Economia global em perigo

29/05/2012 03:00 Atualizado: 29/05/2012 03:00

Vista do shopping center ABC em 24 de maio em Madri, Espanha. A enferma economia espanhola luta para se recuperar com taxa de desemprego de 24,4% segundo números do governo do fim de março. (Denis Doyle/Getty Images)China, Europa, Japão, EUA, 70% da economia global, pedem rápida intervenção do G-20

Deliberações sobre deixar um Afeganistão seguro após a retirada da OTAN são essenciais. Mas o mundo está enfrentando uma crise ainda mais urgente que exige ação imediata e coordenada pelo Grupo dos 20.

Uma confluência de tendências perigosas ameaça a economia global. Praticamente todas as principais fontes de demanda na economia mundial parecem estar apreensivas ao mesmo tempo, a zona do euro está enfrentando estresses múltiplos, a economia chinesa está desacelerando em ritmo preocupante, a recuperação do Japão de seus três desastres está sendo prejudicada pela escassez de energia, e a recuperação da economia dos EUA parece estar perdendo força.

Uma vez que estas grandes economias estão interligadas de muitas maneiras, deveríamos esperar que esses riscos reforçassem um ao outro e produzissem um resultado muito pior do que se poderia esperar se analisados individualmente, daí a necessidade de respostas rápidas e políticas coordenadas a nível global.

Sinais de alerta

Os principais motores da economia global estão em risco. Em meio a grande incerteza, algumas projeções podem ser feitas.

Primeiro, a zona do euro sofrerá uma recessão mais profunda do que prevista, juntamente com importantes perturbações financeiras e enorme incerteza política.

Com a Grécia enfrentando a perspectiva de uma saída caótica do euro, a espiral descendente da zona do euro está se movendo mais rápido. A combinação de ausência de suporte após a crise financeira e austeridade fiscal para lidar com a crise da dívida pública está produzindo mais do que apenas uma recessão.

Isso está criando um retrocesso político que torna cada vez mais difícil para os governos aderirem aos pacotes de resgate, que temporariamente trouxeram alívio para a crise. Mas uma vez que os pacotes de resgate são um conjunto delicado de compromissos frágeis para acomodar pontos de vista acentuadamente divididos sobre políticas, a incapacidade de honrar uma parte do pacote poderia perturbar o conjunto inteiro. Com a pouca probabilidade da Grécia ter um governo que satisfará as condições do resgate, uma omissão grega e saída do euro são agora perigosamente possíveis.

Preocupações surgem em relação a outras economias financeiramente estressadas na região. Porque a Espanha já está murcha sob a pressão de recapitalizar seus bancos em dificuldades, enquanto ainda restringindo déficits públicos e a dívida, a atenção tem se deslocado de se preocupar com países relativamente pequenos como a Grécia ou a Irlanda para os países maiores, que não podem ser socorridos tão facilmente.

Com a França agora liderada por um presidente novo não testado que exige uma renegociação de partes críticas dos regates da zona do euro e com o governo tecnocrático da Itália perdendo apoio, a crise poderia se espalhar para as economias maiores, o revés da eleição regional sofrido pelo partido de Angela Merkel aponta para o problema, e leva aos cenários mais extremos de uma ruptura da zona do euro que parecia pouco provável há apenas algumas semanas.

Em segundo lugar, economia da China, a maior fonte de crescimento em demanda mundial, está desacelerando drasticamente. Leituras econômicas de abril chocaram os mercados, a produção industrial, investimentos em ativos fixos, as vendas no varejo, e as exportações perderam impulso precipitadamente.

A demanda interna e externa está enfraquecendo muito mais rapidamente do que o esperado.

Os mercados financeiros ainda têm esperança que respostas firmes de política monetária e fiscal serão suficientes para transformar a economia. Há fortes razões por que os mercados se decepcionarão. O espaço de manobra dos políticos chineses é limitado, ao contrário de 2008, a economia está sendo desafiada não apenas por uma desaceleração, mas também por pressões inflacionárias e comportamento especulativo, especialmente no setor imobiliário que criou desequilíbrios na economia e provocou a ira do público.

As dirigentes chineses sabem que políticas flexíveis prematuras poderiam reavivar esses riscos. A enorme resposta política de 4 trilhões de yuanes de 2008 simplesmente não acontecerá novamente.

