Já não é a primeira vez que veículos da imprensa apontam que o crescimento chinês atual é insustentável. Um excelente artigo da BBC fala sobre um possível estouro da bolha chinesa, que pode gerar uma terceira depressão econômica mundial em menos de dez anos (a crise americana de 2007 e a do welfare state europeu de 2009 sendo as outras duas). Eu concordo inteiramente com o artigo, que pode ser visto aqui. Gostaria de tecer breves comentários sobre alguns parágrafos específicos:
“Nos últimos anos, a China construiu um novo arranha-céu a cada cinco dias, mais de 30 aeroportos, sistemas de metrô em 25 cidades, as três pontes mais extensas do mundo e mais de 9,6 mil quilômetros de rodovias de alta velocidade, além de empreendimentos imobiliários comerciais e residenciais em larga escala. Há duas formas de enxergar esse movimento: trata-se, é claro, de uma modernização necessária num país que se urbaniza rapidamente. Mas é também um sintoma de uma economia desequilibrada, cujas recentes fontes de crescimento não são sustentáveis.”
Parece-me mais plausível a segunda opção. Temos lido na internet várias notícias sobre cidades-fantasma e pontes ligando nada a lugar nenhum em todo o país, numa clara tentativa de aceleração da economia por meio de gastos públicos, como bem faz o PAC brasileiro que, segundo o Globo recentemente, continua atrasado. A economia chinesa está crescendo seu PIB por meio de gastos públicos com pouca poupança, se endividando na expectativa de que o PIB cresça mais que a dívida contraída. Essa aposta arriscada não tem dado certo no mundo todo nos últimos anos.
“Antes da crise de 2008, o investimento estava em torno de 40% do PIB, três vezes mais do que a maioria dos países desenvolvidos. Após a crise, graças aos estímulos (de 1,5 trilhão de dólares) e às obras de infraestrutura, os investimentos subiram para 50% do PIB, um nível sem precedentes, e ali continuaram. A questão é que, quando uma grande economia investe nesse ritmo para criar empregos e riqueza, possivelmente não obterá retorno de grande parte dos investimentos – que são muito maiores do que qualquer decisão racional dos empresários.”
Interessante ver que a matéria é certeira em apontar o problema do planejamento central da economia por governos: pouca decisão racional e muita decisão política. Empreendedores tomam decisões econômicas racionais porque arcam com os custos de se fazer uma escolha irracional. Já os governos podem se dar ao luxo de fazer escolhas irracionais e políticas (ou politiqueiras), já que o prejuízo acaba sendo arcado pela sua população.
“Quando o crescimento é gerado por um grande período de investimento lastreado em dívida, há dois desdobramentos possíveis: se essa grande expansão é encerrada cedo o bastante e de modo controlado e a economia é retomada de maneira sustentável, ocorre uma retração econômica, mas desta forma evita-se um desastre. No entanto, se a concessão de crédito passa dos limites, uma crise se torna inevitável.”
Esse destaque eu puxei por conta da decisão chinesa de expandir sua economia com investimento lastreado em dívida. Todo investimento precisa ser lastreado em poupança. Não há como investir sem antes ter poupado o que se investe. A China buscou poupança privada interna e externa para investir no seu crescimento interno. Com todas as críticas que podem ser feitas, e o jornal acertou em cheio nelas, bem ou mal a China buscou se endividar com a finalidade de investir. Já o Brasil se endividou (mais de dois trilhões de reais em dívidas) não para investir, mas para consumo coletivo de quem é hoje sustentado pelo Estado (agentes políticos, servidores públicos e população assistida por programas governamentais, basicamente). Ou seja, se endividou para não crescer. É certo que o PIB brasileiro não crescerá acima da sua dívida, já que esse dinheiro não foi aproveitado na finalidade devida.
Estamos começando a pagar a conta da farra.
Bernardo Santoro é advogado e diretor-administrativo do Instituto Liberal; mestrando em Direito (UERJ), pós-graduado em Economia (UERJ) e professor de Economia Política da Faculdade de Direito da UERJ
Esta matéria foi originalmente publicada pelo Instituto Liberal