Coragem desafia regime de ilegalidade na China

13/04/2014 14:31 Atualizado: 13/04/2014 14:31

Buscar justiça na China exige estar disposto a ter a fraca carne e sangue se chocando contra o aço da opressão. Quatro advogados de direitos humanos que assumiram esse risco numa região remota no extremo norte da China chamaram a atenção da nação sobre os secretos infernos extrajudiciais utilizados para aterrorizar fiéis, dissidente, minorias e tantos mais na China.

Em 20 de março, Tang Jitian, Jiang Tianyong, Zhang Junji e Wang Cheng chegaram ao Centro Jiansanjiang de Lavagem Cerebral na província de Heilongjiang buscando a liberação de seus clientes, praticantes do Falun Gong que foram presos ilegalmente por suas crenças. Os advogados se juntaram a 30 familiares.

Mesmo que estes quatro advogados sejam veteranos defensores dos direitos humanos e tenham sofrido assédio, suspensão de suas licenças e até mesmo espancamentos, eles não tinham razão especial para esperar que fossem presos. Nos últimos quatro meses, eles fizeram esta peregrinação duas vezes antes. Ainda assim, eles estavam cientes dos riscos.

Jiang Tianyong tinha preparado para seu trabalho de advogado de defesa escrevendo a seguinte declaração: “A maioria dos que podem advogar por mim está presa. Agora, é a minha vez. Eu autorizei uma procuração ontem.”

“Aqui e agora eu declaro: (1) Eu nunca cometerei suicídio. Minha morte só pode ocorrer por assassinato. (2) Eu contratei um advogado. Não recusarei um advogado. Eu rejeitarei qualquer advogado nomeado pelas autoridades. (3) Eu sou de carne e osso. Porque eu tive algumas experiências, eu sei que não sou muito forte. Qualquer renúncia, arrependimento ou promessa feito enquanto eu não estiver livre é inválido.”

Detenções

Na manhã de 21 de março, os quatro advogados foram levados para a delegacia de polícia. Enquanto policiais uniformizados observavam, homens à paisana os espancaram severamente. Zhang Junjie sofreu três ossos quebrados. Quando liberado cinco dias depois, ele disse que os outros três advogados, que ainda estão detidos, têm sofrido tortura muito pior.

Notícias de suas prisões se espalharam pela internet. Mais advogados, incluindo os que representam os quatro advogados presos e outros ativistas, correram para Jiansanjiang de outras áreas. Quando os pedidos dos advogados para encontrar seus clientes foram rejeitados, eles começaram um jejum diante do centro de detenção em protesto.

A mídia social chinesa aplaudiu os manifestantes. Mais pessoas foram a Jiansanjiang, e muitos mais se reuniram no local para apoiar os advogados e postar suas fotos online.

Em 29 de março, as autoridades atacaram novamente. A polícia subitamente levou cerca de 20 pessoas que estavam na frente do centro de detenção e espancou muitos deles, inclusive advogados.

O que era uma questão local adquiriu dimensão nacional. As forças de segurança nacionais então passaram a verificar os hotéis, visitar as casas dos ativistas fora da província de Heilongjiang e a fazer perguntas sobre o incidente de Jiansanjiang.

Enquanto isso, o Departamento Central de Propaganda do Partido Comunista Chinês e o Departamento Estatal de Informação da Internet têm tentado colocar o gênio de volta na garrafa e mitigar, por agora, a crescente indignação popular. Eles emitiram ordens para censurar todas as informações relacionadas.

Centro de Lavagem Cerebral

Jiansanjiang é um nome estranho que a maioria dos chineses nunca tinha ouvido falar antes dos eventos das últimas duas semanas de março. Agora ele é notório – um nome que representa a vasta rede de centros de lavagem cerebral em toda a China.

Os praticantes do Falun Gong detidos em Jiansanjiang, que os advogados foram defender, são vítimas de uma campanha política.

Em 1999, Jiang Zemin, o então líder do Partido Comunista Chinês (PCC), temia os 100 milhões – um número maior do que os membros do PCC – que praticavam esta forma de qigong tradicional e seus princípios de verdade, compaixão e tolerância.

Jiang também temia que o povo chinês preferisse os ensinamentos morais tradicionais do Falun Gong a ideologia ateísta do PCC. Assim, sem sequer colocar uma única lei nos livros que tornasse o Falun Gong ilegal, Jiang lançou sua campanha para erradicar a prática.

Não deveria ser uma surpresa que esta campanha extralegal utilizasse medidas extrajudiciais. Os campos de trabalho, cujos presos podem ser condenados sem uma ordem judicial, são reconhecidos como a principal arma do regime contra o Falun Gong.

Após as torturas de praticantes do Falun Gong e outros no Campo de Trabalho Masanjia serem divulgadas, todo o ‘sistema de reeducação pelo trabalho forçado’ teria sido oficialmente fechado até o final de 2013.

Com os campos de trabalho abandonados, ou pelo menos renomeados, tem havido crescentes relatos de praticantes do Falun Gong sendo enviados para “centros de educação legal”, como Jiansanjiang, que são comumente conhecidos como centros de lavagem cerebral.

