A dinâmica de poder (e crimes) que levou à queda do chefe da segurança

03/08/2014 12:35 Atualizado: 03/08/2014 12:35

Zhou Yongkang, uma das figuras mais poderosas do Partido Comunista Chinês e um dos maiores responsáveis ​​pela perseguição à prática espiritual do Falun Gong, está agora oficialmente sob investigação.

Num breve artigo publicado na terça-feira (29.07) a agência de notícias estatal Xinhua anunciou que o Comitê Central deu início a uma investigação sobre Zhou Yongkang por “graves violações de disciplina”.

Zhou Yongkang é o maior “tigre” – ou seja, um funcionário corrupto do alto escalão do Partido Comunista Chinês (PCC) – a ser derrubado na campanha “anticorrupção” do líder chinês Xi Jinping, que já expurgou mais de 400 funcionários desde o final de 2012, quando Xi assumiu o poder na China.

Zhou é o oficial de mais alta patente do PCC a ser formalmente investigado. Esta investigação viola uma regra não escrita que membros do Comitê Permanente do Politburo – o pequeno grupo que se senta no topo da hierarquia do PCC – seriam intocáveis, e, portanto, não poderiam ser presos.

Além de servir no Comitê Permanente entre 2007-2012, Zhou esteve no topo ou próximo do topo no aparato de segurança pública e legal do regime chinês por dez anos. Seu poder era tal que os comentaristas descreveram-no comandando um segundo centro de poder no PCC, que rivalizava com a autoridade do secretário-geral do PCC.

O anúncio ocorreu após uma semana de rumores que circularam na liderança do PCC. Após o retorno de Xi Jinping em 25 de julho de uma viagem à América do Sul, outros membros do Comitê Permanente sumiram da vista pública. Relatos circularam que eles estavam no balneário de verão da liderança chinesa em Beidaihe, onde o círculo do Comitê Permanente e líderes aposentados mas influentes do PCC teriam discutido o caso de Zhou.

“O momento para um anúncio formal deve ser acordado entre os membros do Comitê Permanente”, disse Heng He, um especialista em China e colunista do Epoch Times, em entrevista por telefone. “Eles precisam tomar uma decisão formalmente. Se alguma coisa ocorrer mais tarde, todos assinaram e todos são responsáveis​​. Ter um bode expiatório é descartado.”

Nos dias imediatamente anteriores à prisão, os militares da China realizaram exercícios numa escala sem precedentes. Os exercícios visavam a enviar uma mensagem, na visão de Heng He. “Os exercícios deram um aviso a quem quer que pretenda desafiar Xi Jinping, seja aberta ou secretamente”, disse Heng He. “Os exercícios mostram quem é o chefe.”

Tentativa de golpe

Embora a decisão de anunciar a prisão de Zhou Yongkang possa ter sido tomada nos últimos dias em Beidaihe, o destino de Zhou provavelmente foi selado em 6 de fevereiro de 2012, quando Wang Lijun, o chefe de polícia de Chongqing, fugiu para o consulado dos EUA em Chengdu, na China.

Wang era o braço-direito e o homem de confiança de Bo Xilai, o chefe do PCC na megalópole de Chongqing. Essa relação ficou tensa quando o órgão disciplinar do PCC começou a observar Wang mais atentamente. Bo Xilai perdeu a confiança nele e Wang temia por sua vida.

De acordo com fontes do PCC, quando o Consulado dos EUA entregou Wang às autoridades de Pequim, ele revelou uma trama organizada por Bo Xilai, Zhou Yongkang e outros membros da facção leal ao ex-líder chinês Jiang Zemin.

Xi Jinping estava programado para ser instalado como chefe do PCC em novembro de 2012. Bo Xilai e Zhou Yongkang planejaram removê-lo dessa posição logo em seguida.

O golpe, segundo membros do PCC, destinava-se a garantir que a facção de Jiang Zemin evitaria a possibilidade de ser responsabilizada por crimes cometidos na campanha de Jiang contra o Falun Gong.

Em julho de 1999, Jiang Zemin ordenou que o Partido Comunista “erradicasse” a prática espiritual do Falun Gong. Jiang temia o grande número de chineses – entre 70 e 100 milhões, segundo relatórios oficiais – que aderiram à prática. Ele também temia que os princípios morais tradicionais do Falun Gong desafiassem à ideologia do Partido Comunista.

Investigações

A nova liderança do PCC reagiu contra a facção de Jiang e paciente e sistematicamente construiu um processo contra Zhou Yongkang.

Em abril de 2012, o então líder chinês Hu Jintao removeu Bo Xilai de suas posições do PCC. Em setembro de 2013, Bo foi considerado culpado de corrupção, peculato e abuso de poder.

