E. Blair Leighton, um artista capaz de pintar sentimentos – Parte 2

29/07/2014 13:47 Atualizado: 29/07/2014 13:47

Quando as obras de Edmund Blair Leighton não contêm imagens medievais, ainda assim são na sua maior parte acerca de romance e de interação entre homem e mulher. Em vez de serem obviamente dramáticas, contêm um sentido tranquilo de beleza, capturando os sutis e preciosos momentos da vida.

‘The Request’ (O Pedido), pintado em 1892, é acerca de tal momento. Uma bela menina em um vestido dourado inclina-se contra uma arcada de pedra nervosamente enrolando uma fita do vestido em redor do dedo. Um cavalheiro que a chama aparenta estar nervoso, segura com força o seu chapéu enquanto faz o seu pedido. Em que consiste o pedido, o observador não pode saber ao certo, mas com certeza é de natureza íntima. A sua face e metade do seu corpo não estão visíveis, dando a sensação ao observador de que se trata de um momento privado entre o casal enquanto que, ao mesmo tempo, toma a bela donzela como ponto central da imagem. A cerca e a vegetação densa na parte da frente também dá uma sensação de separação. Apesar de sermos os atuais espectadores, Blair Leighton foi o espectador original e esta foi a sua visão. A pintura de E.B.L coloca o observador onde outrora esteve o autor olhando, nesse momento no tempo para alguém especial.

Como John William Godward  (1861-1922) e muitos outros artistas de sucesso do seu tempo, Blair Leighton nasceu e foi educado no auge de um estilo de pintura e morreu como um rejeitado do estilo que se seguiu. Tendo sobrevivido para além do tempo da sua visão artística, estes homens e mulheres rapidamente perderam importância comercial. O Modernismo estava tomando conta na virada do século, e em 1913 o crítico Alfred Yockney, ao admirar o ensaio monográfico de Blair Legthon no ‘Christmas Art Annual’ desse ano, não iniciou a sua discussão falando de E.B Leighton, mas sim da sua perplexidade com o que estava ocorrendo no mundo da arte. Yockney afirmou:

“Será perscrutar demasiado longe no futuro ver o dia em que a unanimidade prevalecerá no que diz respeito ao progresso da arte. É tão remoto quanto o tempo em que todas as crenças se tornam uma só fé. Tal como as convicções religiosas diferem para confusão das pessoas, assim a cidadela da arte é mantida por muitas companhias. Muito da arte dos anos recentes deveria carregar a marca da dúvida. Inumeráveis quadros apresentam-se abundantes em símbolos  sem significado óbvio e muitos mistérios são deixados para que o observador os solucione. Por vezes a tarefa é fácil e suficientemente divertida, mas na sequência da mesma, paira a suspeição de que o propósito da arte foi adulterado com a introdução de composições em que faltam elementos. Assim mais frequentemente acontece que os mistérios não podem ser desvendados”.

As intenções do pintor, se é que teve alguma, foram perdidas e as suas explicações em papel que frequentemente existem não ajudam a convencer o espectador. Não parece possível que tal obra possa despertar interesse duradouro. Pretende-se ser apenas humor político, então seria um objetivo legítimo, mas uma vez que foi exibido e descrito com toda a seriedade, arrisca assim estar destinada à obscuridade. Muitos amigos da arte esperam que tal coisa possa terminar, mas alguns adeptos vislumbram-no como se tratando de uma revolução em progresso.

Yockney defende claramente o estilo acadêmico, sabendo perfeitamente que está ocorrendo uma guerra entre o acadêmico e os paradigmas modernos da arte. Isto está favorecendo E.B. Leighton ou os seus associados. Isto é evidente pela sua necessidade de iniciar o seu ensaio focando a mudança de polaridade no mundo da arte – apesar de Yockney acreditar que a sua maneira de pensar vai prevalecer, é com grande seriedade e preocupação que toma a defesa do estilo acadêmico.

Edmund Blair Leighton realizou muitas de suas pinturas menores durante os Verões de Norfolk, onde alugou uma cabana de nome ‘Kirby Green’. Ficava na propriedade de ‘Kirby Manor’ e estava localizada  do outro lado da rua de uma velha Igreja em ‘Kirby Cane’. O alpendre, casa e jardim foram usados em diversas pinturas, incluindo ‘O destino da Rosa’, de 1921.

O Rio Waveney que atravessa a zona e segue para Suffolk foi usado com muita frequência e muito da área circundante também. E.B. Leighton ficou doente pouco tempo depois da Primeira Guerra Mundial e crê-se que teria regressado a Norfolk por mais dois verões. Eventualmente ficou confinado a uma cadeira. Ele continuou a pintar até o fim da sua vida, a última pintura tem a data do ano de  sua morte. Morreu em 1 de setembro de 1922, a 21 dias de completar 70 anos de idade.

Hoje em dia, em que poucos levantamentos históricos sequer reconhecem Blair Leigthon ou os seus pares acadêmicos, existe uma grande e crescente população de colecionadores, acadêmicos e peritos em arte que apreciam e respeitam o seu trabalho. Existem muitas referências a si e às suas pinturas em obras modernas e trabalhos literários, tanto ficcionais como históricos. Por exemplo, no livro ‘Alain Chartier: The Quarrel of the Belle Dane Sans Mercy’, que é o mais relevante exemplar das obras dedicadas ao lendário escritor e poeta medieval, Joan e McRae, no princípio da sua introdução, dá crédito a Leighton em parte pelo reconhecimento de  Alain Chartier, afirmando: “A pintura Pré-Rafaelita de Edmund Blair Leighton ‘O beijo’, transportou a lenda de Alain Chartier para a imaginação moderna”. A pintura de Alain Chartier faz parte do 1% das suas obras globalmente conhecidas.  A  lenda de ‘O beijo’, como McRae a chama, é da rainha Francesa, Marguerite Of Scotland beijando Alain Chartier enquanto este dorme. Supostamente diz a lenda que ela encontrou-o enquanto este dormia e gentilmente beijou-o nos lábios. Quando um  dos seus seguidores a criticou por fazer tal coisa, ela respondeu, “Eu não beijei o homem, mas sim a sua preciosa boca, da qual nasceram tantas palavras sagazes e virtuosas observações”. E.B. Leighton, que era de descendência escocesa, sem dúvida foi inspirado por esta lenda.

É então um paradoxo que  Alain Chartier tenha atingido um impressionante valor de 311,750 libras esterlinas na Christies de Londres a 28 de novembro de 2001, ainda que o seu autor, embora proeminete, permaneça fora do caminho principal. Apesar do seu relativo anonimato dentro de um período histórico que ainda está sendo redescoberto, as imagens apelativas de Blair Leighton ganharam um espaço na psique do nosso quotidiano e impactaram sobre a nossa compreensão de romance e cavalheirismo da era medieval.

Uma versão deste artigo foi publicada no Fine Art Connoisseur, em junho de  2011

Kara Lysandra Ross é o Diretora de Operações do Art Renewal Center, e  escreve para o ‘Catalogue Raisonné’ sobre Edmund Blair Leighton