Criando prosperidade de partilha justa na Ásia

11/07/2012 03:00 Atualizado: 11/07/2012 03:00

Uma jovem indiana enche potes com água potável num tanque de abastecimento do governo na favela de Rasoolpura em Hyderabad, em 19 de abril. (Noah Seelam/AFP/Getty Images)A riqueza está sendo transferida de forma sem precedentes do Ocidente para o Oriente e um velho modelo econômico está se desintegrando, dando início a desastres sociais e ambientais.

É hora de uma nova abordagem e a Ásia deve assumir a liderança. Em 2050, o continente será o lar de mais de 60% da população mundial e a maioria dos pobres, desnutridos e sem instrução do mundo.

Um relatório recente das Nações Unidas, “Eficiência de Recursos: Economia e Panorama para a Ásia”, adverte que uma gestão mais eficiente dos recursos é crucial para que o mundo atenda às necessidades dos desprivilegiados e não deixe o planeta esgotado e deserto.

Direitos essenciais

Dada sua população, a Ásia é o cerne deste dilema. O relatório aponta que para atender às necessidades básicas da humanidade e sustentar os recursos do planeta, a utilização per capita dos recursos deve ser reduzida em 80% dos níveis atuais, exigindo uma revisão das abordagens atuais de investimento e dos modelos econômicos que prosperam na ineficiência de recursos.

Devido a estas duras realidades, a Ásia deve parar de nutrir esperanças de que um retorno rápido ao crescimento da exportação, através do consumo desenfreado, trará prosperidade para todos. Ao invés disso, deve basear-se no progresso dos últimos 30 anos sobre a elaboração de políticas que dão direitos essenciais e dignidade para a maioria carente.

Os direitos essenciais começariam com um abastecimento alimentar seguro, saneamento e água adequados, habitação básica, acesso à energia, educação fundamental para todos, saúde e mobilidade adequada. Se todos os fatores forem agregados como um indicador, mais da metade da população da região seria considerada marginalizada.

Os números são grandes: Na Índia, cerca de 800 milhões de pessoas não têm acesso a saneamento básico e 400 milhões não têm acesso à eletricidade. Mais de 70% das crianças subnutridas do mundo são asiáticas.

Atender esses direitos básicos deveria ser a prioridade de todos os governos, sem dependência da ajuda do mundo desenvolvido. Caso contrário, a declaração de um século asiático ocultaria uma bomba-relógio.

A crise financeira global deveria estimular os governos asiáticos a lançarem ideias novas e ousadas aproveitando a ascensão da Ásia para abordarem a questão central do progresso humano.

Partilha justa

Uma direção possível é o que poderia ser chamado de “prosperidade de partilha justa”, o investimento de capital público e privado para criar um impacto positivo, bem como gerar retornos financeiros.

Muitas vezes referido como “investimento de impacto”, tais investimentos ajudariam principalmente a construir empresas e atividade econômica que satisfaçam as necessidades básicas. Estas empresas são muitas vezes amplamente chamadas de empresas sociais embora haja um debate saudável sobre o que se qualificaria. Isto não é tão utópico quanto pode parecer à primeira vista.

Um exemplo é uma fábrica de iogurte criada em Bangladesh por um empreendimento conjunto envolvendo a Grameen e a Danone para lidar com questões de nutrição. Outro exemplo é um desenvolvedor imobiliário nas Filipinas que proporciona habitação a preços acessíveis.

Outras histórias de sucesso incluem a produção comunitária de alimentos e a educação especial na China, cuidados de saúde para a população rural pobre da Índia e projetos de energia renovável na Índia e Laos.

Tais investimentos requerem dois princípios fundamentais: um compromisso de investir na economia real para atender às necessidades básicas e nenhum incentivo para maximizar lucros através da externalização de custos e subvalorização de recursos.

Mais investidores e acionistas estão começando a ver a necessidade de incluir esses investimentos em seu portfólio, de empresas familiares estabelecidos na Ásia tentando proteger interesses de longo prazo até instituições financeiras, que reconhecem a necessidade de ir além do poder estabelecido e encontrar investimentos que atendam as necessidades básicas da maioria.

O reconhecimento do governo, a facilitação e até mesmo a legislação são fundamentais na maioria dos países para persuadir bancos, empresas e investidores na China, Vietnã, Indonésia e outros países.

