China desperdiça 80 bilhões de dólares construindo canais de água ineficazes

28/07/2015 17:46 Atualizado: 28/07/2015 17:46

Parece que o grandioso projeto do regime chinês para encaminhar água do sul para o norte, que deveria transportar anualmente bilhões de metros cúbicos de água fresca do Rio Yangtzé para a região árida do país, foi um fracasso colossal.

Primeiro proposto por Mao Tse Tung no início dos anos 50, a ideia foi mais tarde adaptada por engenheiros e burocratas como forma de resolver a crônica falta de água no norte da China. Analisando da perspectiva econômica ou da engenharia, o mega projeto constituído por três rotas distintas de canais que serpenteiam todo o país, é um fiasco. A iniciativa já devorou mais de U$ 79 bilhões em despesas de construção e é um dos projetos de infraestrutura mais caros do mundo.

Em alguns lugares, a água precisa ser bombeada para os locais mais altos, o que consome tremenda quantidade de energia elétrica. Isto torna a água tão cara que ninguém quer comprá-la. Para piorar a situação, dos 44.8 bilhões de metros cúbicos de água fresca que os canais deveriam transportar para o norte anualmente, na verdade, apenas uma fração pode chegar lá, devido à  lentidão do fluxo de água em algumas seções dos canais.

Estas questões foram colocadas em destaque na análise publicada na internet chinesa por Ma Kean, um famoso investigador de questões ambientais na China. No final de 2013, ele revisou os resultados de um ensaio do canal central deste projeto, que liga a parte superior do Rio Han até Pequim e Tianjin, e convincentemente demonstrou que era um fracasso. Contudo, suas críticas não foram bem vindas. O fracasso foi abafado, e especialistas ligados ao Partido Comunista Chinês vieram a público para criticar Ma por suas conclusões.

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Fluxo de água lento

O artigo de Ma destacava três problemas de engenharia: diferentes velocidades de fluxo, depósitos de sedimentos nos canais e congelamento de água.

Para começar, o fluxo do canal principal da rota central é muito lento, ele disse. Portanto, o volume de água transferido não atingirá a meta anual esperada.

Ma também argumentou que grandes quantidades de depósito de sedimentos irão aumentar cada vez mais, até obstruir o fluxo de água. Este argumento é refutado pelos cientistas afiliados ao projeto.

Finalmente, Ma levantou a questão da água do canal poder congelar no inverno, o que bloqueia o fluxo. Há muito tempo existem planos para oferecer água durante os períodos de congelamento, controlando o nível da água e vazão quando as temperaturas se elevam, na tentativa de garantir que o topo do gelo derreta para evitar barragens de congelamento. Este é um processo altamente sofisticado, que soa como se alguém montasse a cavalo de cabeça para baixo. Esperamos que estes professores, acadêmicos e peritos analisem cuidadosamente a operação.

Cada uma das objeções foi refutada pelos cientistas afiliados ao governo chinês, ainda que não seja claro que o projeto esteja realmente livre destes problemas, sublinhou Ma.

Senso econômico

O mais importante, defendeu Ma, é que o projeto faça sentido economicamente. Sem parâmetros de referência, “ao não justificar economicamente o projeto de redirecionamento de água, os oficiais chineses podem declarar sucesso se somente um balde de água chegar a Pequim.”

Dados oficiais obtidos em 25 dias de operação no final de 2013, demonstram que um total de 34 milhões de metros cúbicos de água foram entregues, o equivalente a um fluxo de 15,75 metros cúbicos por segundo. Isto significa que um suprimento contínuo de água durante o ano seria menos do que 500 milhões de toneladas de água ou menos que 5% do objetivo de 10 bilhões de toneladas por ano. “Isto é um fracasso completo”, escreveu Ma.

Peritos do governo e acadêmicos evitaram encarar o problema. Se a quantidade de água recebida é tão baixa, isso significa que existem problemas na velocidade do fluxo em todas as seções dos canais?

Existe também a questão do custo: Uma vez que a água chegue ao norte, ela será tão cara que ninguém vai querer comprá-la. “Depois do teste de transferência da água ter sido concluído em dezembro de 2013, os canais foram fechados. A água não está correndo, está parada, pegando sol”, escreveu Ma.

“A rota requer que poderosas bombas elevem a água para enviá-la ao norte. Bombear água verticalmente consume uma enorme quantidade de energia. Quem irá pagar a eletricidade? Ninguém está disposto a pagar”, disse Ma. “Além disso, a água transferida está suja com poluição pesada. Ninguém a quer comprar por um preço alto”, acrescentou.

Isto é um problema sério, mas nenhum dos acadêmicos quer lidar com ele.

Outros custos

Enviar água do Rio Yangtze para consumidores no norte requer projetos adicionais de suporte e redes de canalização de água nas cidades, declarou o vice-director Luo Hui do gabinete de gestão para o projeto de construção na província de Shandong, à China Economic Weekly. Todos estes custos são adicionais, fazendo com que o custo para os consumidores seja extremamente alto, disse.

Uma estimativa preliminar do custo médio da seção Sul de Shandong relativa ao projeto de transferência de água citado pela comissão de Desenvolvimento Nacional e Reforma (NDRC), foi de 1,54 yuan por metro cúbico. O custo da água local na Província de Shandong é muito inferior: a água de aquífero é vendida a 0.65 yuan por metro cúbico, a água de superfície e a água de reservatório são vendidas por 0.3 yuan por metro cúbico ,e a água do Rio Amarelo é ainda mais barata.

“Se usarmos uma estimativa de 1.54 yuan, o preço médio para os consumidores em Shandong seria de 6 yuan, muito mais caro que as águas locais”, disse Luo.

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As taxas pagas pelos contribuintes

Os oficiais locais sugeriram várias ideias para resolver o problema do alto custo da água. A mais popular propõe que o preço base seja partilhado entre o governo central, provincial e local; os utilizadores finais só suportariam o custo da contagem da água.

Contudo, não é verdade que o dinheiro em todos os níveis do governo também vem dos bolsos dos contribuintes? É o dinheiro do povo que foi silenciosamente usado para pagar este projeto gigante. Não houve discussão nem foi pedida a opinião do povo antes de começar. Por que as pessoas são forçadas a pagar por isto?

O projeto de encaminhamento de água é agora popularmente conhecido como “parado ao sol”, na medida em que um imenso volume de água é bombeado para os canais e simplesmente permanece ali até ser evaporado. Mesmo que o projeto realmente acabe por conta do fracasso, eu não penso que haverá reconhecimento oficial por parte dos oficiais. Eles simplesmente vão passar as perdas para o povo.

Esta é uma tradução resumida do artigo de Zheng Yi publicado no site China In Perspective.

Zheng Yi é um renomado pesquisador chinês, autor, escritor, historiador, e vive em exílio nos Estados Unidos. Ele é autor do livro Scarlet Memorial: Tales Of Cannibalism In Modern China”, sobre canibalismo na província de Guangxi durante a Revolução Cultural, e “China’s Ecological Winter”, sobre a destruição do meio ambiente em todo o país.