Gangues chinesas fornecem ingredientes aos cartéis de drogas mexicanos para criar metanfetamina. Esta, por sua vez, alimenta a violenta guerra das drogas no México, bem como a dependência nos Estados Unidos e México por uma das drogas mais nocivas do mundo.
O fornecimento contínuo de precursores químicos da China para produção de droga tem sido a questão principal abordada pelas autoridades mexicanas com a China, segundo Jorge Guajardo, o embaixador mexicano para a China entre 2007-2013.
“Antes de eu vir para a China, a primeira reunião que tive com o procurador-geral [mexicano] foi sobre o problema dos precursores fluindo da China para o México. Era a questão principal que eu tinha de resolver. No entanto, nunca chegamos a lugar algum”, disse Guajardo ao Diário da Manhã do Sul da China, uma mídia de Hong Kong.
“Nunca houve qualquer tipo de cooperação do lado chinês e não há compartilhamento de inteligência”, disse ele. “Chegou ao ponto em que todos os funcionários do governo [mexicano] que visitam a China são instruídos a levantar a questão.”
A metanfetamina, também chamada de “meth”, “vidro” e “gelo”, é um estimulante ilegal conhecido por causar danos corporais e paranoia grave. Meth é muitas vezes feita com os precursores químicos efedrina ou pseudoefedrina, que estavam disponíveis sem prescrição, antes dos Estados Unidos começarem a regulamentar sua venda em 2004. A revelação lança uma nova luz sobre um tema opaco.
Particularmente revelador é que as autoridades mexicanas consideram a questão como tema principal com a China, enquanto as autoridades chinesas têm cooperado pouquíssimo, segundo o Dr. Robert Bunker, professor-visitante distinto e presidente do Instituto de Estudos Estratégicos da Escola de Guerra do Exército dos EUA.
No final do dia, é tudo sobre dinheiro. E na China, negócios e corrupção do governo andam lado a lado. “A produção de metanfetamina mexicana e distribuição é altamente lucrativa – estimada em US$ 5 bilhões em negócios nas ruas – com anual aumento de volume, redução de preços e crescente pureza nos EUA”, disse Bunker via e-mail. “O próprio México na última década também se tornou outro mercado rentável para as vendas de metanfetamina com taxas de dependência mais elevadas do que nos EUA.”
Bunker disse que os precursores chineses são contrabandeados para cartéis de drogas mexicanos, incluindo o cartel Sinaloa e os Cavaleiros Templários. Para o México, este é um crime que alimenta a guerra das drogas, que por sua vez desestabiliza o país. Para a China, isso é um mercado lucrativo.
“Simplificando, os chineses elevaram o ‘capitalismo autoritário’ a uma forma de arte”, disse Bunker. “Seu mandato estratégico é obter lucro – fluxo positivo de dinheiro – para seu sistema econômico. Em muitos aspectos, isso é muito mercantilista, de soma zero, pois é predatório em sua perspectiva.”
Com isto em mente, Bunker disse: “Faria sentido os funcionários governamentais chineses argumentarem que os precursores químicos são produtos legais utilizados pelos cidadãos mexicanos para fins ilícitos.” Ele disse que isso explica um comentário de Guajardo, que disse que as autoridades chinesas disseram ao México que o fluxo de precursores da metanfetamina é um problema para a alfândega mexicana e não para a China se preocupar.
Um mercado lucrativo
Em 2001, antes da regulamentação da efedrina e pseudoefedrina, a pseudoefedrina em pó costumava ser enviada em massa para os Estados Unidos e Canadá. Alemanha e Índia eram os maiores fornecedores, com 392 e 295 toneladas, respectivamente, informou o The Oregonian. Eles eram seguidos pela China e República Checa, que exportavam cerca de 170 toneladas cada uma.
Os cartéis de droga tinham de pegar os precursores de fornecedores nos Estados Unidos e Canadá. Em 2001, cerca de 200 toneladas foram em direção a laboratórios de metanfetamina. Após a decretação dos regulamentos, o número de laboratórios de metanfetamina nos Estados Unidos caiu para quase um quarto. Então, em 2007, o número começou a aumentar rapidamente.
Por trás do aumento havia uma cadeia de suprimentos restaurada de precursores de metanfetamina que vinham da China. A empresa de inteligência geopolítica Stratfor mapeou as linhas de contrabando em 2008. A efedrina era enviada da China para o Sul do México por meio da cooperação entre as tríades chinesas e os cartéis de drogas mexicanos.
Embora o tráfico seja reponsabilidade do crime organizado chinês, a corrupção do governo da China é igualmente culpada. Ainda recentemente em 2008, os governos locais na província de Guangdong, Sul da China, incentivavam os agricultores a cultivar ‘ma huang’ e eram prometidos mais de 64% de lucro. Ma huang, também chamado de ‘ephedra sinica’, é usado na medicina tradicional chinesa e é uma fonte natural de efedrina.
Houve batidas policiais visando metanfetamina na China, incluindo em áreas onde ma huang é uma cultura comum, mas as autoridades normalmente vão atrás apenas do produto acabado e deixam os ingredientes de exportação intocados.
“Embora as vendas de precursores de metanfetamina para os cartéis mexicanos possa ser uma atividade rentável e aceitável para os chineses, a produção interna de metanfetamina na China não pode ser sancionada de forma alguma, devido às centenas de laboratórios de metanfetamina que invadiram Guangdong e outras partes do país nos últimos anos”, disse Bunker.
Ele acrescentou que a dinâmica sugere que as autoridades chinesas consideram a venda de ingredientes de metanfetamina para os Estados Unidos e México como “um resultado aceitável de políticas relacionadas ao ‘capitalismo autoritário’, mas que tal uso por cidadãos chineses é totalmente inaceitável, devido aos efeitos altamente viciantes e debilitantes dessa droga”.