Terceiro, a recuperação econômica dos EUA continuará a ser modesta no melhor das hipóteses e, portanto, altamente vulnerável a choques externos, como dificuldades financeiras renovadas nos mercados globais ou fraqueza nos mercados de exportação principais, tais como Europa e China.

A economia dos EUA estava começando a colocar em prática as bases para uma recuperação sustentável, aliviando condições de crédito, aumentando os negócios e a confiança do consumidor, o mercado imobiliário encontrando um fundo e amenizando o desemprego. No entanto, dados recentes lançam dúvidas sobre a durabilidade da recuperação nestas áreas.

Além disso, com o crescimento do emprego ainda anêmico e a renda doméstica crescendo escassamente em termos reais, a demanda do consumidor, 70% da economia, tem sido largamente sustentada por uma queda na taxa de poupança que não pode continuar. Neste contexto, a economia dos EUA não está em condições de absorver os choques potenciais de seus principais parceiros comerciais ou lidar com ajustes fiscais dolorosos, que não podem ser evitados por muito tempo. A economia dos EUA não cairá em outra recessão, mas não desfrutará mais do que um crescimento modesto.

Em quarto lugar, a recuperação japonesa está em risco. A perda da energia elétrica de geração nuclear provavelmente enfraquecerá a recuperação do Japão do triplo desastre de 2011. A energia total fornecida caiu 7,6% ao longo do ano fiscal que só terminou em março, como resultado do encerramento de suas centrais nucleares. O desligamento será particularmente grave na região de Kansai, onde vários centros de produção do Japão, como Osaka, Kyoto e Kobe estão localizados. Além disso, a incerteza paira sobre o governo pretender aumentar os impostos de consumo, a fim de resolver a enorme dívida fiscal.

Em quinto lugar, esses desenvolvimentos desfavoráveis não funcionarão de forma isolada. Em vez disso, eles se reforçarão mutuamente e produzirão uma desaceleração mais acentuada do que esperada na demanda global. Com todos os principais motores do crescimento global enfraquecendo simultaneamente, os riscos são de que cada uma dessas grandes economias puxe para baixo seus principais parceiros comerciais.

Coordenação necessária

Ao contrário da experiência asiática durante a crise de 1997-1998, as economias em dificuldades de hoje não podem contar com uma demanda global ainda forte para alimentar uma recuperação. Eles são a economia global, que representam quase 70% do PIB global de 63 trilhões de dólares em 2010. Os Estados Unidos, a Europa e a China são tão grandes, e tão interligados através de fluxos de comércio e investimento, que negativos num país reforçam negativos em outro.

Ações coordenadas de política global são necessárias para quebrar o ímpeto descendente.

Países individuais são limitados por enormes níveis de endividamento e preocupações sobre inflação ou riscos de moeda de embarcarem sozinhos em respostas políticas substanciais que são necessárias. O G-20 precisa ser ativado e a confiança restabelecida através de uma série de medidas:

Primeiro, deve haver um compromisso de simultâneo estímulo fiscal, com as economias fiscais mais fortes como Alemanha, China e os exportadores de petróleo fazendo o trabalho pesado, enquanto as economias que enfrentam desafios fiscais criam condições para reduzir o déficit de forma mais gradual.

Em segundo lugar, o mundo deve reforçar as defesas contra pânicos financeiros. Os firewalls, como o Fundo Monetário Internacional e os fundos de estabilização da zona do euro devem ser ampliados substancialmente o suficiente para convencerem os mercados financeiros de que podem lidar mesmo com as maiores economias da zona do euro que estão em risco. Deve haver um compromisso explícito para recapitalizar os setores bancários na Europa, que estão cada vez mais em perigo.

Terceiro, as economias emergentes devem se comprometer com uma flexibilização simultânea das políticas monetárias.

Em quarto lugar, os exportadores de petróleo precisam assumir um compromisso firme de sustentar tanto quanto possível um aumento na produção de petróleo, para que os preços do petróleo caiam o suficiente para impulsionar a demanda global. A queda no preço do petróleo também ajudaria a conter pressões inflacionárias, tornando mais fácil adotar as políticas expansionistas mencionadas acima.

Em suma, a economia global está em risco de uma espiral descendente, e somente poderosas ações políticas coordenadas globalmente podem evitar uma grande crise.

Manu Bhaskaran é um parceiro do Centennial Group. Com a permissão da YaleGlobal Online. Copyright © 2012, Centro Yale para o Estudo da Globalização da Universidade de Yale.