No Brasil, obra pública não tem dono

12/11/2013 15:04 Atualizado: 12/11/2013 21:59

Os modelos de planejamento para grandes obras estão completamente dominados no Brasil. Imagine se a construção de um Shopping Center, de um complexo de edifícios ou de qualquer outra obra monumental fosse feita de forma atabalhoada, sem um conjunto de diretrizes e cronogramas, claramente fiscalizáveis e fiscalizados. O Brasil do setor privado seria a mesma balbúrdia e desorganização do Brasil do setor público.

Só não há planejamento e respectivo acompanhamento, quando quem deveria ser responsável por qualquer obra, seja pública ou privada, não quer que o trabalho seja acompanhado. Nesses casos, quanto mais caóticos os prazos e a execução, melhor para os propósitos de quem está financiando e executando a obra.

No caso de obras privadas, os problemas afloram imediatamente, uma vez que os proprietários intervêm com rapidez quando os prazos ou os orçamentos não estão sendo cumpridos e possíveis desacertos são ajustados imediatamente. Mesmo porque atrasos, correções e preço sairão de bolsos identificados.

No caso das obras públicas ninguém fiscaliza e muito menos intervém. Os atrasos que geram correções de preço são bancados com recursos públicos, que para muitos brasileiros aparecem nos cofres do Tesouro, simplesmente por obra e graça do Espírito Santo.

O Tribunal de Contas da União, que deveria fiscalizar os desmandos, tarda muito em se pronunciar, e se o assunto é levado à Justiça, ou a obra simplesmente para e fica à deriva sem que se responsabilize ninguém pelos valores já gastos, ou a Justiça só se pronunciará depois que a obra estiver acabada e não há mais nada a ser feito.

Infelizmente no Brasil, obra pública não tem dono e a grande maioria da população que a financia, nem sabe que o dinheiro está saindo do seu bolso através dos impostos indiretos que estas pessoas não sabem que pagam. Quem sabe o que está ocorrendo de verdade, ou se conformou com a falta de planejamento e com o descaso com os recursos públicos e não quer se incomodar com isso, ou é diretamente beneficiário dos fatos. Como consequência, os problemas só pioram.

No caso das obras para a Copa, já sabíamos que elas seriam necessárias há mais de sete anos, mas ninguém se moveu. Conforme o tempo foi passando e as obras foram se tornando urgentes, a única providência foi isentá-las de licitação. Com os “portões abertos” a urgência pôde justificar qualquer valor pretendido ou gasto. Cidades que não possuem um único time de futebol foram aquinhoadas com estádios megalômanos que estão condenados ao descaso. O mesmo vale para os aeroportos e os sistemas viários. Quando estiverem prontos, serão obsoletos para o fluxo existente.

Para solucionar esse problema, o Brasil precisaria passar por total revisão nas práticas políticas e sofrer um profundo choque na gestão pública. Mas acreditar que isto vai ocorrer com a profundidade e a honestidade necessária é o mesmo que esperar em abril o coelhinho da Páscoa ou em Dezembro o Papai Noel.

Especialista do Instituto Millenium, Nelson Barrizzelli é mestre em Administração e professor doutor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP

Este artigo foi originalmente publicado pelo Instituto Millenium