Defesa antimíssil e a relação Rússia-Estados Unidos

24/05/2012 03:00 Atualizado: 24/05/2012 03:00

(esquerda-direita) Greg Thielmann juntou-se à Associação de Controle de Armas do Instituto Brookings em 2009. David Hoffman é editor-contribuidor da revista Foreign Policy, e autor de ''A mão morta''. Steven Pifer, ex-embaixador da Ucrânia, é diretor da Iniciativa de Controle de Armas do Instituto Brookings, e autor do novo relatório, ''Defesa antimíssil na Europa: Cooperação ou contenção?'' Eles falaram em 17 maio no Brookings sobre a relação EUA-Rússia. (Gary Feuerberg/The Epoch Times)WASHINGTON – A questão controversa da defesa antimíssil ressurge entre Washington e Moscou. A Rússia teme que os planos da OTAN de defesa antimíssil no final da década ameacem sua defesa estratégica antimíssil. Até agora, as garantias dos EUA de que os mísseis não são destinados à Rússia não tem sido suficientes para eliminar esses medos.

No final de 2010, a Rússia concordou em explorar um arranjo de defesa cooperativa, buscando uma “garantia legal” de que as armas dos EUA não seriam dirigidas contra seus mísseis balísticos estratégicos. Esta garantia faria os EUA limitarem o número, a velocidade e a localização de seus interceptores de defesa antimíssil.

Mas as duas nações ainda têm de chegar a um entendimento e uma forte oposição republicana no Senado dos EUA está no caminho da Rússia conseguir o que deseja. A administração Obama tenta fazer os russos aceitarem uma garantia política em lugar de uma garantia legal de não direcionar as defesas antimísseis dos EUA e da OTAN contra a defesa estratégica russa.

Em 17 de maio, o Instituto Brookings organizou um debate sobre as perspectivas para a resolução cooperativa da defesa antimíssil da Europa. A nova série Controle de Armas do Brookings divulgou um documento de 37 páginas, “Defesa antimíssil na Europa: Cooperação ou contenção?”, que discute um acordo de cooperação OTAN-Rússia na defesa antimíssil.

O autor do texto Steve Pifer argumenta que a participação da Rússia poderia idealmente proporcionar vários benefícios para a defesa antimíssil da Europa. A defesa antimíssil poderia se tornar um trunfo ao invés de um problema nas agendas EUA-Rússia e OTAN-Rússia e fornecer uma defesa antimíssil mais forte na Europa, diz Pifer, que é diretor da Iniciativa de Controle de Armas do Instituto Brookings e ex-embaixador da Ucrânia.

Alguns sugerem que o presidente Vladimir Putin está simplesmente adiando a questão até depois da eleição presidencial nos EUA antes de se comprometer com qualquer coisa. Pifer reconhece que um acordo de defesa cooperativo “parece quase impossível em 2012”.

Defesa antimíssil limitada

A estratégia de defesa antimíssil dos EUA tem oscilado ao longo das décadas, mas a ofensiva sempre se desenvolveu mais rápido do que a defesa. O presidente Ronald Reagan esperava que sua Iniciativa Estratégica de Defesa (IED) daria aos EUA a capacidade de se defender de um ataque soviético de mísseis balísticos em grande escala. Mas no final da década de 1980 ficou claro que “tecnologias defensivas eram muito mais difíceis de desenvolver do que o previsto”, e os custos eram excessivos, escreveu Pifer.

Na administração de George H. W. Bush, o âmbito da IED foi retraído para proteger contra um número limitado de armas ofensivas, que, segundo Pifer, continua a ser a política dos EUA. O foco de ameaça estreitou-se em 1998 as nações do Iraque, Irã e Coreia do Norte com uma comissão presidida por Donald Rumsfeld.

O escritor Greg Thielmann aponta que a Comissão Rumsfeld previu que cada uma dessas nações poderia ter ICBMs até 2003.

Embora alarmista, o relatório da Comissão Rumsfeld incentivou o Congresso a aprovar o sistema de Defesa Nacional Antimíssil em março 1999 pedindo uma defesa da pátria contra o “ataque limitado de mísseis”. Naquele momento, entendeu-se que a defesa antimíssil dos EUA não poderia “defender-se efetivamente contra um ataque deliberado em grande escala russo ou chinês”, disse Thielmann, um ex-oficial do Serviço de Relações Exteriores dos EUA que atualmente faz parte da Associação de Controle de Armas do Brookings.

Thielmann observa que em 2012 a Coreia do Norte e o Irã ainda não têm os mísseis nucleares de longo-alcance previstos pela Comissão Rumsfeld.

