O Banco Central e o banco BVA se preparam para o que se desenha como uma longa batalha na Justiça que ocorre na esteira de um processo de dissolução do banco. O BVA, que está em processo de falência, acusa a autoridade monetária de ter inflado o passivo da instituição sem explicação plausível. O passivo passou de 1,5 bilhão de reais, em outubro de 2012, durante a intervenção do Banco Central, para 4,9 bilhões de reais, em junho de 2014, durante sua liquidação. O pedido de falência foi decretado pela Justiça de São Paulo em setembro deste ano.
O Banco Central, por sua vez, afirma estar munido de “farta documentação” que revelará atos fraudulentos cometidos por ex-executivos do banco, acusados de desvios de recursos, fraudes contábeis e gestão temerária. “O Banco Central tem a convicção técnica e jurídica de que, em juízo, demonstrará, de forma cabal, o modus operandi das gravíssimas irregularidades praticadas pelos autores da ação e que contribuíram decisivamente para levar o banco aos vultosos prejuízos apurados”, afirmou o procurador-chefe da instituição, Isaac Sidney Menezes Ferreira. Segundo ele, o Banco Central identificou, dentre outras práticas ilegais, a elevação artificial de resultados mediante a simulação de operações. “Tenho estrita confiança na área de supervisão do Banco Central, que, por meio de um trabalho sério e meticuloso, apurou graves ilícitos contra a disciplina de mercado”, acrescentou.
A defesa do BVA contra-ataca e atribui justamente ao Banco Central a responsabilidade pela deterioração patrimonial do banco. Entre a intervenção e a liquidação, o BVA passou de uma situação em que teria 76 centavos de ativo para cada 1 reais de dívida para a de 23 centavos de ativo para cada 1 reais de dívida. “O Banco Central está recorrendo a uma série de frases de efeito, em vez de explicar claramente o que aconteceu durante o regime especial (intervenção e liquidação). Dizer que tem documentos e não apresentá-los não é o que se espera de uma instituição como o Banco Central”, afirmou Cristiano Zanin Martins, sócio do escritório Teixeira Martins, que assessora o BVA. Na ação judicial, o banco acusa a autoridade monetária de ter demitido cerca de 150 colaboradores durante a intervenção, em vez de procurar uma solução de mercado para o banco; de ter sido omisso no cuidado com a carteira de crédito (de cerca de 4 bilhões de reais), não cobrando clientes e criando obstáculos para quem os que queriam pagar; e de ter liberado, na surdina, mais de 70 milhões de reais em garantias para alguns devedores.
Devido a esses “fatos danosos”, os executivos do BVA pedem uma indenização de pelo menos 3,4 bilhões de reais. Durante as investigações do Banco Central foram detectadas duas principais irregularidades: o repasse de 135 milhões de reais à empresa Peg Cred, que por sua vez, teria desviado mais de 100 milhões de reais desse montante a empresas de executivos do banco; e o pagamento de 94 milhões ao ex-presidente Ivo Lodo, entre 2009 e 2011, valor considerado incompatível pelo Banco Central com a remuneração mensal de 25 mil reais estipulada para o dirigente. No total, portanto, os desvios teriam ultrapassado os 195 milhões de reais. Além disso, à época do pedido de falência, o Banco Central apontou que o BVA concedia empréstimos sem respeitar os princípios de seletividade, garantia e liquidez e chegou acusar a empresa de auditoria KPMG de ter induzido depositantes, investidores e a autoridade monetária a erro.
Como consequência, Lodo foi banido por 20 anos do mercado financeiro, segundo penalidade administrativa aplicada pelo próprio Banco Central. Por ser uma autarquia federal, ligada ao Ministério da Fazenda, o Banco Central tem até 30 dias para informar o recebimento da notificação judicial. Considerando o recesso de fim de ano, isso só deve acontecer no início de fevereiro. Além do Banco Central, a ação movida pelo BVA também tem como alvo Carlos Alberto de Oliveira Andrade, dono do grupo Caoa, que teria agido com a intenção de desvalorizar a instituição, que ele próprio tentava comprar. Oliveira Andrade, que era sócio e principal cliente do BVA, teria agido estrategicamente e de má fé. Isso porque, por um lado, ele indicou que pretendia aumentar sua participação no banco, inclusive comprando a totalidade de seus papéis. Mas, por outro, segundo o BVA, o empresário retirava recursos da instituição.