China só se tornará superpotência industrial quando seus produtos forem confiáveis

17/06/2015 09:55 Atualizado: 17/06/2015 09:55

Paralisada pela estagnação do crescimento econômico, o aumento dos salários e a competição com outros mercados emergentes, Pequim anunciou no mês passado um plano para modernizar seu setor industrial, responsável pelo avanço econômico do país nas últimas três décadas.

O plano de dez anos “made in China 2025” foi apresentado pelo Conselho de Estado no final de maio, e está projetado para melhorar a competitividade da indústria através da implementação de automação, inovação e sistemas de informação.

Enquanto a China espera se tornar uma potência industrial moderna capaz de competir com Alemanha e Japão, o país e o setor enfrentam grandes obstáculos que podem exigir mudanças fundamentais no contexto social, econômico e político da China.

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Grandes planos

A estratégia de dez anos de Pequim busca retirar do setor industrial os produtos de maior complexidade e menor qualidade, e enfocar na engenharia de valor agregado, tais como equipamento aeroespacial, robótica e biotecnologia.

Concebida pelo Ministério da Indústria e Tecnologia de Telecomunicações (MITT), o plano visa aumentar a qualidade dos produtos chineses, principalmente através da inovação, eficiência, automação e modo de produção não agressivo ao meio ambiente.

Uma importante fonte de inspiração para o plano da China foi o conceito de “Indústria 4.0” da Alemanha, apresentado ano passado para aumentar a competitividade alemã através de instalações de produção “inteligentes” ligadas a cadeias de abastecimento. O nome simboliza a quarta revolução industrial, seguida à do vapor, da eletricidade e da informação.

“A ‘Indústria 4.0’ da Alemanha está moldando substancialmente o debate interno na China sobre modernização industrial e competitividade, e ambos os países estão cooperando estreitamente neste campo”, disse o pesquisador do Instituto Mercator de Estudos sobre a China com sede na Alemanha, Jost Wübbeke, em entrevista à Deutsche Welle, emissora nacional da Alemanha.

A estratégia coloca a China na direção da concorrência, potencialmente com a Alemanha, o Japão e os Estados Unidos, líderes mundiais atuais da indústria de alta tecnologia.

Esse direcionamento significa não só melhorias necessárias na indústria manufatureira, como também na de alta tecnologia.

Para este fim, a bolsa de Xangai – Shanghai Stock Exchange (SSE) – está planejando nova plataforma de negócios destinada especificamente a novas pequenas empresas, em um esforço por parte do regime chinês para promover novas tecnologias. O intercâmbio tem regime de preços mais relaxado em comparação com o SSE, incluindo abrir mão de certas exigências para participação de pequenas empresas.

Grandes desafios

A estratégia de “Made in China 2025” esboçou objetivos mensuráveis específicos, incluindo um gráfico com as projeções para 2015, 2020 e 2025, mas o caminho para alcançar tais objetivos não foi contemplado, e não está claro quais empresas ou agências do governo executarão o plano.

“Embora a China seja muito forte no que diz respeito a certas cifras como o quociente entre Receita e Despesa e a concessão de patentes, até agora não foi capaz de transformar seus recursos em melhoria qualitativa na sua capacidade de inovar”, disse Wübbeke.

Por exemplo, a China desenvolveu a robótica avançada dentro de suas universidades, mas estas tecnologias não foram desenvolvidas para ser comercialmente viáveis. Hoje, as linhas de montagem de empresas do país usam robôs importados da Europa e do Japão.

Esse é um dos maiores desafios enfrentados pelo plano de Pequim 2025, a falta de um ambiente favorável à inovação. Sua ambição de se tornar uma potência industrial global está tolhida pela falta de empreendedorismo e de um conjunto de empresas e de justiça estáveis.

Até mesmo as publicações estatais na China estão céticas sobre o sucesso do plano. De acordo com o Economic Observer de Pequim, o desenvolvimento de uma oferta suficientemente grande de mão de obra qualificada para a indústria de alta tecnologia é um dos principais desafios enfrentados pelo país.

De acordo com o Economic Observer, Luo Tianhao, pesquisador da Supervisão de Ativos Chineses e Centro de Avaliação de Tecnologia da Comissão de Administração de Empresas, disse que a maioria dos estudantes chineses de hoje estão optando por auxiliar as universidades e geralmente desprezam a possibilidade de tornarem-se trabalhadores qualificados. A China, hoje, também carece de um sistema de formação profissional sistemática.

Questões de segurança

Talvez o maior obstáculo às ambições da China seja a confiabilidade e a segurança.

Ao contrário de brinquedos, roupas e até mesmo carros, máquinas avançadas tais como aviões, equipamentos aeroespaciais, computadores, equipamentos médicos avançados e os eletrônicos das residências estão ligados à Internet e requerem manutenção constante.

Qualquer comprador desses equipamentos de alto custo para a China deve se assegurar de que possuem não só qualidade de fabricação, como também que não representam um risco de segurança.

E é aí que o trem “Made in China 2025” pode descarrilar.

No mês passado, pesquisadores descobriram que computadores fabricados pela Lenovo Group da China contêm malware pré-instalado com capacidade de espionar os usuários. O malware, que essencialmente desativou o sistema de segurança dos computadores, era o último item de uma lista crescente de vulnerabilidades de segurança encontradas nos computadores Lenovo.

Os recentes ataques a computadores do governo dos Estados Unidos foram atribuídos a hackers patrocinados pelo regime chinês. Os dados pessoais de mais de quatro milhões de funcionários do governo americano foram roubados do Escritório de Gestão de Pessoal, de acordo com autoridades norte-americanas.

Então, você se sentiria seguro em comprar equipamentos aeroespaciais ou supercomputadores de um fornecedor chinês?