WASHINGTON – Um congressista disse que o termo “crimes contra a humanidade” parecia inadequado para as atrocidades descritas. Outro disse que era o “mais monstruoso crime” que ele poderia conceber.
Eles tinham acabado de ouvir depoimentos numa audiência no Congresso na quarta-feira dizendo como o Partido Comunista Chinês (PCC) desde a virada do século tem matado dezenas de milhares de prisioneiros da consciência por seus órgãos. A maioria das vítimas era praticante do Falun Gong, uma disciplina espiritual chinesa.
Em muitos casos, seus órgãos foram retirados de seus corpos enquanto ainda estavam vivos, matando-os no processo. E apesar de evidências terem surgido desde 2006, os governos de todo o mundo têm feito muito pouco sobre isso.
Em 12 de setembro, cada testemunha contribuiu com sua própria porção de discernimento para esclarecer essa história.
Ethan Gutmann, um jornalista investigativo, se referiu ao conjunto de depoimentos de testemunhas, muito dos quais ele adquiriu por meio de entrevistas com ex-cirurgiões e enfermeiros que têm conhecimento direto da colheita de órgãos de prisioneiros da consciência.
Ele também entrevistou praticantes do Falun Gong presos que tiveram seu tipo de sangue examinado, o que é necessário para que seus órgãos sejam colhidos. Ele lamentou a falta de interesse no Ocidente sobre as evidências que ele e outros trabalharam por reunir e pediu ao comitê que convidasse as testemunhas para interrogatório.
O Dr. Gabriel Danovitch, um professor de medicina da Universidade da Califórnia, notou os esforços que organizações internacionais de saúde têm feito para mudar as práticas abusivas chinesas de extração de órgãos. Em resposta a uma pergunta, ele assinalou que pelo menos um de seus pacientes foi à China contra sua advertência para receber um “rim sob demanda”. Danovitch contribuiu com um capítulo da recente publicação “Órgãos do Estado” (“State Organs”), que aborda este tópico.
O Dr. Damon Noto, porta-voz da sociedade médica “Doutores contra a Colheita Forçada de Órgãos”, apresentou uma análise histórica cuidadosa do início da colheita de órgãos pelo PCC e correu pela narrativa que chegou à conclusão de que o PCC colheu órgãos de pelo menos 60 mil prisioneiros da consciência do Falun Gong.
O aparato militar do PCC começou com prisioneiros no corredor da morte na década de 1990 e depois de 1999 mudou para a população recém-perseguida do Falun Gong. Houve um “aumento exponencial nos transplantes” de 2000 em diante, disse Noto.
Charles Lee, porta-voz do “Centro de Assistência Global para Renunciar ao Partido Comunista Chinês”, uma organização que facilita saídas do PCC, disse que o PCC tem uma longa história de matança e que a colheita de órgãos é parte do padrão.
Que a audiência tenha ocorrido reflete em si mesmo um avanço na proeminência da causa. Um grande número de pesquisadores envolvidos em documentar os crimes que foram objeto da audiência tem trabalhado na solidão por muitos anos, recebendo escassa atenção da mídia e muito menos reconhecimento por parte dos governos, que consideram importante manter boas relações com o PCC.
David Kilgour, também presente no dia e um ex-parlamentar canadense, sabe bem disso. Em 2006, ele e David Matas produziram um relatório inovador que foi revisto, atualizado e publicado como livro em 2009, “Colheita Sangrenta: Relatório sobre as alegações de colheita de órgãos de praticantes do Falun Gong na China”.
Desde então, ele e Matas, um distinto advogado de direitos humanos, têm viajado ao redor do mundo relatando a autoridades governamentais, pesquisadores de direitos humanos, jornalistas e qualquer outra pessoa que queira ouvir, sobre os resultados de suas pesquisas. Mas, geralmente, o assunto não é bem conhecido.
O momento dessa audiência, cerca de um mês antes da esperada abertura do maior conclave político do PCC, quando um novo lote de líderes será introduzido, é significativo, pensa Kilgour.
“O fato é que a pilhagem de órgãos é uma questão que está presa, como um albatroz, ao redor dos pescoços dos linhas-duras na liderança”, disse Kilgour. Isso tem sido a razão das lutas políticas recentes, de acordo com analistas.
“Isso tudo é parte de um continuum”, disse Kilgour sobre a audiência, na qual os crimes da colheita de órgão do PCC finalmente terão um ajuste de contas e se tornarão uma questão de registro histórico.
“Está se tornando um fato aceito agora, é possível sentir isso”, disse Ethan Gutmann. Gutmann já escreveu uma série de longos artigos de investigação explorando a colheita de órgãos de prisioneiros da consciência na China. “Eles falam sobre isso não como algo que deva apenas ser investigado. É um fato aceito”, disse ele.
A audiência foi organizada e presidida por dois membros do Comitê das Relações Exteriores: o Rep. Dana Rohrabacher (R-Calif.), presidente do Subcomitê de Supervisão e Investigações, e o Rep. Chris Smith (R-N.J.), presidente do Subcomitê sobre a África, a Saúde Global e os Direitos Humanos.
Michael Posner, secretário-adjunto de Estado para Democracia, Direitos Humanos e Trabalho do Departamento de Estado, foi convidado a prestar depoimento, mas não compareceu.
O Rep. Smith disse que a possibilidade dos crimes discutidos pelas testemunhas “empurra-nos além do horripilante, um além que desafia nossa linguagem, fazendo ‘barbaridade’ soar como uma palavra muito amena. Se isso é verdade, até mesmo a poderosa expressão cheia de legalidade ‘crimes contra a humanidade’ parece inadequada, diluída pelo horror.”
A Rep. Karen Bass (D-Calif.) descreveu o assunto como “profundamente preocupante”.
O Rep. Rohrabacher, que era o presidente da mesa, foi franco.
“O que estamos discutindo é um crime monstruoso. […] Rasgar o corpo de alguém que está simplesmente envolvido numa ideia religiosa ou pessoal ou política que é contra a vontade da elite dominante e não uma ameaça física ao regime, isto diz respeito ao crime mais monstruoso que eu possa conceber”, disse ele em declarações extemporâneas próximo do fim.
Num ponto, ele se dirigiu aos jornalistas presentes e perguntou se a Rádio Free Asia e a Voz da América relataram sobre o tema. Depois que ele teve a impressão de que não tinham, ele disse, “Que vergonha para nossa comunidade jornalística. […] Vergonha.”
“Essa audiência está relacionada com o cerne do que a América significa”, disse o Rep. Rohrabacher. “Se não nos importarmos com coisas como esta, que tipo de país e pessoas nos tornamos?”