Estes centros têm existido paralelamente aos campos de trabalho e têm desempenhado um papel importante na perseguição ao Falun Gong. Enquanto os campos de trabalho eram instituições públicas, os centros operam em segredo e fora dos livros.

O Centro Jiansanjiang é administrado por vários órgãos do Partido Comunista da Secretaria de Reivindicação de Terras de Heilongjiang (SRTH). No entanto, ninguém pode encontrar qualquer vestígio oficial do Centro Jiansanjiang nos registros do PCC ou do Estado.

O negócio principal dessas instituições fantasmagóricas é forçar os praticantes do Falun Gong a desistir de suas crenças. Esses centros de lavagem cerebral existem para destruir o que um indivíduo mais aprecia na vida, o pensamento do que é bom e certo no mundo.

Qualquer medida que atinja esse objetivo é permitida. Isso significa inclusive, ou especialmente, a tortura. Enquanto o PCC chama esses locais de ‘centros de educação legal’, eles seriam melhor chamados de “centros de doutrinação pela tortura”.

O Centro Jiansanjiang não tem existência legal; ele persegue pessoas que não são culpadas de qualquer crime; e faz isso sem autoridade legal, por meio de medidas proibidas por lei. Depois de uma longa noite de vigília diante de Jiansanjiang, o segundo grupo de advogados foi esclarecido pela equipe do centro de detenção: “A lei serve para ocasiões especiais. A lei deve ouvir o chefe em primeiro lugar.”

Grupo de interesse

A SRTH, a região onde está localizado o Centro Jiansanjiang, não é desenvolvida, e o centro serve como uma importante fonte de renda para as autoridades locais.

De acordo com uma queixa ao presidente da Suprema Procuradoria da China, assinada por 108 cidadãos, familiares foram forçados a pagar 10 mil yuanes por mês por cada praticante do Falun Gong detido em Jiansanjiang.

Este é o resgate de um rei na China: 10 mil yuanes equivale a US$ 1.608. Uma pesquisa da Universidade de Pequim descobriu que a renda familiar média anual na China em 2012 foi de US$ 2.100.

Wu Lei é parte do segundo grupo de advogados que protestaram diante do centro de detenção. Ele visitou os moradores locais e foi informado que o centro de lavagem cerebral era o lugar mais odiado.

Autoridades capturam aleatoriamente e detêm os residentes locais que são de fato usados para chantagear seus parentes. Se o centro não tem um número suficiente de praticantes do Falun Gong, as autoridades simplesmente saem e capturam outros cidadãos.

Aqueles dependentes do Centro Jiansanjiang formam um poderoso grupo de interesse do Partido Comunista local. Infelizmente, esse grupo de interesse não está apenas no Centro Jiansanjiang. Ele está em toda a China, desde o Comitê Central do Partido Comunista até cada ramo do Partido em todos os níveis.

Para essas criaturas, perseguir o Falun Gong e abusar dos direitos humanos é uma fonte de lucro, e ampliar o alcance dos abusos é um bom negócio.

Política imutável

Em dezembro de 2013, Li Dongsheng, o chefe da organização secreta encarregada de perseguir o Falun Gong, foi colocado sob investigação pelo PCC. Sua carreira acabou, e a questão interessante agora é: que acusações serão feitas contra ele, quando ele eventualmente for julgado?

Durante o ano passado, os comparsas de Zhou Yongkang, o ex-chefe da segurança interna da China que ajudou a promover a perseguição ao Falun Gong, foram presos um após o outro. Não houve qualquer anúncio oficial sobre a prisão de Zhou, mas tem havido insinuações por meses, agora que ele está sob o controle do PCC.

Estes desenvolvimentos, juntamente com o fim do sistema de campo de trabalho forçado, podem sugerir que a perseguição ao Falun Gong está rumando para o fim. Mas os eventos em Jiansanjiang contam uma história diferente.

O PCC tem um histórico péssimo quando se trata de retratar suas violações dos direitos humanos. Qualquer alteração da política do Partido Comunista que envolva a perseguição do povo chinês tem de ser decidida no nível do Politburo ou acima, no nível do Comitê Permanente do Politburo.

Essa inversão só acorreu uma vez, no caso da Revolução Cultural. E a única razão para essa reversão foi que a Revolução Cultural teve como alvo o próprio Partido.

Com este histórico, as autoridades locais de Jiansanjiang sentem-se mais encorajadas. A Constituição chinesa e as leis da China não significam nada para elas, uma vez que se atrevem a deter ilegalmente e espancar advogados em plena luz do dia, enquanto o mundo inteiro assiste. Eles sabem que apenas a política do Partido conta. Essa é a realidade na China.

Tentar parar o mal feito pelo PCC, em Jiansanjiang e em toda a China, é arriscado e requer coragem. Por quase 15 anos, os praticantes do Falun Gong têm calmamente suportado todos os tipos de abuso, a fim de pedir ao povo chinês que não apoie o mal que o PCC tem feito.

Agora, mais e mais advogados e outros ativistas também estão escolhendo correr o risco de se opor aos crimes do regime brutal do Partido Comunista. Essa coragem exige admiração e apoio.