Perspectivas do Fórum Mundial de Davos 2015 para a economia global

28/01/2015 13:30 Atualizado: 28/01/2015 21:36

Todos os anos a cidade de Davos na Suíça reúne a nata do mundo da economia e das finanças, empresários de destaque, banqueiros, gestores públicos, presidentes de bancos centrais, acadêmicos do mundo inteiro, etc. É um fórum de debates (e a este dá-se o nome de Fórum Mundial), uma espécie de think tank (espaço para debates e reflexões sobre temas variados) em que os principais assuntos econômicos e correlatos da atualidade são tratados.

Neste ano não foi diferente. Vários temas foram abordados, como o dos Bancos Centrais em rota de divergência, como explicar a queda da cotação do barril de petróleo nos últimos meses, o fantasma da deflação no mundo desenvolvido, problemas geopolíticos, etc. Tivemos também a ida do ministro da Fazenda brasileiro Joaquim Levy, um bom “sopro de esperança” pelo discurso claro e objetivo e a promessa de “arrumar a casa”. Disse ele que no ajuste fiscal em curso não cabe “remendos”, que teremos um trimestre em retração, mas que no longo prazo as perspectivas são positivas. Segundo Levy, os ajustes são para valer e essenciais para a recuperação da confiança dos agentes econômicos e a retomada da economia. Neste ano, o crescimento deve ser flat, ou seja, próximo a zero, mas nos próximos a retomada será inevitável desde que a premissa do ajuste fiscal rigoroso seja bem-sucedida.

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Para o FMI, no entanto, o Brasil ainda se encontra numa situação de fragilidade, entre os mais preocupantes da América Latina, junto com Argentina e Venezuela, todos com perspectivas de fraco crescimento para este ano.

Fazendo um balanço parcial do evento, a comunidade de Davos resolveu assumir um “otimismo cauteloso” para a economia global, puxado pelos EUA e suas acertadas políticas, mas não descartando alguns “riscos globais no horizonte”, como os citados acima. Os principais bancos centrais do mundo seguem em rotas divergentes. O Fed aponta para uma contração monetária ao fim deste ano e o BCE e o BoJ vislumbram reforçar políticas agressivas de expansão do crédito. Outro fator preocupante é a trajetória do barril de petróleo, recuando de US$ 100 para US$ 50 nos últimos meses, acompanhado por outras commodities, também em queda. A justificar isto a China, sinalizando uma “suave desaceleração” da economia, devido às mudanças do seu modelo econômico.

Façamos então uma análise resumida sobre os principais atores da cena mundial, EUA, Zona do Euro, China e os países emergentes, com destaque para os da América Latina.

Estados Unidos

Atualmente, junto com a China, é o principal “motor da economia mundial”. As boas políticas fiscais anticíclicas adotadas pelo governo Barack Obama, depois da crise de 2008/09, comprando participação em empresas “quebradas” e vendendo-a quando estas se recuperavam, além de alternativas políticas monetárias, com o Quantitative Easing, somados aos ganhos crescentes de produtividade, inovações tecnológicas, flexibilidade dos mercados de bens e de trabalho, baixa carga fiscal, influência do gás de xisto (shale gas) e forte recuperação da demanda dos consumidores, ajudam a explicar a recuperação da economia norte-americana.

Um “ponto fora da curva”, que também afeta outros países, talvez seja o risco de deflação, gerado em especial pelo recuo das commodities, resultando numa inflação abaixo da meta do Fed de 2,0% anuais. Isto deve corroborar para jogar a decisão de elevar o juro de curto prazo para o final deste ano ou o início do próximo. Como resultado teremos uma “folga monetária” no mundo, com aumento da liquidez global, alterando a mobilidade de recursos e a taxa de câmbio das várias moedas nos próximos meses. Num primeiro momento, o euro já se deprecia e o dólar se valoriza, assim como a moedas de alguns emergentes. Sobre as estimativas de crescimento dos EUA, depois de crescer algo em torno de 2,5% em 2014 (cresceu 5% no último trimestre), caminha célere para crescer mais de 3% em 2015.

