Em grande parte do recente conflito entre o regime chinês e Hong Kong sobre a eleição do chefe-executivo da cidade-estado, um ponto chave tem marcado a rígida linha ideológica imposta por Pequim: que qualquer candidato ao cargo deve “amar Hong Kong e ser patriota”.
Agora, um alto funcionário comunista chinês parece ter qualificado isso. Zhang Dejiang, o presidente do Comitê Permanente do Congresso Popular Nacional, que tem um papel importante na definição da política de Pequim em relação a Hong Kong, disse numa reunião política recente que “nosso futuro chefe-executivo deve ser uma pessoa que ama o país e Hong Kong, mas ele não tem de amar ou defender o Partido Comunista”, segundo Michael Tien, vice-presidente do Novo Partido Popular em Hong Kong, um pequeno grupo político pró-Pequim.
O termo “patriotismo” na China é normalmente entendido como o nacionalismo padrão, mas também como ‘amor’ pelo Partido Comunista Chinês (PCC). A ressalva de Zhang parece destinada a aliviar a pressão em Hong Kong, que grupos cívicos na cidade identificam como o aperto sufocante de Pequim.
Que mudança isso trará na seleção de candidatos ainda não está claro, porque as autoridades chinesas continuam a reservar-se o direito de filtrar aqueles que não os satisfazem. Claro, há ainda outras estipulações: os candidatos “não podem ser contra o Partido Comunista ou contra o regime de partido único, [porque] isso é a Constituição”, disse Tien.
No entanto, a afirmação em si é rara por separar explicitamente o conceito de amar o país e amar o Partido Comunista Chinês – cuja identificação e sobreposição dos conceitos é uma marca registrada da propaganda ideológica que gerações de chineses têm sido doutrinadas a aceitar inquestionavelmente.
No início de setembro, Huanqiu, a versão chinesa da mídia estatal Global Times, publicou um artigo de opinião intitulado “Amar o país e amar o Partido é a mesma coisa na China”. O artigo dizia: “Amar ou não o Partido é um critério importante para identificar um chinês verdadeiramente patriota.”
A qualificação de Zhang também difere de uma declaração explícita feita por Li Fei, o vice-secretário do Congresso Popular Nacional, numa conferência de imprensa em 31 de agosto: “O chefe-executivo deve amar o país e Hong Kong, e obviamente também ‘amar o Partido’.”
Se os pontos de vista aparentemente conflitantes demonstram uma divergência ideológica no PCC sobre como lidar com a situação de Hong Kong ou se é um mero recurso ou estratégia retórica, não está claro.
Embora as declarações de Zhang tenham sido ignoradas em reportagens oficiais da China continental, a caracterização descontraída de Michael Tien a respeito – “uma definição muito mais relaxada de patriotismo” – foi estampada nas manchetes de jornais de Hong Kong.
A intenção pode ter sido para acalmar a raiva generalizada em Hong Kong sobre uma série de manobras políticas recentes de Pequim que efetivamente aumentaram o controle da cidade pelo Partido Comunista, sendo a mais recente uma decisão do Congresso Popular Nacional que determinou que candidatos a eleição em Hong Kong devem ser ideologicamente controlados por Pequim. Milhares de estudantes de 24 universidades e escolas em Hong Kong começaram uma greve de uma semana, em 22 de setembro, boicotando as aulas. Após a greve estudantil, a luta do ‘Ocupar Central’, um movimento democrático pelo sufrágio universal, deve ocorrer em algum momento de outubro.
Em outubro, o governo de Hong Kong também começará uma segunda rodada de consulta pública sobre as propostas de Pequim, que precisará de pelo menos uma maioria de dois terços no Conselho Legislativo para passar em lei, um processo que está previsto para acontecer no início do próximo ano.