O Epoch Times informou em maio de 2012 que Hu Jintao lançou uma investigação sobre Zhou Yongkang, embora o inquérito não tenha sido anunciado.

“Zhou é um grande tigre, não é fácil livrar-se dele. Além disso, ele tem outras figuras poderosas, como Jiang Zemin, apoiando-o”, disse Heng He. “Xi Jinping teve de construir um caso sólido e se certificar de que se livraria dele.”

Sob Xi Jinping, no último ano, o PCC investigou uma série de comparsas e ex-subordinados de Zhou Yongkang, desmontando as redes leais a ele.

Zhou tinha três fontes de poder. No início de sua carreira, ele desempenhou um papel de liderança na indústria do petróleo. Ele se tornou chefe do PCC da província de Sichuan em 1999, e, em 2002, ele começou a assumir posições de liderança no aparato de segurança pública.

Na investigação sobre Zhou Yongkang, aliados de poder substancial foram visados, como o executivo do petróleo Jiang Jiemen; o vice-ministro de Segurança Pública, Li Dongsheng; e o número dois na província de Sichuan, Li Chuncheng.

Um mês atrás, seis ex-secretários de Zhou Yongkang foram presos. “Seus secretários sabem todos os detalhes dos crimes de Zhou”, disse Heng He. “Uma vez que eles foram presos, era de se esperar que a vez de Zhou chegasse em breve.”

Crimes

Como Bo Xilai e outros líderes do PCC derrubados por Xi Jinping, Zhou Yongkang sem dúvida será julgado por corrupção.

Embora o histórico de corrupção de Zhou seja enorme, essa não é a razão por que Xi Jinping está agindo contra ele. “Xi Jinping não pode evitar prender Zhou Yongkang”, disse Heng He. “Se Xi Jinping mostrar qualquer fraqueza em relação a Zhou, ele será engolido vivo.”

A acusação contra Zhou não mencionará seus crimes mais graves, aqueles cometidos durante a perseguição ao Falun Gong.

Em 2002, Jiang Zemin deslocou Zhou Yongkang da posição de chefe da província de Sichuan para a de ministro da Segurança Pública. Zhou tinha 30 anos de experiência na indústria do petróleo, mas nenhuma experiência em segurança pública e trabalho policial.

Em 2004, Jiang elevou Zhou a segunda posição no comando do Comitê dos Assuntos Político-Legislativos (CAPL), o órgão do Partido Comunista que controla quase todos os aspectos da aplicação da lei, incluindo a polícia civil e militar, os tribunais, a procuradoria, os campos de trabalho forçado, centros de detenção, prisões etc.

Em 2007, apesar de Jiang estar aposentado há anos, ele arranjou que Zhou fosse promovido a chefe do CAPL e obtivesse um assento no Comitê Permanente do Politburo.

O rápido avanço de Zhou Yongkang assemelha-se ao de outros casos de partidários de Jiang Zemin. As carreiras de Bo Xilai e Li Dongsheng, por exemplo, também mostram uma ascensão muito rápida na hierarquia do PCC, assim como papéis de liderança na perseguição aos praticantes do Falun Gong.

De acordo com Heng He, Zhou Yongkang é um dos principais responsáveis pela perseguição aos praticantes do Falun Gong entre 2002-2012. “Ele tinha muito poder”, disse Heng He. “E usou isso para promover a perseguição.”

De acordo com o Centro de Informação do Falun Dafa (CIFD), a assessoria de imprensa do Falun Gong, desde que a perseguição começou em 1999, centenas de milhares de praticantes foram detidos e continuam encarcerados.

Os detidos têm sido frequentemente submetidos à lavagem cerebral e tortura. De acordo com o CIFD, mais de 3.700 casos foram confirmados de praticantes sendo mortos por tortura e abusos. Devido ao bloqueio da informação do regime comunista chinês, o número de mortes seria na verdade muito superior.

Além disso, pesquisadores estimam que dezenas de milhares de praticantes foram mortos no processo de extração forçada de órgãos para suprir a indústria de transplante da China.

Agora que acusações estão sendo preparadas contra Zhou, o veredito de culpado, segundo o sistema do PCC, seria certo. Mas esse veredito não acabará com a campanha de Xi Jinping contra a facção de Jiang Zemin.

“Jiang Zemin tem procurado influenciar o PCC desde que deixou o cargo e ainda tem uma facção leal a ele”, disse Heng He. “No caso de Jiang, Xi não precisa prendê-lo. Ele simplesmente tem de remover cada fração de poder dele.”