Como se chama isso? Cautela? Prudência? Temor? A parcimônia dos editorialistas ante a brutal condenação, de única instância, decidida em 30 de abril passado pela sala penal da CSJ contra a ex-diretora do dissolvido serviço de inteligência DAS, María del Pilar Hurtado (MPH), a 14 anos de prisão e ao pagamento de uma multa de 28 milhões de pesos [1], dá muito o que pensar.
Idêntico sigilo existe ante a condenação, no mesmo dia, a 8 anos de prisão contra o ex-secretário da presidência da República, Bernardo Moreno por, como no caso de Hurtado, supostas interceptações telefônicas de “defensores de direitos humanos, jornalistas e magistrados”.
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Só El Colombiano, matutino de Medellín, se atreveu a assinar um editorial a respeito. Diz nas entrelinhas que é uma condenação justa, sem estar muito seguro. O resto dos editorialistas guarda silêncio. Falta-lhes informação para forjar uma opinião?
A imprensa limitou-se a difundir a notícia sobre essas condenações e a transcrever, sem comentários, as reações do ex-presidente Álvaro Uribe e de outros líderes do Centro Democrático sobre o tema, mas nada mais. A sentença condenatória tampouco foi posta à disposição do público, que eu saiba. Não encontrei, nem no portal web da CSJ, que é muito pouco ameno, nem na imprensa.
Em outras palavras: há obscuridade sobre os fundamentos dessa condenação inapelável. Não se sabe se houve confissão da parte de Hurtado. Não se sabe se as responsabilidades contra Hurtado e Moreno foram provadas. Moreno sempre rechaçou as acusações. Ele afirma que nunca deu uma ordem a Hurtado para que fizesse interceptações ilegais, que só lhe pediu que mantivesse a Casa de Nariño informada. A sentença do magistrado Fernando Castro Caballero distanciou-se das exigências do Ministério Público. Porém, até não ver esse texto completo é difícil saber se Hurtado e Moreno tiveram direito a um devido processo.
Enquanto isso, haveria que se perguntar por que uma sentença desse alcance é tão pouco comentada. Seria necessário se perguntar por quê um diário bogotano está citando textos que não aparecem na condenação, como denunciou hoje o ex-diretor do DAS, Andrés Peñate. Seria preciso se perguntar por que as perguntas que flutuam sobre escutas ilegais do DAS jamais são respondidas.
A presidência da República devia estar a par do que terroristas, narco-traficantes, máfias e outros grupos clandestinos estavam fazendo, precisamente em um período em que o chefe de Estado, Álvaro Uribe Vélez, impulsionava com êxito uma política de confrontação e desmantelamento das organizações narcoterroristas comunistas e de extrema direita? Parece que não. Essa orientação é mal vista por alguns operadores judiciais. O Estado “burguês” colombiano não tem por que se defender nem defender a população. Se defende-se, incorre em delito e transforma-se em “organização criminosa”.
A Colômbia é um alvo particular do terrorismo e do narcotráfico. Desde há décadas a Colômbia padece desses dois terríveis flagelos, que vêm de fora e de dentro do país, pois seu dispositivo jurídico de luta, vigilância e detecção prematura dessas ameaças foi fraca ou inexistente. As FARC sempre combateram a aprovação de leis anti-terroristas e/ou de segurança. Como tiveram êxito nisso (a escassa legislação existente é incoerente), passaram, desde 2003, à outra fase, seguindo os passos que havia dado em 1989 o narcotraficante Pablo Escobar: a destruição física do DAS e dos organismos de inteligência civil e militar do Estado. Conseguiram desmantelar o DAS, explorando suas falhas e corrupções internas, e avançam agora para a destruição da inteligência militar. Pela via dos contatos em Havana, querem reduzir a pó a força pública e intrigam para que o Estado mude sua doutrina militar. Sem tais destruições, sobretudo da contra-inteligência, o processo atual em Havana não teria podido existir.
Os que esfregam as mãos pelas condenações de Hurtado e Moreno querem que esqueçamos que esse foi o marco político, social e jurídico do processo dos chamados “grampos do DAS”. Estamos, pois, ante uma algazarra hipócrita como nunca antes visto.
Tudo isso mostra até onde foi desarticulado o sistema democrático na Colômbia.
O trabalho de inteligência do DAS, entre 2002 e 2010, hoje descrito como “ilegal”, era perfeitamente legítimo. Não era obrigatório saber que apoios, clandestinos ou não, recebia o grupo mais estruturado de agitadores que procurava o abandono da política de segurança democrática? Não era necessário saber se os governos estrangeiros que ofereciam asilo e apoio material a destacamentos das FARC apoiavam esse grupo? Não era necessário averiguar se os chamados “críticos do governo” haviam cruzado a linha da legalidade republicana? Não era indispensável saber quem financiava as viagens e contatos dessa gente no estrangeiro? Não era urgente saber se frações mafiosas estrangeiras haviam penetrado a justiça?
