Ebola: soro ‘mágico’ usado em americanos infectados é negado para africanos

08/08/2014 08:00 Atualizado: 07/08/2014 23:52

Três dos mais prestigiados especialistas mundiais no vírus do ebola afirmaram que os tratamentos com drogas experimentais que foram oferecidos a dois missionários norte-americanos na Libéria têm de ser também oferecidos às milhares de pessoas infectadas na África Ocidental.

Depois de Kent Brantly e Nancy Writebol terem contraído a doença ao tratarem pacientes na Libéria, ambos foram transferidos para uma unidade de isolamento especializada em Atlanta, nos EUA. Embora permaneçam ainda fracos – não havendo nenhuma maneira de saber nesta fase em que medida o soro experimental (ZMapp) pode ou não ter sido responsável pela recuperação – o fato de terem sido dois americanos a se beneficiarem – em primeiro lugar – da “cura” gerou críticas e recriminações que ecoaram por toda a África Ocidental.

Agora Peter Piot, responsável pela descoberta do ebola em 1976, David Heymann, diretor na área da segurança global e saúde do Chatham House Centre (prestigiado thinktank britânico), e Jeremy Farrar, da Wellcome Trust (fundação de caridade britânica), vieram a público dizer que há numerosas vacinas e medicamentos em estudo que poderiam ser usados para combater o pior surto de todos os tempos deste vírus.

“Os governos africanos devem ter as condições para tomar decisões informadas sobre se devem ou não usar estes produtos – por exemplo, para proteger e tratar o pessoal médico que corre riscos especialmente elevados de infecção”, escrevem os três num comunicado conjunto.

A Organização Mundial de Saúde (OMS), “o único órgão com necessária autoridade internacional” para avançar com estes tratamentos experimentais, “tem de assumir este papel de mais forte liderança”, afirmam. “As terríveis circunstâncias presentes obrigam a uma resposta internacional mais robusta.”

Quase 900 pessoas morreram desde que o surto começou em fevereiro, espalhando-se por comunidades em toda a Guiné, Libéria e Serra Leoa. Algumas variantes do vírus são especialmente perigosas, uma vez que têm taxas de mortalidade de até 90%, embora a atual epidemia esteja matando entre 50 a 60% dos infectados.

O contágio está longe de estar contido e houve repetidos alertas de que a situação estava “fora de controle”. Finalmente, a OMS decidiu reunir-se com vários especialistas para discutir medidas que possam travar o surto. O encontro começou anteontem (6), e dele sairá uma decisão sobre se estamos em uma situação de emergência global.

Um homem que se suspeita que tenha contraído a doença morreu esta quarta-feira na Arábia Saudita. Se confirmado, este será o primeiro caso de uma morte relacionada com o ebola ocorrida fora do continente africano.

Entretanto, uma coordenadora dos Médicos Sem Fronteiras na Serra Leoa advertiu que o país não é capaz de lidar com a situação. Em entrevista à CNN, Anja Wolz disse que a única hipótese do país impedir o agravamento da crise será com a ajuda internacional. Para Wolz é imprescindível que a OMS e o Centro para o Controle e Prevenção de Doenças dos EUA (CDC) se envolvam de forma direta na erradicação do vírus.

“Eu acho que o governo e o Ministério da Saúde aqui na Serra Leoa não tem condições para fazer frente a este surto. Precisamos de muito mais assistência das organizações internacionais – como a OMS, o CDC e outras organizações – para prestarmos auxílio ao governo”, disse. “Continuamos a ver enterros sendo realizados em desacordo com as normas de saúde; as pessoas que os fazem não desinfetam o cadáver; continuamos tendo casos de pacientes que se escondem; ainda temos pacientes ou familiares que fogem porque estão aterrorizados”, concluiu.

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