O espião na agência de publicidade

24/06/2014 14:57 Atualizado: 24/06/2014 16:36

De acordo com um especialista em segurança e contrainteligência, as empresas da Fortune 500 e os meios de comunicação do mundo enfrentam uma crise. Agentes chineses estão ganhando o controle sobre o nexo fundamental por meio do qual a inteligência de mercado é obtida e o capital flui para as empresas de mídia: as agências de publicidade.

O problema é conhecido por altos executivos de algumas das maiores empresas dos Estados Unidos. Cinco falaram sobre o assunto anonimamente e deram uma resposta comum: eles estão conscientes, mas não podem agir por medo de represálias. “Eles admitem que é uma crise absoluta”, disse Casey Fleming, CEO da BlackOps Partners Corporation, que faz contraespionagem e proteção de segredos comerciais para empresas da Fortune 500.

Fleming disse que sua empresa confirmou que o regime chinês está visando às agências de publicidade “por meio de nosso volume de interceptações”.

Um alto funcionário de segurança da informação de uma empresa da Fortune 500 disse que o problema “é muito pior do que pensávamos anteriormente”.

Depois de saber que espiões visavam informações confidenciais por meio de suas agências de publicidade, um diretor-executivo numa empresa de tecnologia da Fortune 100 disse: “Não tínhamos ideia do quão implacável e profundamente os chineses estavam dispostos a ir para obter nossas estratégias de negociação e precificação.”

Agências de publicidade

A maioria das grandes empresas não lida internamente com seu planejamento de mídia e compra de anúncios. Elas tomarão uma decisão sobre seu mercado-alvo em termos de parâmetros demográfico, psicográfico e geográfico, e os repassaram para sua agência de publicidade para compra de anúncios e divulgação.

A partir daí, a agência de publicidade decidirá que publicações ou veículos de publicidade melhor se aplicam a campanha do cliente. Infiltrar-se nestas redes dá ao regime chinês a possibilidade de negar anúncios à mídia fora da China que eles desejam calar, como será discutido no próximo artigo desta série. A infiltração também permite que o regime chinês dê prioridade e vantagem a empresas que eles favorecem.

Muitas das grandes empresas de anúncios lidam com inteligência de mercado e frequentemente são dadas informações privadas sob contratos de confidencialidade. Isto inclui a estratégia de negócios de cada empresa, além de seus planos de produtos, pesquisas de mercado e informações sobre os pontos fracos de seus concorrentes.

“O que vemos – e o que sabemos que eles [os espiões chineses] querem – é todo o tipo de estratégias de mercado e de negociação”, disse Fleming. “Eles também querem dados de precificação porque querem minar os outros”, acrescentou Fleming. “Eles pretendem manipular os mercados.”

Um padrão

Ciberataques que foram lançados pela China na última década têm como alvo o tipo de informação que é reunida por agências de publicidade.

Agentes chineses que visam as agências de publicidade “se encaixam num padrão conhecido”, segundo Peter Singer, diretor do Center for 21st Century Security and Intelligence do Brooking Institute, e autor de “Cybersecurity and Cyberwar: What Everyone Needs to Know” (“Segurança cibernética e ciberguerra: O que todos precisam saber”, tradução livre).

Pesquisadores de segurança descobriram em fevereiro de 2011 que hackers chineses têm espionado empresas internacionais de petróleo, energia e petroquímicas desde pelo menos 2009. Segundo uma postagem de blog da empresa de segurança McAfee, que detalhou os ataques, os hackers chineses estavam atrás de informações exclusivas sobre licitações.

“Esta informação é muito sensível e pode fechar ou quebrar acordos multimilionários neste setor extremamente competitivo”, afirmou a postagem do McAfee sobre o ataque, que pesquisadores apelidaram de “Noite do Dragão”.

Campanhas semelhantes de ciberespionagem foram descobertas quando o Departamento de Justiça dos EUA acusou publicamente em maio cinco oficiais militares chineses.

Os ataques do exército chinês contra a Westinghouse ocorreram quando a empresa negociava para construir e administrar usinas nucleares na China. Hackers chineses roubaram os projetos técnicos de concepção e a comunicação interna da estratégia de negócios da empresa.

Ataques da China sobre a Alcoa em 2008 roubaram milhares de e-mails, que incluíam discussões internas sobre uma transação com uma empresa estatal chinesa.

Em 2012, o Sindicato dos Metalúrgicos apelou ao Congresso dos EUA que impusesse tarifas sobre as importações chinesas, e em poucos dias hackers chineses haviam roubado e-mails da liderança do sindicado discutindo suas estratégias.

Singer disse que agentes chineses normalmente têm uma de duas metas para se infiltrar ou hackear empresas. A primeira é o roubo de propriedade intelectual; eles têm roubado de tudo, desde projetos de aviões de combate de última geração até designs de cadeiras para fabricação de móveis.

A segunda meta “é usar isso como um ponto de penetração para outra coisa”, disse ele. “Uma empresa de publicidade que trabalhe para uma empresa da Fortune 500 pode ser o caminho.”

No caso das agências de publicidade, as informações estão sendo coletadas, segundo Fleming, por espiões dentro das empresas. O envio de agentes, ao invés do lançamento de ciberataques, mostra o grande valor atribuído aos alvos. Singer completou: “Você está falando de algo que é caro do seu lado, então o que você busca tem de ser de grande valor para você.”

Esta é a primeira parte de uma séria, cujo próximo artigo abordará como o regime chinês usa as agências de publicidade para punir as empresas de mídia fora da China.