Nenhuma democracia é indiferente ante semelhantes atores, ante tais maquinações. Nenhum Estado de Direito se abstém de investigar os grupos e os indivíduos que se movem em águas turvas. A vida, a segurança da cidadania e a estabilidade política e econômica do país estão sempre em jogo. Na Colômbia não? Vivemos em um país angelical? Por que alguns pretendem fazer a opinião pública acreditar que proteger o território e impedir o terrorismo equivale a montar uma “polícia política”?
Se neste trabalho de inteligência se cometeram abusos estes devem ser sancionados. Falta saber se a prova plena de que Hurtado e Moreno cometeram erros ou delitos foi aportada ao processo. Ou se o que existe contra eles são meras conjecturas de terceiros, ou depoimentos negociados, como se viu em vários processos recentes onde os julgados são todos uribistas. Por isso é necessário olhar a sentença. Porém, onde ela está?
Há pontos confusos que a imprensa foi incapaz de explicar. El Tiempo descobriu, por exemplo, que “algumas” das escutas “como as que fizeram à ex-senadora Piedad Córdoba, tinham uma sustentação legítima para efetuá-las, mas nunca versou uma ordem judicial para isso”. É verdade que nunca houve uma ordem judicial para isso? Ela era necessária? Se a motivação era “legítima”, por que se condena tão brutalmente os que a realizaram? Enquanto não possamos ler a sentença haverá muitas dúvidas a respeito.
O escândalo Tasmânia não era uma idiotice. Alguém quis montar um cenário no qual o presidente Uribe aparecia como o que havia contratado, em 2003, o paramilitar ‘Tasmânia’ para assassinar o paramilitar ‘René’. Nada menos. O magistrado Iván Velasquez estava metido nisso. Porém a justiça não quis investigar a fundo esse assunto, embora o presidente Uribe pedisse. Como tampouco quis investigar por que haviam falsificado a assinatura do advogado do presidente Uribe, em um papel no qual ele, Jaime Lombana, aparecia pedindo investigações ao DAS. Esse documento falso foi levado à revista Semana e a uma rádio para que armassem um tremendo escândalo. Hoje tudo isso parece esquecido. É preciso sair dessa amnésia.
A CSJ estima que existiu sim “motivo legítimo para cobrar informação”, mas que o delito do DAS, diz, foi ter “entregado a informação aos meios de comunicação para desacreditar a Corte”. Onde está a prova de que MPH tenha “ entregado à imprensa” essa informação? O “descrédito da Corte” não tem, como se vê, outras origens? Não houve jornalistas que, além disso, foram injustamente sentenciados por revelar os atos de corrupção muito reais de certos magistrados?
Ao iniciar o processo das escutas, os demandantes estavam fora do governo e lutavam para enlodar o combate contra o narcoterrorismo. Anos depois, no momento da sentença, essas pessoas estão no poder ou influem de maneira direta sobre o governo de Santos, e até incursionam abusivamente nos manejos da justiça e dos ministérios. E, ainda assim, se fazem chamar “vítimas” do Estado.
Quantos mortos o assunto dos “grampos do DAS” deixou? Nenhum. Quantos feridos? Quantos mutilados? Nenhum. Quantos foram detidos e encarcerados em La Picota ou no bunker do DAS ou do Ministério Público? Nenhum. Quantos tiveram que fugir do país para salvar a pele? Nenhum. A quantos se lhes negou o devido processo? A ninguém. Quantos foram submetidos ao escárnio público? Nenhum. Quantos livros difamatórios foram escritos contra eles? Nenhum. Estranhas “vítimas” auto-proclamadas estas, que não recebem senão que, pelo contrário, propinam terríveis golpes aos outros e ao país em geral. Vítimas que descarregam golpes contra outros e escondem a mão.
Os contratempos dessas “vítimas” foram dois: Piedad Córdoba perdeu sua qualidade de senadora quando o Ministério Público comprovou seus laços com as FARC. Gustavo Petro perdeu a prefeitura de Bogotá alguns dias pelo escândalo do lixo. Ambos puderam se defender nos tribunais. Um conseguiu, com ajuda do presidente Santos, continuar aferrado ao cargo. A outra pôde interpor todos os recursos de direito. Eles confirmaram a sanção do Procurador. Isso é o que eles chamam ser “vítimas”.
Sobre outro demandante, Daniel Coronell, o diário El Colombiano revelou, em 7 de março de 2010: “Em 1992, NTC, cujo sócio majoritário é Daniel Coronell, se associou ao empresário César Villegas, condenado no processo 8.000. Além disso, na licitação de 1991, usou equipamentos de imagem e som propriedade do [narcotraficante] Justo Pastor Perafán”. Pedir informação sobre a vida privada de um jornalista normal pode ser um delito. Outra coisa é investigar personagens com semelhante pedigree.
