Carta aberta a Patricia Mora Castellanos, presidente da Frente Ampla da Costa Rica

04/02/2014 17:11 Atualizado: 04/02/2014 17:11

22 de janeiro de 2014
Dona Patricia Mora Castellanos
Presidente da Frente Ampla

Presente,

Permito-me dirigir-me à senhora no momento de haver lido um artigo que chegou a minhas mãos graças a estas mídias novas chamadas redes sociais. O artigo em questão se intitula “Chávez morreu invicto”.

Antes de lhe dar minha opinião de seu escrito, sabendo que não me pediu, mas entendendo que sua campanha eleitoral se baseia na pluralidade democrática e realça os atributos intelectuais da mulher e sua participação na vida pública de suas nações, queria me apresentar como sou. Uma venezuelana com profundas raízes na Venezuela, centenas de anos de tradição familiar nesse solo que me viu nascer e ao qual amo profundamente. Além disso, e para rematar minhas bênçãos, tive a sorte de viver cinco maravilhosos anos em seu país, Costa Rica. Levo a Venezuela e a Costa Rica muito cravados em minha alma, e talvez isso seja o que me motiva a lhe escrever hoje.

Ao começar a lê-la, me deparei com uma frase dilacerante que diz: “Ante algumas mortes, a pessoa não pode deixar de maldizer a traição, a má jogada com que o corpo pode nos surpreender.” E estou totalmente de acordo com a senhora, a morte é dolorosa para os que ficam vivos, para os que ficam chorando o morto.

Em meu país, por exemplo, entre um sistema judicial corrupto com mais de 80% dos juízes nomeados a dedo, um sistema policial podre que abusa de seu poder e um tráfico de influências atroz, a impunidade alcança um grotesco 97% no dia de hoje.

Quando Hugo Chávez chegou ao poder, se manejavam no país cifras de 4.550 homicídios ao ano, cifra que já era preocupante nesse momento. Em 2013, fechou-se o ano com a assombrosa cifra de 24.763 pessoas mortas, mas não de enfermidades tratáveis, não por maus passos do corpo humano, não em clínicas dispostas para seus cuidados. Essas são mortes violentas, nas mãos de uma bandidagem desenfreada que assalta com armas longas os desafortunados que cruzam o caminho dos delinquentes (cifras não oficiais, óbvio). Os assassinatos aumentaram 444% na Venezuela durante os 15 anos de chavismo. Dizer que no necrotério de Caracas entraram num fim de semana 100 corpos, já não surpreende a ninguém.

Também estou muito de acordo com a senhora quando diz que a partir de agora devemos falar de uma Venezuela e um continente anterior e posterior a Chávez.

Hugo Chávez Frías semeou o ódio de classes numa população que, mesmo com diferenças, se tolerava e se respeitava. Hugo Chávez destruiu o aparato produtivo do país e pôs a Venezuela para importar mais de 70% dos produtos que consome. Ele e seus cúmplices acabaram com nossa empresa petroleira. Puseram a PDVSA, a poderosa PDVSA, para fabricar lavadoras e secadoras, e para importar alimentos que antes produzíamos. Os neófitos que queimaram refinarias causaram acidentes gravíssimos.

Inventaram-se negócios de importação de alimentos e deixaram deteriorar milhares e milhares de quilos de comida nos portos da Venezuela, pois o verdadeiro negócio “socialista” não era levar comida ao povo e sim tirar dólares do rigoroso controle cambiário que nos tem asfixiado desde há anos. Pode revisar a palavra PUDREVAL na internet para que entenda as dimensões de semelhante caso de corrupção. E sabe de uma coisa? Não foi ninguém, ninguém sabe de nada…

A Venezuela mudou, Dona Patricia, é certo, porque agora há que se resguardar em sua casa de dia para que não o matem por um par de sapatos ou um celular. Se se vai ao cinema, entram na sala e roubam todo mundo. Se se vai a um restaurante entram, roubam, comem, limpam-se com um guardanapo e vão embora. Para fazer supermercado, deve-se percorrer a quatro ou cinco locais para poder se abastecer. Limitam a venda dos alimentos pela galopante escassez. E assim vai tudo, como dizemos em meu país, “ladeira abaixo”. A senhora sabia que os presos têm discotecas dentro das penitenciárias, levantadas e financiadas pela flamejante ministra do Poder Popular para o Sistema Penitenciário? Eles mandam dentro e fora das penitenciárias sob a cumplicidade covarde e silente do governo… melhor parar de contar, Dona Patricia. Essa é a Venezuela que Hugo Chávez deixou. A senhora sabe quanto se designa do orçamento nacional à segurança cidadã? Um por cento, repito, 1%.