Melhor distribuição

A prosperidade de partilha justa poderia oferecer aos governos, empresas e investidores melhores formas de canalizar seus recursos financeiros e ao mesmo tempo legitimidade para construírem um mundo cada vez mais transparente, em que os modelos antigos e suas falhas sejam questionados.

Um dos alvos são empresas sociais com missões explícitas e estratégias de desenvolvimento sustentável. Como uma barreira fundamental muitas vezes é o acesso ao capital, competência administrativa e tecnologia, os governos e os investidores precisam trabalhar em estreita colaboração para assegurar que os incentivos estejam alinhados e que esta nova classe de bens esteja estruturada.

Com relação ao capital, por exemplo, os governos podem obrigar as instituições financeiras a alocarem certa quantidade para este setor. Além disso, instituições financeiras na região podem nutrir uma nova classe de bens para a criação de prosperidade de partilha justa.

Unidades de riqueza privada nos bancos podem desempenhar um papel fundamental, introduzindo seus clientes para as possibilidades neste setor, ao invés de promover a filantropia. Tudo isso permitiria que os investidores pudessem ir além da atual tendência de simplesmente dar, mesmo quando atividades principais se baseiam em práticas que são social e ambientalmente destrutivas.

De acordo com um relatório recente, “Redirecionando o capital da Ásia: Além da margem” da Avantage Ventures, um fundo de investimento social na Ásia baseado em Hong Kong (diga-se de passagem, eu sou o presidente da Avantage Venture), um compromisso de cerca de 2,75 bilhões de dólares por ano, 1% dos fluxos totais da região em 2010, satisfariam a necessidade de financiamento para empreendimentos sociais existentes.

Em 2020, o impacto potencial do mercado de investimento cresceria consideravelmente, o relatório estima: até 4 bilhões de dólares para o acesso rural à energia, 17 bilhões para água e saneamento, 50 bilhões para a saúde de idosos e 33 bilhões para a habitação de baixo custo.

Empresas olham ativamente para essas tendências. A motivação é a construção de novos mercados com produtos de nicho, diversificar, atrair novos clientes, alinhar estratégias de negócios selecionadas com as prioridades dos governos asiáticos no atendimento das necessidades mais básicas e, simultaneamente, gerar enormes melhorias socioambientais.

Muitos executivos veem isso como um uso mais produtivo dos fundos atualmente destinados à caridade e a orçamentos corporativos de responsabilidade social, que muitas vezes são acusados de criar desperdício.

A chave para enfrentar esses desafios é a criação de um mercado de capital eficiente através de uma combinação de políticas governamentais e de figuras principais nos mercados financeiros e negócios na Ásia. Para aqueles que ainda não estão convencidos, outra razão é a redução do risco de convulsões sociais de larga escala que possam ameaçar os bens existentes e diminuir a expansão dos interesses comerciais.

Capital disponível

A Ásia não tem escassez de capital para construir esta nova classe de ativos para investidores esclarecidos. Indivíduos com grande capital, que geralmente preferem investir o dinheiro nos Estados Unidos e na Europa, são uma fonte.

Os governos da Ásia devem criar incentivos para que eles invistam a nível regional, mas um mercado construído por pioneiros requer um salto de fé. Eles poderiam moldar o setor ao invés de replicar modelos ocidentais inadequados.

As empresas sociais que buscam investimentos, não doações, incluem projetos rurais de abastecimento de água no Vietnã e Camboja, a agricultura comunitária na China e no Camboja, a eletrificação rural no Laos e Índia, habitação acessível nas Filipinas e cuidados de saúde na China e na Índia.

Agora é o momento para os investidores asiáticos, apoiados pelos governos, enfrentarem o desafio e liderarem o caminho, investindo em empreendimentos que tornem a Ásia mais próspera, em que a riqueza seja compartilhada de forma justa e, assim, construindo sociedades que sejam mais seguras.

Chandran Nair é presidente do Avantage Ventures e autor de “Consumptionomics: O papel da Ásia na reformulação do capitalismo e na salvação do planeta” (John Wiley, 2011). Copyright © 2012 Centro Yale para o Estudo da Globalização (Yaleglobal.yale.edu).