O plano dos EUA

Como uma alternativa ao plano da administração anterior, a administração Obama propôs uma Abordagem Europeia Adaptativa em Fases (AEAF) para a defesa antimíssil, que se esperava ser mais aceitável para os russos, porque está ligada à situação real ao invés de ameaças balísticas hipotéticas, de acordo com Thielmann.

A fase 1 da AEAF, que está em operação agora no Mar Mediterrâneo oriental, instalou o interceptor de mísseis SM-3 Bloco 1A com o radar Aegis SPY-1 que é capaz de rastrear um grande número de alvos de mísseis balísticos simultaneamente. Ele tem a capacidade de interceptar “ogivas de mísseis balísticos iranianos existentes de curto e médio alcance”, escreveu Pifer.

Os russos expressaram preocupação a respeito da fase 4 no final da década. Então, a AEAF terá o SM-3 Bloco IIB; atingindo velocidades de 5 km por segundo, muito maior do que os 3 km por segundo do Bloco 1A. Os russos consideram esta velocidade uma ameaça a sua defesa estratégica, disse David Hoffman, editor-contribuidor do Washington Post e da revista Foreign Policy, que já entrevistou vários generais russos aposentados.

De acordo com a Pifer, o SM-3 Bloco IIB terá a capacidade de interceptar ogivas de mísseis balísticos de alcance médio e intermediário e alguma capacidade contra ogivas de mísseis balísticos intercontinentais (ICBM). Eles seriam provavelmente implantados na Polônia.

Os russos não gostam da localização de sítios nos Mares do Norte e perto das fronteiras russas na Romênia e Polônia, disse Hoffman. “Estamos deixando os russos desconfortáveis”, ao trazer a defesa antimíssil de volta à discussão, disse Hoffman. Ele enfatizou que eles “não estão preparados tecnologicamente para competir na defesa antimíssil”. “Cabe a nós sermos sensíveis a sua mentalidade”, mesmo que às vezes sejam um pouco irracionais e paranoicos, disse ele.

Obstáculos à cooperação

O tipo de acordo “legal” que a Rússia busca é inviável no atual clima político, embora Putin pareça ter recuado um pouco. Imediatamente depois de tomar posse em 7 de maio, ele mudou suas palavras para “garantias firmes”. Mas um acordo russo envolve estabelecer limites sobre o número, a velocidade, e os locais dos interceptadores de defesa antimíssil.

No início deste mês no Wall Street Journal, o senador republicano Jon Kyl escreveu que, “o presidente Barack Obama não pode oferecer qualquer tipo de garantia ‘legalmente comprometedora’, porque quando ele solicitou a ratificação do Tratado Novo Começo em 2010, ele prometeu aceitar sem limites as defesas antimísseis dos Estados Unidos”.

Kyl, referência em matéria de defesa entre os senadores republicanos, disse que se opõe fortemente ao presidente oferecer garantias políticas do tipo que Obama sugeriu ao presidente russo Dmitry Medvedev. Uma gravação delicada em Seul em 26 de março publicou o presidente Obama dizendo que teria “mais flexibilidade” após a eleição. Mas Kyl diz que a oferta de garantias políticas “seria um erro grave… O direito à autodefesa não é algo que tenhamos de negociar.”

Ambos Thielmann e Pifer dizem que a liderança republicana apoia a defesa estratégica antimíssil como uma questão de fé. “Toda mudança política ou redução da defesa é julgada em função de implicar uma falta de compromisso com a causa da defesa estratégica antimíssil”, escreveu Thielmann.

Todos os três oradores salientaram que a posição de Kyl falha em considerar as vantagens da cooperação russa na defesa antimíssil europeia. “A principal contribuição da Rússia para um sistema cooperativo de defesa antimíssil com a OTAN seria o alerta prévio e o rastreamento de dados do radar russo em Armavir e do radar operado pela Rússia em Gabala”, escreveu Pifer. Ele disse que esses radares provavelmente fornecem alerta e dados de rastreamento mais cedo de mísseis do Irã do que o radar dos EUA na Turquia.

Pifer também mencionou que oficiais dos EUA e da Rússia concordaram em 2011 num “centro de fusão de dados” e num “centro de operações e planejamento” compartilhados. Este tipo de cooperação seria um longo caminho para neutralizar a desconfiança e percepções equivocadas.

Os EUA poderiam mostrar mais flexibilidade se os EUA ou a OTAN “optarem por não implantar o interceptor SM-3 Bloco IIB se fosse claro que o Irã não esteja fazendo progresso em alcançar capacidade de mísseis de longo alcance”, escreveu Pifer.