Agora o continente é outra história, esse ficou transbordante, pletórico, cheio de dólares que compram consciências, que financiam socialismos e comunismos que ninguém entende, anacrônicos e vergonhosos, vale dizer, o Socialismo do Século XXI. Esse invento nefasto que surgiu numa prisão venezuelana, quando nosso presidente Hugo Chávez foi convicto e confesso parar num calabouço, por ter atentado contra nossa Constituição Nacional naquele oprobrioso golpe de Estado. Ninguém do chavismo sabe ainda, depois de 15 anos, explicar seus fundamentos filosóficos e deve ser porque não tem senso comum.

Mujica, os Castro, a dona argentina, Correa, Evo, dona Dilma, os chineses, os bielo-russos e todos os que desfrutaram das benesses do chavismo traduzidos em dólares, petróleo, lingotes de ouro e contratos de lesa-pátria em detrimento nosso, pois esses senhores estão felizes, divinamente bem. Se é definitivo, há que falar de um antes e um depois de Chávez. Antes de Chávez os cubanos tentaram nos invadir por Machurucuto, agora, depois de Chávez, somos colônia cubana. Que triste!

Quem diz que isto não é certo se nosso comandante cuspiu na oligarquia? A oligarquia para Chávez era tudo o que não lhe agradasse. Porém, resultou que os mais oligarcas foram eles. O capitalismo está mais presente do que nunca em meu país, são milionários os militares que fazem vista grossa ante a injustiça. Assim os juízes, os assembleístas e todo aquele que ocupe um posto de importância para a permanência do chavismo no poder. A derrama de dinheiro e de luxos é asquerosa, simplesmente asquerosa. Ele não acabou com o capitalismo, a única coisa que ele fez foi trocar de mãos. A boliburguesia (N.T.: neologisimo para “burguesia bolivariana”) venezuelana não pôde nem pode ocultar suas grandes fortunas. O que lhe conto, Dona Patricia, é que as filhas de Chávez decidiram de forma autoritária ficar vivendo para sempre na casa presidencial. É delas, pois, como a propriedade privada já não vale nada na Venezuela. É algo assim como se fosse uma herança, como se a Venezuela fosse uma monarquia e elas fossem, neste caso, as meias-irmãs da Cinderela, herdeiras forçadas do trono. Aviões privados, viagens, luxos, excessos socialistas, claro. Porque o socialismo sempre funciona, quando com dinheiro alheio.

A DEMOCRACIA, Dona Patricia, é o livre concurso de ideias. A democracia é o sistema que lhe permite comparar essas ideias, analisá-las e chegar a uma verdade. Num país onde se fecham mais de 69 emissoras de rádio e um canal de televisão, num país onde os jornalistas são ameaçados de morte, onde não os deixam entrar em eventos noticiosos do governo, um país onde sequestram os filhos dos donos de jornais, não há democracia, no máximo uma palhaçada do que restou dela.

Um país onde o Estado utiliza os recursos de todos os cidadãos para fazer campanha política, controla o poder eleitoral, o judicial e os militares, não é democrático.

Chávez nacionalizou empresas, não; Chávez expropriou empresas que deixou morrer no abandono e afetou não só a produtividade dessas empresas e os empregos dos que trabalham lá, afetou a qualidade de vida de todos os venezuelanos.

Maduro volta a desvalorizar minha triste moeda, seis desvalorizações chavistas, uma tampinha de refresco vale mais que um bolívar. Isso Dona, não é revolução. Isso é saque a uma nação.

A senhora continue fazendo política, respeito que tenha ideais e que lute por elas. Veremos… Eu, de coração, espero que não chegue o dia em que a Costa Rica se veja atolada nesse esterco que é a Venezuela.

Hugo Chávez, Nicolás Maduro e todos os seus sequazes passarão à história de nosso país como uns tristes palhaços que prometeram acabar com a pobreza e o que fizeram foi fazer-nos infinitamente mais pobres, não só no bolso, senão mais triste ainda, na alma.

Sorte em sua contenda.

Tradução de Graça Salgueiro