O Rally Dakar 2014 teve início em 5 de janeiro de 2014 na cidade de Rosário, Argentina; passará pela Bolívia e entrará no deserto chileno ao norte, para finalizar no histórico Porto de Valparaíso. O evento esportivo acontece de novo depois de um ano de reclamações por impunidade quanto aos danos arqueológicos e de propriedade.
Durante as negociações do ano, o Peru foi substituído pela Bolívia, que se torna o oitavo país onde o rally irá atravessar. O Equador, outra alternativa, renunciou ao evento alegando razões ambientais. A impunidade diante dos danos irreparáveis aos sítios arqueológicos milenares e geoglifos, denunciados pelo Chile, e o projeto de lei “Santa Fé livre de Dakar” na Argentina são um marco desta nova edição.
Ao longo do caminho, depois de sua partida de Rosário em 5 de janeiro de 2014, a caravana do Dakar irá para o oeste para contornar a Cordilheira dos Andes até Salta, quando terão uma folga no dia 13 de janeiro. Na próxima fase, as motos e os carros continuarão até a Bolívia e os caminhões atravessarão a Cordilheira para chegar ao Chile diretamente, onde todos se encontrarão novamente no Deserto de Atacama. Em 18 de janeiro, chegarão à etapa final em Valparaíso.
Embora a oposição tenha pedido uma ação do Conselho de Estado do Chile, o secretário de Estado de Esportes do Chile, Gabriel Ruiz Tagle, ressaltou que a acolhida ao Dakar faz parte da política do governo de trazer grandes eventos esportivos ao país, segundo o site Tu TV.
O Ministro do Turismo da Argentina, Enrique Meyer, afirmou que “seremos capazes de continuar aproveitando o potencial para a promoção e divulgação da nossa região em todo o mundo e o impacto da mídia implicará sermos vistos em mais de 120 países,” acrescentou o site Tu TV em março 2013.
Por sua vez, o ministro da Presidência boliviana, Juan Ramon Quintana, disse que quando o acordo foi feito, o Governo de Evo Morales teve um “trabalho tremendo” para que o rallly chegasse ao seu território. Segundo o ministro, o rally servirá para “dar a conhecer ao mundo os 36 povos indígenas do país, suas paisagens e sua gente.”
Ausência do Equador
A Presidência da República do Equador comunicou formalmente aos organizadores do rally Dakar que o evento “não é do interesse do país por várias considerações governamentais.” A nota, dirigida a Gregory Murac, da empresa francesa Amaury Sport Organisation (ASO), responsável pelo Dakar, assinada pelo Subsecretário-Geral da Presidência da República, Jorge Oswaldo Troy Fuertes, foi enviada de Quito no Equador em 10 de maio com o ofício PR-SSDES-2013-023765-0, de 10 de maio de 2013, de acordo com o site Prensa Indígena.
O Dr. Raúl Montenegro, presidente da Fundação para a Defesa do Meio Ambiente (Funam) da Argentina, disse que foi “a primeira rejeição esmagadora sofrida pelo Rally Dakar na América do Sul depois de ter sido praticamente banido da África em 2008.” O Ministério do Turismo do Equador qualificou como “não recomendado para o país” a realização do Rally Dakar, segundo o ofício MT-MINTUR-2013-1253 de 26 de Abril de 2013.
Nesse documento são analisados “os aspectos positivos e negativos, especialmente os graves impactos já produzidos pelo Rally Dakar sobre os ambientes nativos e os sítios arqueológicos e paleontológicos no Chile, Peru e Argentina. Este ano, o ministério solicitou a opinião técnica da Funam”, informou o Prensa Indígena.
Pedido de comissão para Dakar
Este ano, organizações como “Ação Verde” e “Fundação Nosso Patrimônio” do Chile, o Museu de Paleontologia Meyer Hönninger do Peru e a Funam da Argentina, pediram aos governos de seus respectivos países que constituam “uma comissão independente de peritos reconhecidos nacional e internacionalmente”, informou o Prensa Indígena.
O pedido foi para “avaliar os danos históricos, arqueológicos, paleontológicos e sobre a biodiversidade, causados pelo Rally Dakar de 2013, assim como pelas edições anteriores.”
Sugeriram, para isto, “a incorporação de pesquisadores procedentes de universidades públicas e centros de pesquisa reconhecidos nos três países, sem relação com os governos e a empresa francesa ASO”, responsável pelo Dakar.