Zona do Euro

Foi destaque na semana passada depois que o BCE anunciou o seu Quantitative Easing para os próximos meses (março deste ano a setembro de 2016) a partir da compra de ativos dos países membros em troca de liquidez (60 bilhões de euros mensais e 1,14 trilhão de euros no total). Caso a economia da região não reaja a contento, este programa deve ser prorrogado, repetindo os EUA, que depois do primeiro QE adotou mais dois dentro da estratégia do open ended (potencialmente infinito). Depois de reduzir o juro próximo a zero e adotar várias medidas de estímulo, o BCE tenta agora sua última cartada para fazer a economia da região voltar a crescer, afastando o risco de deflação. Esta é perniciosa, pois as famílias acabam adiando suas compras na expectativa de que a inflação caia ainda mais, o que impacta no consumo, na produção e no nível de emprego. Teríamos então um ciclo recessivo. Para este ano, a região deve crescer pouco, cerca de 1%, podendo ser mais em 2016 e 2017 caso os estímulos sejam bem-sucedidos. A inflação, que fechou negativa em 2014 (-0,2%), pode reaparecer, desde que as pessoas, ainda endividadas e com receio do desemprego, voltem a consumir.

China

A burocracia chinesa, no seu planejamento rígido, trabalha com um crescimento menor neste ano, em torno de 7,1%, depois de 7,4% em 2014. A explicar este soft landing, um processo gradual de mudança de modelo, agora mais baseado nas exportações de alto valor agregado, mais investimentos em P&D, urbanização no interior do país, ascensão de uma classe média demandadora por melhores serviços e as dores deste modelo, riscos para o sistema financeiro e de inflação no horizonte. Além disto, não podemos descartar tensões sociais e políticas, diante das demandas dos cidadãos. Dito tudo isto, temos um país em transformação, reduzindo suas exportações, pelo menor crescimento dos seus parceiros comerciais, e por isto mais “voltado para dentro”, visando resolver seus problemas sociais, crescendo menos, afetando na trajetória de algumas commodities, como minério de ferro, soja, milho e petróleo (também afetados por outros fatores).

América Latina

O diagnóstico do FMI sobre as perspectivas dos países da América Latina divide a região em dois blocos, os populistas e os pragmáticos. Dentre os primeiros destacamos a Venezuela, a Argentina e o Brasil, embora este em transição devido às últimas medidas de ajuste adotadas. Poderíamos também incluir neste grupo o Equador e a Bolívia. No outro grupo, Chile, Peru, Colômbia e México, como exemplos a serem seguidos, por adotarem políticas econômicas acertadas e atraentes aos investidores.

No primeiro bloco de países, Argentina e Venezuela, com eleições importantes neste ano (ameaçando o kirchnerismo e o chavismo) devem registrar taxas negativas de crescimento em 2015. O PIB da Argentina deve recuar 1,3% neste ano, depois de recuar 0,4% em 2014, e da Venezuela, “mergulhar” 7% neste ano, depois de recuar 4% em 2014.

No segundo bloco, países que arrumaram suas economias, fizeram ajustes nas suas contas públicas e devem continuar a colher seus frutos com bons indicadores. O Chile, mesmo dependente das exportações de commodities minerais, cresceu 1,7% em 2014 e deve crescer 2,8% neste ano; o Peru, na mesma situação, cresceu 2,5% e deve crescer 4,0%, respectivamente; a Colômbia, mais de 4% nestes dois anos, e o México, pela sua proximidade com os EUA e por ter adotado reformas importantes, na mesma toada. De um lado, instituições fragilizadas, muito populismo e corrupção; do outro, pragmatismo e uma visão clara do que deve ser feito, mesmo com algum custo no curto prazo.