Uma série de observações recentes do ministro da Educação chinês Yuan Guiren deixou preocupados muitos indivíduos na China que apoiam a liberdade de pensamento: de acordo com Yuan, livros e pensamentos “ocidentais” devem ser banidos das escolas chinesas.
“Maior gestão deve ser aplicada no uso de materiais de ensino de origem ocidental”, disse Yuan, segundo a Xinhua, uma mídia estatal porta-voz do regime chinês.
“Materiais que divulgam os valores ocidentais estão proibidos em nossas salas de aula.” Yuan se reunia em Pequim com representantes de universidades de toda a China.
Entre as farpas em seu discurso havia essa: “Ataque verbal ou difamação dirigidos a dirigentes do Partido Comunista ou discussões que criticam o socialismo nunca devem ser permitidos nas salas de aula.”
Se essa política será realmente implementada não está claro. Isso pode apresentar um desafio formidável, considerando que os textos ocidentais são amplamente utilizados em universidades chinesas.
Por exemplo, a Universidade de Pequim, uma das mais prestigiadas instituições de ensino na China, lista em seu website vários livros ocidentais que recomenda aos alunos como referência para o exame de admissão do programa de relações internacionais.
Mas inclusive Yuan Guiren endossou textos “ocidentais” incômodos até recentemente, quando em 2011 ele disse: “Para dar impulso à reforma, devemos nos abrir, permitindo que a educação chinesa sinta a pressão do sistema de ensino estrangeiro.”
Ele falava numa reunião de educação durante a Conferência Consultiva Política Popular em 3 de março. Em resposta a quaisquer preocupações de que pensamentos ocidentais perigosos invadiriam a China, Yuan disse: “Não há risco, pois isso está ocorrendo em nossa terra, onde existe o Partido Comunista.”
Enfim, o que é “ocidental”?
Uma ironia associada com as observações de Yuan Guiren não passou despercebida e foi motivo de escárnio entre internautas chineses e comentaristas políticos, considerando que o próprio Partido Comunista Chinês se baseia nos princípios do marxismo-leninismo, filosofias distintamente ocidentais.
Shen Kui, professor de Direito na Universidade de Pequim, abordou esse ponto num post que Yuan deve esclarecer a linha divisória entre “valores ocidentais” e “valores chineses”, uma vez que a própria Constituição da República Popular da China estipula que as massas devem ser educadas com base no marxismo, internacionalismo e comunismo, todas essas ideologias que se originaram no Ocidente.
Um advogado de pseudônimo “Aotu” escreveu no Sina Weibo, uma mídia social chinesa similar ao Twitter: “As várias coisas que o ministro Yuan disse, se aplicadas, resultariam na expulsão do ‘marxismo’ da China e seu retorno à Europa.”
Outros na internet advertiram Yuan que deixasse de perder tempo com questões ideológicas irrelevantes quando há muitas outras questões mais urgentes que requerem atenção, relacionadas ao bem-estar público e à educação na China, como casos de abuso sexual nas escolas e a grande pobreza que não permite que muitos frequentem uma escola.
“Ele não disse nada sobre professores que violentam estudantes, silenciou sobre o estupro de crianças e ignorou os jovens que não podem ir à escola”, escreveu um funcionário da Escola Bangde de Shanghai no Weibo. “Agora ele se pronuncia e quer proibir que os valores ocidentais entrem nas salas de aula.”