Denúncia de impunidade
A Associação de Arqueólogos do Chile afirmou que “está profundamente decepcionada em como dois dos três poderes do governo do Chile puderam se unir para permitir essa pseudo competição esportiva, que só traz destruição ao Chile. Ainda assim, mantemos a esperança de que será o Poder Legislativo que finalmente agirá com um senso de Estado e protegerá o patrimônio cultural chileno”, informou a porta-voz Ximena Cifuentes, de acordo com o site Universitario Informado.
A Câmara do Chile reconheceu em dezembro de 2012 que as versões anteriores do Dakar destruíram mais de 44,5% dos sítios arqueológicos localizados no deserto de Atacama, no Chile, os quais ficam exatamente no trajeto de La Carrera, que a cada ano percorre o norte do Chile.
Parlamentares salientaram que, na prática, o que deve importar é se haverá fiscalização e multas por violações das medidas que possam ser impostas.
Arqueólogos chilenos denunciaram que Amaury Sport Organisation (ASO) continua impune pelos danos causados ao patrimônio arqueológico e reclamaram que nas edições de 2011 e 2012 foram totalmente retiradas as medidas compensatórias. De acordo com o seu relatório, Dakar causou sérios prejuízos ao patrimônio nacional. Em um dos exemplos fotografados observam-se marcas de pneus sobre os geoglifos. (Ver fotos)
“O Rally Dakar está destruindo mais do que o patrimônio ambiental ou arqueológico, está colocando em risco todo um sistema de proteção política e jurídica”, disse Paola Gonzalez, vice-presidente da Associação de Arqueólogos, quando da realização do Dakar 2013, de acordo com o site Cooperativa.
Paola Gonzalez afirmou que parece “incompreensível” que o governo chileno “permaneça inativo” diante da destruição de seu patrimônio cultural. “Por que se permite que uma empresa estrangeira viole as nossas instituições penais e ambientais?”, questionou.
Por sua vez Lucio Cuenca, diretor do Observatório Latino-Americano de Conflitos Ambientais (Olca) expressou dúvidas quanto às avaliações de impacto ambiental.
“Qualquer atividade de alto impacto como o Rally Dakar, de acordo com a nossa legislação, deve ser submetida a uma avaliação de impacto ambiental. Não sei por que, neste caso em particular, as rotas foram mantidas em segredo e não é permitido realizar estudos e verificar previamente se o que foi dito pelo senhor do Instituto Nacional de Esportes é verdadeiro. Nós temos sérias dúvidas”, disse ele em novembro de 2012, à Radio Universidad de Chile.
O presidente da Associação de Arqueólogos do Chile, Carlos Carrasco, explicou que no ano de 2012 foi realizada “uma pseudo-avaliação do impacto ambiental. Foi adotada uma linha de atuação completamente inadequada em todas as situações. Em 2009, nada foi feito. Em 2010, 2011 e 2012 foram realizados passeios pela suposta rota para identificar sítios arqueológicos, mas isso foi feito uma ou duas semanas antes da competição, o que é absolutamente insuficiente para que haja tempo de se providenciar qualquer tipo de proteção”, disse ele à rádio.
No norte do Chile, integrantes da Mesa do Patrimônio de Calama comunicaram em janeiro de 2013 que a sua posição é a mesma que a da Associação de Arqueólogos do Chile.
“A questão não tem equívocos, de acordo com a Mesa; foram causados danos a sítios arqueológicos e a impunidade deste delito grave é evidente”, informou a Mesa do Patrimônio em 1 de novembro, de acordo com o site Calama Cultural.
Santa Fé livre de Dakar
A Organização Los Verdes, juntamente com outros movimentos ambientalistas, relatou sobre o projeto de lei Santa Fé livre de Dakar.
“Esse espetáculo foi montado apenas para realizar um grande negócio, onde as grandes empresas demonstram suas inovações tecnológicas, colocando em perigo a vida não só dos concorrentes e da equipe que os acompanha, mas também traz muitos outros riscos à concorrência”, segundo o documento do Projeto difundido por Los Verdes.
“Esta competição é a expressão mais retrógrada e perigosa do automobilismo”, disse o comunicado.
O projeto se uniu a Los Verdes, Trama Tierra, Oficina Ecológica, Fundação Proteger, Centro de Proteção à Natureza, Oficina de Comunicação Ambiental, Associação Ecosur, Centro Ecológico Renacer e Paraná No Se Toca.