María del Pilar Hurtado teve que fugir do país em 2010 quando viu que o Ministério Público ia detê-la e submetê-la a um julgamento sem garantias, como haviam feito com o Coronel Alfonso Plazas Vega, herói do resgate do Palácio da Justiça que, confiando na justiça colombiana se apresentou ante um promotor e foi detido aí mesmo, em 16 de julho de 2007, sem que cursasse no processo uma só prova contra ele. Depois, em 9 de junho de 2010, Plazas foi condenado a 30 anos de prisão sem que jamais a instrução aportasse prova alguma contra ele, em um processo com irregularidades monstruosas. Hoje, quase oito anos depois, o Coronel Plazas continua detido e esperando que a justiça o absolva ante a derrubada de todas as acusações que cursavam contra ele.
Que garantias Hurtado podia esperar da justiça quando Jaime Arrubla Paucar, presidente da Corte Suprema de Justiça nesse momento, lançou ofensas durante dois anos contra a ex-funcionária e terminou insultando o princípio da presunção de inocência e a pré julgou ao declarar: “Não ocorre sequer a um mentecapto que pode filtrar a Corte e sair impune”. Atitudes similares adotaram o promotor Guillermo Mendoza Diago e o ministro do Interior Germán Vargas Lleras.
Hurtado não fugiu por capricho. A ex-diretora havia prestado um longo testemunho ante o Ministério Público em 13 e 14 de julho de 2010. Quatro meses depois, El Espectador publicou o texto completo desse interrogatório e o amadureceu com comentários errados e difamatórios. O Ministério Público havia filtrado aos meios de comunicação parte central de um sumário reservado e nunca sancionou os responsáveis desse ilícito. Essa foi a gota que transbordou o copo d’água. Antes disso, o Ministério Público havia filtrado para a imprensa uma quantidade enorme de outras peças do processo do chamado “escândalos dos grampos”.
María del Pilar Hurtado explicou no Panamá que temia por sua vida e obteve em 24 horas o asilo territorial, em 18 de novembro de 2010. Porém mais tarde, após a mudança de governo do Panamá, as pressões do Ministério Público colombiano e do governo de Santos se intensificaram e as intrigas de uma ONG infame que se diz “defensora dos direitos humanos” mas que luta, apelando à INTERPOL, contra esses direitos humanos, conseguiram, para vergonha do Panamá, deixá-la sem proteção. A Colômbia, que até então havia respeitado o direito de asilo, se transformou com essa medida em uma republiqueta capaz de perseguir no estrangeiro a seus próprios nacionais.
A Chancelaria jogou fundo a carta da perseguição seletiva. Em 26 de novembro de 2010, Caracol Radio informou: “Chancelaria pede a outros países não outorgar asilo a ex-funcionários investigados do governo de Uribe”. Isso provou que não só certos juízes estavam na caça aos uribistas, senão que o governo gerenciava a festa.
Essa inversão assombrosa dos papéis da vítima e do verdugo é a outra grande curiosidade desse processo. Por isso, entre o que queria o Ministério Público e o que a CSJ decidiu há uma distância? Esses paradoxos sem resposta mostram que neste assunto há muito de política e pouco de direito, muito de revanche de um grupo de extremistas contra alguns funcionários do Estado que cumpriam, como podiam, seu dever de dar proteção à Colômbia. E que o faziam com um instrumental jurídico defeituoso e cheio de lacunas.
Gustavo Petro, ex-senador e líder naquele momento da fração extremista opositora, se declarou “vítima” de Hurtado e tentou, aproveitando a investigação judicial, vincular a ex-diretora do DAS ao assassinato de um humorista, Jaime Garzón. Petro tratou em vão de ligar esse assassinato às escutas telefônicas. A CSJ não o acompanhou nisso. Por que esse uso abusivo da via de direito da parte de Petro não foi sancionado?
Obviamente o objetivo da cruzada contra Hurtado e Moreno não é sancionar escutas ilegais. O objetivo é político e de alto voo: envolver o ex-presidente Álvaro Uribe em um processo. Desde há quatro anos chovem as pressões sobre Hurtado, Moreno e outros ex-funcionários para que acusem o ex-chefe de Estado. Não conseguiram. Querem a morte política do senador Uribe e o colapso do partido Centro Democrático, no momento em que a falsa negociação de paz com as FARC entra em crise e a imagem de Santos cai em picada, graças ao jogo diabólico das FARC de “negociar” o país em Cuba e continuar suas atrocidades contra o Exército e a população civil colombiana.
As curiosas “vítimas dos grampos” aspiram a tomar o poder dentro de dois ou três anos, para culminar o processo atual de demolição da democracia. Sabem que tal objetivo será inalcançável se o senador Uribe, seu partido e as maiorias colombianas, continuem de pé em defesa de certos valores. Esse é o maior desafio que o país enfrenta.
Nota da tradutora:
[1] Equivalente a mais ou menos R$ 28.000,00
Tradução: Graça Salgueiro
Editado por Epoch Times