Educando para a compaixão

05/12/2014 00:00 Atualizado: 03/12/2014 00:07

Os pesquisadores da Universidade de Winsconsin-Madison constataram, pela primeira vez, que as pessoas podem ser treinadas para serem mais compassivas, durante curto período de tempo. Em uma sala de meditação equipada para investigação científica e um laboratório de imagens cerebrais, eles detectaram que a compaixão conduz a um comportamento mais altruísta e à mudanças relacionadas aos sistemas neuronais.

“A teoria é que se praticamos compaixão por meio da meditação, assimilando-a em nossa própria mente, então isso realmente se expressa quando vemos alguém que sofre ou necessita de ajuda” disse, através de uma entrevista via telefone, Helen Weng, estudante graduada em psicologia clínica do Centro de Investigação de Mentes Saudáveis.

O novo estudo intitulado “O treinamento na compaixão e no altruísmo altera as respostas neuronais ao sofrimento” foi publicado na revista Psychological Science – Helen Weng é a principal elaboradora do estudo.

Usando imagens de ressonância magnética funcional, os investigadores mediram a quantidade de atividade cerebral modificada entre o princípio e o final do treinamento. Como resultado, perceberam que “as pessoas que eram mais altruístas depois do treinamento na compaixão, foram as que mostraram as maiores mudanças cerebrais ao ver o sofrimento humano”, segundo o comunicado feito à imprensa.

Treinamento da compaixão em laboratório

Os investigadores ensinaram os participantes a meditarem. Isso foi feito em vários locais distintos: no Centro de Investigação de Mentes Saudáveis, em locais próximos a hospitais, em centros de investigação médica e ciências de saúde, e na ruas do campus da University Wisconsin-Madison.

Durante duas semanas os participantes meditaram e praticaram, gerando sentimentos de compaixão para três tipos de pessoas em suas vidas.

Em primeiro lugar, praticaram a compaixão por um ser querido. Em segundo lugar, praticaram a autocompaixão e a compaixão por um desconhecido. Por último, praticaram a compaixão por alguém com quem tiveram um conflito, ou com uma “pessoa difícil”.

Durante as duas semanas da pesquisa, os participantes escutaram, em seus respectivos locais, as instruções de áudio pela internet durante 30 minutos ao dia. Havia também um grupo de controle que praticava a reavaliação cognitiva, que consiste em “uma técnica onde as pessoas aprendem a reestruturar seus pensamentos para sentirem-se menos negativas”.

Ao retornar para o centro, os investigadores mediram as respostas emocionais no scaner cerebral, enquanto os participantes meditavam.

“Mostramos a eles imagens de pessoas sofrendo (como uma criança chorando ou uma vítima de queimaduras) e pedimos que gerassem uma resposta compassiva como a que praticavam em casa”, disse Weng. “Foram geradas frases de compaixão, como ‘Que seja liberado do seu sofrimento.’ e ‘Que possa sentir alegria e felicidade.’, enquanto buscavam sentir ternura e conforto em seus corações”.

Finalmente, veio a prova real. Sem que os participantes soubessem, estavam sendo testados no altruísmo e na probabilidade de que ajudassem a um estranho em necessidade. “Não queríamos que soubessem que estávamos avaliando o comportamento altruísta e lhes dissemos que era um estudo paralelo”, mencionou Weng.

Os participantes do estudo, fundamentalmente desempenharam um papel de expectadores. Viram dois jogadores anônimos no “Jogo de redistribuição”, um intercâmbio financeiro na internet.

No jogo havia um “opressor” e uma “vítima”. O opressor tinha 10 dólares e a vítima não tinha nada. Enquanto que os participantes tinham 5 dólares, dessa forma poderiam ajudar a vítima dentro das circunstâncias, se assim o desejassem.

Para cada dólar que o participante desse à vítima, se retirariam dois do opressor para dar à vítima. Os resultados mostraram que os participantes treinados em compaixão foram mais propensos a ajudar um estranho, em comparação com os participantes do grupo de controle.

A hipótese é que a meditação compassiva, em realidade, aumenta o comportamento altruísta, segundo Weng.

Leia também:

Medicina Tibetana: Compaixão, ciência e experiência

A importância da empatia no tratamento médico

Meditação pode sanar ou prevenir desordens psiquiátricas

“Então quisemos saber: Bem, como está mudando o cérebro em resposta às pessoas que sofrem?”, disse Weng. Ao examinar os dados da atividade cerebral, perceberam que quanto maiores as mudanças no cérebro depois de duas semanas de treinamento em compaixão, o participante terminava oferecendo mais dinheiro ao estranho.

