Colômbia: França demonstra avalizar projeto de ‘polícia rural’ de Santos

09/02/2015 09:26 Atualizado: 09/02/2015 09:26

Uma medida absurda da Colômbia continuará sendo-o, por mais que seja apresentada como respaldada pela França. O anúncio (em pinceladas) do presidente Juan Manuel Santos de que seu governo criará uma “polícia rural” quando chegar a utópica era do “pós-conflito”, e que essa nova força incluirá os terroristas e subversivos das FARC, convertidos, é claro, em pacíficos e eficientes agentes da ordem, carece de sentido embora venha apadrinhado pelo presidente François Hollande, como a imprensa favorável a Juan Manuel Santos trata de fazer crer.

Esse respaldo não é certo. Ou pelo menos não há provas a respeito. Nas declarações do mandatário francês durante a coletiva de imprensa com Santos em Paris, Hollande não disse uma só palavra sobre isso. Embora o enviado da RCN tenha lhe perguntado precisamente se a ideia de incluir guerrilheiros desmobilizados na eventual “polícia rural” era para “proteger” esses indivíduos, o presidente Hollande evitou cuidadosamente tocar sequer de longe esse ponto. Quem tratou do tema foi o presidente Santos. Ele reiterou que trata-se de criar uma polícia particular nas zonas de guerra e que ele não rechaça a ideia de incluir guerrilheiros nessa nova polícia, e que tudo isso poderia “ser negociado” em Havana.

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Conclusão: a França não respalda, ao menos publicamente, essa iniciativa absurda. Por uma razão: não há na França um só antecedente nesse sentido e a opinião pública não aceitaria tal coisa. A Gendarmeria, que é a força que se ocupa da segurança nas zonas rurais e nas zonas peri-urbanas (a Polícia nacional se encarrega das zonas urbanas), e que é invocada agora por Santos como modelo do que quer fazer com sua “polícia rural” (para desmontar os Carabineros?), sempre dependeu do Ministério da Defesa (agora depende do Ministério do Interior) e nunca incorporou em suas fileiras terroristas ou criminosos, por mais “desmobilizados” ou arrependidos que fossem.

Não houve quando Paris assinou o fim da guerra na Argélia, em 1962, nem o fez desde então, apesar de que a França desmantelou perigosas estruturas terroristas em seu território. O tratamento que deu a essas redes não foi de negociação, concessões ou acordos de paz. O que faz contra as redes jihadistas é outra coisa, como acabamos de ver após as cruéis matanças islâmicas de 7 de janeiro de 2015 em Paris e a rápida liquidação dos três agressores. A Gendarmeria faz parte das Forças Armadas francesas. O status de seus membros é militar e suas missões são de caráter militar, judiciário e administrativo.

O Procurador Alejandro Ordóñez tem razão ao exigir precisões a Santos sobre esse projeto de polícia rural, pois ela seria o fim da polícia nacional e o começo da emergência de outras polícias. O exemplo do México e do modelo de diversos corpos policiais autônomos – o que é o maior obstáculo na luta contra a criminalidade e os cartéis da droga -, seria funesto também na Colômbia.

A ênfase que Santos põe na criação dessa nova polícia com desmobilizados das FARC revela que, como teme o Procurador Ordóñez, o chefe de Estado colombiano está sim negociando a estrutura da Força Pública colombiana em Cuba. Nessas negociações se está, diria eu, desmontando gradualmente a Constituição colombiana, com o agravante de que se mantém a opinião pública na ignorância e exercem-se pressões indevidas contra os porta-vozes do Ministério Público e até da imprensa. Quer dizer, contra quem se atreve a tocar nesse novo tema, para que tal discussão, como as outras discussões sobre os “acordos” de Havana, não tome forma.

Santos previu que essa “polícia rural” aplicará “os métodos e os sistemas” da Gendarmeria francesa (nisso consistiria o apoio que Hollande diz que prestará à Colômbia). Essa nova polícia teria funções muito precisas: se ocupar, entre outras coisas, da manutenção da ordem pública e da investigação penal e administrativa nas áreas rurais do país. Esse novo organismo seria chamado a investigar e reprimir o delito de narco-tráfico e os outros delitos e crimes que se derivam dessa atividade, fora dos que cometerão as outras redes subversivas e terroristas, as quais não desaparecerão da noite para o dia pelo único fato de que o país tenha entrado na fase do chamado “pós-conflito”.

A jogada das FARC é muito astuta e de grande alcance: o vasto mundo rural da Colômbia e, sobretudo, as chamadas “zonas de reserva camponesas” que os terroristas querem criar, estariam sob sua direta dominação, graças à presença de seus homens dentro da eventual “polícia rural”.

Cada dia que passa o “processo de paz” de Havana contribui com seu lote de barbaridades que o poder central colombiano trata de apresentar como uma panacéia, como a grande solução, como a chave inteligente por fim achada para “obter a paz” com o maior movimento narco-terrorista do continente. Tanta beleza não pode ser certa.

Parece que Santos convidou o primeiro-ministro Manuel Valls a realizar uma visita oficial à Colômbia dentro de alguns meses. Durante a coletiva de imprensa em Paris, o presidente Hollande foi também convidado por Santos de maneira informal. Porém, após os trágicos fatos do 7 de janeiro em Paris, e das enormes manifestações contra o terrorismo de 11 de janeiro na França, o governo socialista terá muito cuidado de embarcar em um projeto confuso de segurança na Colômbia que, ao beneficiar as FARC, mancharia a Gendarmeria e a política anti-terrorista firme que Hollande e Valls estão tratando de aplicar. Se o fazem, a oposição na França não se privará de cobrar eleitoralmente esse erro a esses dois líderes e ao Partido Socialista.

Tradução: Graça Salgueiro