinatos por arma que todos os conflitos armados juntos no mesmo período.

Ambientes propícios de violência

Seguindo a descentralização produtiva e econômica e a formação de novos centros econômicos no interior do país, a violência tem se disseminado pelo Brasil. Assim, os grandes centros urbanos, como São Paulo e Rio de Janeiro, apresentaram quedas nas taxas de vítimas por AF – mesmo que sejam ainda os principais centros em números absolutos -, enquanto que outros núcleos econômicos emergentes menores têm tido um crescimento muito preocupante na violência e no uso de armas de fogo.

De 2000 a 2010, o estudo mostra que as taxas de evolução da mortalidade por AF foram diferentes em cada região.  Na região Norte houve um severo aumento de 195% nas mortes por AF, sendo as piores elevações no Pará, Amapá e no Amazonas. Na Nordeste o aumento foi alto (92%), sendo Maranhão, Alagoas, Bahia, Ceará e Paraíba as mais representativas. Na região Sul houve um moderado aumento de cerca de 53%, sendo os mais altos índices no Paraná e em Santa Catarina. Na Centro-Oeste manteve-se estável. A única região onde houve decréscimo (-39%) foi a Sudeste, devido à queda dos índices no Rio de Janeiro e, especialmente, em São Paulo.

Além dos novos centros produtivos, existem outros ambientes propícios à violência, constatados no estudo, que podem ser vistos em maior detalhe para permitir reflexões e entendimentos. Todos os municípios apresentam características peculiares que são propícias para o crescimento ou a manutenção da violência. São eles de fronteira, nos quais ocorre o tráfico de armas, de produto pirata e de drogas; do Arco do Desmatamento Amazônico, que abriga trabalho escravo, madeireiras ilegais, fazem pressão sobre comunidades indígenas, grilagem de terras,  turismo predatório, que ficam localizados, especialmente, na orla marítima e que atraem um turismo flutuante forte nos fins de semana; e os “Municípios de Violência Tradicional”, como o “polígono da maconha”, de Pernambuco, ou grotões de clientelismo político.

Vítimas da violência

Outro dado preocupante, segundo o estudo, é que os jovens têm sido os mais envolvidos e as maiores vítimas do uso das AF.

“As armas de fogo se constituem, de longe, na principal causa de mortalidade dos jovens brasileiros, bem longe da segunda causa, os acidentes de transporte, que representam 20% da mortalidade juvenil”, alerta Waiselfisz no estudo. “Dois entre cada três vítimas fatais das armas foi um jovem”, conclui.

Sobre as causas do aumento de mortes por AF entre os jovens, Waiselfisz disse à Agência Brasil: “Hoje temos 9 milhões de jovens que não estudam, não trabalham e que estão vulneráveis a situações de violência”. Isso mostra como as deficiências e falhas de acomodação dos jovens do nosso modelo sócio-político-econômico estão na base desse grave problema.

Causas de mortalidade por arma de fogo

Segundo Waiselfisz, considerando em termos gerais, o aumento de mortalidade por AF no Brasil tem os seguintes fatores principais implicados:

  • Facilidade de acesso a armas de fogo

Mesmo depois da Campanha do Desarmamento, iniciada pelo governo em 2004, ainda 15,2 milhões de brasileiros possuíam armas de fogo em 2010 (ano final do estudo), sendo 3,8 milhões em poder de criminosos, o que mostra a facilidade de acesso a armas de fogo pelas pessoas.

  • Impunidade

A falta de elucidação dos crimes e a consequente inexistência das punições que seriam resultantes levam à sensação de impunidade dos criminosos e à incapacidade de inibir novos homicídios por parte dos órgãos responsáveis. De acordo com o estudo de Waiselfisz, “O índice de elucidação dos crimes de homicídio é baixíssimo no Brasil. Estima-se, em pesquisas feitas, inclusive a da Associação Brasileira de Criminalística em 2011, que varie entre 5% e 8%. Esse percentual é 65% nos Estados Unidos, no Reino Unido é 90% e na França é 80%.”

  • Cultura da Violência

Esse é o fator, segundo o autor, sem o qual a facilidade de acesso às armas teria pouco significado. Waiselfisz diz que temos sido criados dentro de uma cultura de violência, que é o que gera a forma do uso de AF na resolução de todo tipo de conflitos.

“Mas não é só essa farta disponibilidade de armas de fogo, e as facilidades existentes para sua aquisição, que levaram os níveis de violência letal do Brasil a limites insuspeitados e insuportáveis. É também a decisão de utilizar essas armas para resolver qualquer tipo de conflito interpessoal, na maior parte dos casos, banais e circunstanciais. A mistura da disponibilidade de armas de fogo e a cultura da violência vigente gerará o caldo para a produção e reprodução da violência homicida no Brasil.”

Diferentemente do que se supunha, boa parte dos homicídios que ocorrem no Brasil não advém do crime ou das drogas, mas deve-se a motivos banais, como brigas de trânsito, conflitos amorosos, desentendimentos entre vizinhos, violências domésticas, brigas de rua, enfim.

Alberto Fiaschitello é terapeuta naturalista e cientista social.

Epoch Times publica em 35 países em 21 idiomas.

Siga-nos no Facebook: https://www.facebook.com/EpochTimesPT

Siga-nos no Twitter: @EpochTimesPT