Os brasileiros confiam mais nas empresas privadas do que no governo. É o que revela a pesquisa “Trust Barometer 2014”, apresentada pela agência de relações públicas Edelman Significa. De acordo com o estudo, que mostra uma corrosão na confiança do setor público, 70% das pessoas no Brasil têm mais crença no segmento empresarial, 63% na mídia, 62% nas Organizações Não Governamentais (ONG) e 34% no governo, contra a média global de 44%. O levantamento foi realizado em 27 nações.
Para o empresário e CEO da Edelman Significa, Yacoff Sarkovas, o resultado da pesquisa está relacionado à associação entre as empresas e a qualidade de vida dos entrevistados. “A ascensão econômica e todos os benefícios decorrentes dela acabam beneficiando a percepção das empresas”, explica o empresário.
Em entrevista exclusiva para o Instituto Millenium, Sarkovas ainda analisa a relação entre a corrupção e a baixa credibilidade dos governos e afirma que no Brasil os cidadãos comuns desfrutam de mais credibilidade que os intelectuais, ao contrário da realidade do resto do mundo. “Aqui um acadêmico goza de um índice de confiança de 70%, enquanto uma pessoa como eu tem um índice de confiança de 84%”, revela.
Leia a entrevista:
Instituto Millenium: Como o senhor definiria o conceito de confiança nas instituições privadas e públicas?
Yacoff Sarkovas: O conceito de confiança adotado pelo “Trust Barometer 2014” é uma espécie de evolução do conceito de reputação. Definimos reputação como a soma das percepções passadas — sejam positivas ou negativas. O conceito de confiança é uma espécie de projeção. Tecnicamente, fazemos essa avaliação através de perguntas que estabelecem uma gradação de níveis de confiança, que vão de 0 a 10. A cada quesito, as pessoas estabelecem as respostas dentro dessa escala e chegamos a todos os dados e às análises que realizamos em 27 países.
Imil: O setor empresarial é considerado o grupo institucional mais confiável do Brasil, de acordo com o estudo. A que se deve esse resultado?
Sarkovas: O “Trust Barometer” identifica os níveis de confiança de quatro grandes intuições da sociedade: empresas, governos, mídias e ONGs. Historicamente, as ONGs são as entidades que gozam de maior nível de confiança no mundo. Na média global, as ONGs alcançaram 64% de nível médio de confiança, as empresas, 58%, a mídia atingiu 52% e os governos, 44%. Isso torna os dados brasileiros ainda mais importantes. No Brasil, as empresas estão no topo do nível de confiança, com 70% dos votos, seguida pela mídia (63%), ONGs (62%) e governo (34%). Nesse sentido, somos um ponto fora da curva.
A nossa leitura está muito ligada ao fato de que a população associa as empresas à qualidade de vida. A ascensão econômica e todos os benefícios decorrentes dela acabam beneficiando a percepção das empresas. A pesquisa também mede a confiança por segmentos, o que possibilitou constatar que o índice de confiança das empresas de tecnologia é de 90%. O impacto que os smartphones, as TVs, os computadores têm na vida das pessoas torna a sua credibilidade ainda mais expressiva. Em um patamar logo abaixo, estão empresas ligadas aos serviços de entretenimento e de consumo eletrônico, com 84%. Isso reforça ainda mais a ideia de que essa visão positiva das empresas é fruto do acesso a bens, produtos e serviços que permitem a melhoria da qualidade de vida.
Imil: Ao contrário das empresas, o poder público é visto com desconfiança. O que justifica a baixa credibilidade do setor?
Sarkovas: A média global de confiança nos governos é de 44%. No Brasil, o número cai para 34%. A pesquisa se refere a todos os níveis de governos. Acredito que o governo federal seja o maior responsável pela avaliação. No Brasil, os resultados estão fortemente ligados à ideia de corrupção. Há uma percepção generalizada da sociedade de que a corrupção é o principal fator responsável pela avaliação negativa do governo.
Imil: Que outros fatores afetam a imagem das instituições?
Sarkovas: Em relação a governos, além da corrupção, investigamos atributos ligados à qualidade da gestão. O estudo sobre as empresas é muito mais detalhado porque boa parte desses resultados são utilizados pelas organizações para divulgar seus planejamentos estratégicos de colocação da marca. Em um estudo feito há quatro anos, conseguimos definir dezesseis fatores que formam a confiança nas empresas. Nós avaliamos o quanto as pessoas consideram esses fatores importantes e o quanto elas acreditam que as empresas estão atendendo aquela expectativa. Esses itens estão agrupados em cinco grandes tópicos: qualidade de produtos e serviços, engajamento, integridade, propósito e desempenho. Os maiores buracos estão em engajamento e integridade. Os indicadores com que as empresas mais devem se preocupar se referem a questões como ouvir os seus consumidores, respeitar os seus empregados, posicionar o interesse do servidor no mesmo patamar da busca por lucratividade e ser mais ética nas suas práticas corporativas. A partir da percepção desses atributos, as pessoas constroem a maior ou menor confiança nas empresas de uma maneira geral.
Imil: Qual é a relevância das pessoas no fator confiança? Em que medida o comportamento e a postura são importantes para a imagem de empresas e instituições públicas?
Sarkovas: Esse é outro aspecto em que o Brasil é um ponto fora da curva. Um dos estudos clássicos do “Trust Barometer” é sobre os tipos de pessoas que mais geram confiança em uma empresa. Enquanto no mundo o formador de opinião mais poderoso é o acadêmico, seguido por especialistas e técnicos, no Brasil a pessoa de maior confiança é o individuo comum. Em uma sociedade relacional como a nossa, é impressionante como isso se manifesta. Aqui um acadêmico goza de um índice de confiança de 70%, enquanto que uma pessoa como eu [empresário] tem um índice de confiança de 84%. Daí, você entende a importância das redes sociais e do engajamento interno.
Esse conteúdo foi originalmente publicado no portal do Instituto Millenium