Os investigadores encontraram essas mudanças cerebrais no córtex parietal inferior, uma região associada com a empatia e a compreensão dos demais.

“O treinamento da compaixão também aumentou a atividade no córtex pré-frontal dorso-lateral na medida em que se comunicava com o núcleo accumbens, que são regiões do cérebro envolvidas com a regulação das emoções e das emoções positivas”, segundo o comunicado da imprensa.

“Estão aprendendo mais a aproximar-se, tornarem-se mais amáveis e próximos a essas pessoas que estão sofrendo”, disse Weng. Porém, a prática da compaixão em um monitor de computador é diferente da prática da compaixão na vida real.

Compaixão diária

Após o estudo, os investigadores perguntaram aos participantes se por acaso se deram conta de mudanças em sua vida cotidiana.

“Uma pessoa disse que estava em um supermercado e foi mais amável com a atendente de caixa” e “um pouco mais paciente quando tinham que esperar na fila”, observou Weng.

Gravaram também como os participantes se sentiam durante o estudo. “Uma pessoa disse coisas como: ‘No início, me sentia muito triste de que essa pessoa estivesse sofrendo, então nesse momento experimentei ternura no meu coração”. “Foram diversas experiências”, comentou Weng.

Para alguns participantes, era fácil sentir compaixão por alguém que realmente estimavam, devido a que já se sentiam conectados com essa pessoa. Porém, logo tiveram que praticar a compaixão com eles mesmos, com estranhos e com alguém com quem tinham conflitos, ou com uma “pessoa difícil”.

Weng: “Às vezes, com a pessoa difícil, disseram: ‘Estou tentando sentir compaixão, porém estou muito aborrecido”. “Outras pessoas diziam: Está bem, entendo porque se comportam assim e dessa forma me sinto um pouco mais compassivo. Os participantes definitivamente tentaram e realmente se sentiram comprometidos com a prática”.

Estudando a compaixão

“É uma espécie de treinamento com pesos… Constatamos realmente que as pessoas podem construir sua compaixão como um ‘músculo’, e responder aos sofrimentos dos demais com atenção e o desejo de ajudar”, disse Weng.

Ainda em entrevista telefônica, explicou que a compaixão poderia desenvolver-se como um “músculo”, porque é uma habilidade que já temos dentro de nós, esperando para ser utilizada. Como um exemplo disso, Weng disse que os bebês nascem naturalmente com amor e com um sistema para conectar-se com os outros, já que necessitam disso para sobreviver.

Porém, à medida que crescemos, nos ocorrem muitas coisas e mudamos, “desenvolvemos diferentes experiências e perdemos esse contato”, disse Weng. “Parte desse treinamento consiste em responder, tendo em conta que somos adultos, vivendo em um mundo moderno, como podemos acessar esse lugar que todos temos dentro de nós?”.

O Dr. Richard J. Davidson, neurocientista reconhecido e pioneiro no estudo dos efeitos da meditação sobre o cérebro, fundou em 2008, o Centro de Investigação de Mentes Saudáveis, onde os investigadores realizam “uma rigorosa investigação científica sobre as qualidades saudáveis da mente, como bondade, compaixão, perdão e atenção”.

Alison DeShaw Rowe, especialista em relações públicas para o centro, disse que o Dr. Davidson decidiu colocar a compaixão no mapa da ciência e estudá-la desde um ponto de vista científico, depois que o Dalai Lama fez uma pergunta no início de 1990. “Por que os psicólogos somente se concentram nas emoções negativas como a ansiedade e a depressão? Por que não aplicar todas essas ferramentas no estudo das qualidades saudáveis da mente? “.

Os benefícios de ser mais compassivo

Weng apontou outros estudos sobre a compaixão, demonstrando que as pessoas tendem a ter uma resposta menos estressante enquanto são avaliadas; as emoções são mais positivas no dia a dia, elas têm maior satisfação com a vida e sofrem menos depressão.

“Permite que você aproxime-se das pessoas; no trabalho você torna-se mais amável, ou está mais disposto a trabalhar com novidades”, disse Weng.

“Creio que se pode demonstrar às pessoas que trata-se de reduzir o foco naquilo que eu necessito para: O que os outros necessitam?”, disse Weng, e agregou que ao fazer dessa forma, em realidade também estava ajudando a si mesma.

Qualquer melhora vem com a prática, e tem que iniciar por alguma parte. “Inclusive duas semanas de prática proporcionam alguma mudança”, expressou Weng. “Realmente mostra que pode ser factível, acessível e que a meditação não é somente para os monges”.

————-

Kelly Ni, Epoch Times