Canadá aborda o tráfico de órgãos nas Nações Unidas

16/03/2014 13:15 Atualizado: 20/04/2014 21:03

O Canadá reconheceu formalmente os relatos de que o regime chinês está envolvido na extração de órgãos sem consentimento pela primeira vez nas Nações Unidas na quarta-feira. As declarações do Canadá nas Nações Unidas são frequentemente notáveis por sua especificidade e contundência, uma tendência confirmada novamente na semana passada.

Os comentários do Canadá foram os únicos a impelir uma resposta de países específicos, enquanto a maioria dos outros países fala em generalidades e aqueles com abusos documentados aproveitam a oportunidade para fazer declarações políticas que desviam o foco de suas próprias questões de direitos humanos.

Anne-Tamara Lorre, a conselheira de direitos humanos do Canadá na ONU, estabeleceu o precedente durante o Diálogo Interativo sobre Liberdade de Religião na ONU, em Genebra. O diálogo foi focado em relatos de dois relatores-especiais relacionados aos direitos humanos na 22ª reunião da atual sessão do Conselho de Direitos Humanos.

“O Canadá continua profundamente preocupado com a situação das comunidades religiosas perseguidas em várias partes do mundo, onde, devido a restrições do governo ou hostilidades sociais extremas, os indivíduos são visados por causa de sua fé. Estes incluem os bahaístas, budistas, cristãos, judeus, sufis e outros muçulmanos, entre outros”, disse Lorre.

Ela também lembrou o terceiro aniversário do assassinato de Shahbaz Bhatti. Bhatti foi Ministro do Paquistão para Assuntos Minoritários e um crítico das leis sobre blasfêmia em seu país, que visavam minorias religiosas.

Lorre então prosseguiu para fazer um reconhecimento sem precedentes de relatórios da extração forçada de órgãos na China. “Continuamos preocupados que praticantes do Falun Gong e outros adeptos religiosos na China enfrentem perseguição; e relatórios de que transplantes de órgãos ocorrem sem o consentimento livre e informado do doador são preocupantes.”

As alegações de que o regime chinês tem extraído órgãos de prisioneiros políticos têm persistido desde 2006, quando dois advogados de direitos humanos canadenses, David Matas e David Kilgour, publicaram um relatório/livro sobre o tema.

Evidências continuaram a se acumular desde então; o repórter investigativo Ethan Gutmann descobriu que a extração forçada de órgãos de minorias religiosas executadas parece ter começado em Xinjiang, uma província no Noroeste da China que abriga os uigures muçulmanos. O livro de Gutmann sobre a extração forçada de órgãos na China – “The Slaughter: Mass Killings, Organ Harvesting, and China’s Secret Solution to Its Dissident Problem” – será lançado em agosto.

A declaração de Lorre levou a uma negação do regime chinês, que rejeitou categoricamente seus comentários. Em dezembro passado, o Parlamento da União Europeia aprovou uma resolução sobre a extração forçada de órgãos na China. A resolução observou que as propagandas dos centros de transplante chineses prometiam encontrar órgãos em duas a quatro semanas.

Os investigadores, incluindo Matas e Kilgour, dizem que tal promessa exigiria um enorme banco de doadores potenciais que seriam mortos sob demanda. Centenas de milhares de adeptos do Falun Gong foram presos em campos de trabalho forçado, prisões e centros de lavagem cerebral na China, dezenas de milhares nunca reapareceram. A irmã da canadense Michelle Zhang é um deles.

Zhang, que agora vive em Toronto, disse que sua irmã Yunhe desapareceu no sistema prisional após ser presa em 2002. Os funcionários da prisão agora negam sequer terem detido Yunhe. A China nunca permitiu uma investigação independente de seu sistema de transplante de órgãos, e muda continuamente sua explicação sobre a origem dos órgãos para transplantes.

O regime passou de negar o uso de órgãos de prisioneiros executados até admitir anos atrás que tem feito isso. O oficial de saúde responsável por transplantes de órgãos, Huang Jiefu, em seguida, prometeu em 2013 eliminar progressivamente a prática de usar órgãos de prisioneiros executados para suprir o sistema de transplante chinês.

Depois de deixar o ministério para chefiar o Comitê de Doação de Órgãos e Transplante da China, a organização oficial máxima de transplante no país, Huang mudou sua postura e disse que o atual sistema de abastecimento de órgãos de prisioneiros deve ser expandido ao invés de aposentado.

Os relatos de extração forçada de órgãos na China levaram alguns países, incluindo Israel, Taiwan e Austrália, a fazerem alterações legislativas ou regulamentares a respeito de cidadãos que viajam à China para transplantes ou sobre a formação de cirurgiões de transplante chineses.

A 25ª sessão do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas começou em 4 de março em Genebra.