Seis chineses foram acusados de espancar uma mulher até a morte num ataque brutal numa loja do McDonalds na China em 28 de maio, depois que ela se recusou a dar-lhes seu número de telefone. A polícia concluiu, três dias depois, que foi um caso de “homicídio doloso”, devido a “atividades de culto”. As identidades completas dos criminosos não foram tornadas públicas e uma parcela significativa da conversa online sobre o incidente tem refletido uma profunda desconfiança na polícia, na mídia oficial e no regime chinês.
Testemunhas da brutalidade, que ocorreu por volta de 21h em 28 de maio no McDonalds de um shopping na cidade de Zhaoyuan, província de Shandong, disseram que o grupo de seis estava pedindo a outros clientes seus números de telefone. A gangue incluía o pai chamado Zhang, duas de suas filhas adultas, um filho adolescente e duas mulheres adultas de sobrenome Zhang e Lü.
A vítima, identificada como sra. Wu, recusou fornecer seu número de telefone. “Vá embora”, teria dito ela repudiando uma das jovens, segundo testemunhas. O grupo, liderado pelo pai Zhang, logo se voltou sobre ela, disseram testemunhas. Uma mulher começou a bater-lhe com uma cadeira, enquanto Zhang a espancava freneticamente com um esfregão encontrado no local.
Vídeos e relatos de testemunhas mostraram Zhang batendo repetidamente na cabeça da jovem com o cabo de metal do esfregão, mesmo depois do objeto ter sido quebrado. “Quem interferir vai morrer!”, teria gritado o homem num momento, segundo um vídeo postado no Sohu, um website de compartilhamento de vídeo.
A gravação perturbadora rapidamente se espalhou pela internet. O vídeo mostra Zhang, um homem careca, golpeando repetidamente com sua arma de metal uma mulher caída no chão inconsciente e indefesa. O corpo da menina estava bloqueado da vista completa da câmera por uma divisória. Ouviam-se gritos das testemunhas apavoradas e talvez da vítima.
A polícia chegou às 21h23, mas os atacantes continuaram a bater na jovem, que a esta altura estava inconsciente e numa poça de sangue. A polícia, que estava nas proximidades, segundo relatos, os prendeu posteriormente, e logo anunciou que os seis criminosos eram membros de uma “religião do mal”, ou culto, e que pediam os números de telefone para recrutar mais membros.
A polícia disse que eles encontraram livros e materiais na casa de Zhang sobre o “Deus Todo-Poderoso”, também conhecido como “Luz do Oriente“, uma seita banida que tem sido implicada no rapto e violência contra cristãos na China, especialmente na década de 1990. As observações da polícia e relatórios oficiais indicaram também que, à luz do espancamento, seria lançada uma campanha especial contra todos os tipos de atividades de culto na província de Shandong.
A China Central de Televisão (CCTV), a emissora estatal oficial, entrevistou Zhang ao vivo na delegacia de polícia em 31 de maio. Ele admitiu ter matado a moça e disse que foi devido a sua fé no “Deus Todo-Poderoso”. Zhang disse que sua filha lhe disse que a vítima era um “demônio”, porque ela não forneceu seu número de telefone. Zhang disse que praticava a religião há sete anos.
Os internautas chineses manifestaram seu descontentamento com estas afirmações da reportagem. Eles argumentaram que não era comum que as identidades completas e os perfis dos agressores não fossem divulgados, e se queixaram que o caso de assassinato violento se concentrou excessivamente numa seita obscura.
Em contraste, os internautas disseram, sobre o caso do atentado à bomba na Região Autônoma Uigur de Xinjiang em 22 de maio (que as autoridades classificaram como um “ataque terrorista” de extremistas étnicos), que a polícia revelou no dia seguinte os nomes completos dos cinco participantes, incluindo testes de DNA dos quatro que foram mortos no incidente.
Neste caso, embora os atacantes fossem todos desempregados, Zhang possuía um Porsche Cayenne, avaliado em 2 milhões de yuanes (US$ 160-320 mil), segundo a CCTV. A reportagem diz que o grupo dirigiu o carro até o McDonalds no dia do ataque e que Zhang também é dono de outro carro de luxo, um apartamento e uma casa de três andares. Muitos internautas questionaram como ele poderia ser tão rico se ele não tinha emprego.
A matéria da CCTV mostrou ainda a carteira de motorista de Zhang por dois segundos, tempo suficiente para os internautas obterem seu nome completo, Zhang Lidong, e descobrirem onde era sua residência.
Os rumores se espalharam rapidamente que Zhang Lidong é o proprietário de uma mina de ouro e pagou subornos ao diretor do departamento de polícia local, Sun Baodong. A cidade de Zhaoyuan é conhecida por suas minas de ouro, mas nenhuma evidência foi apresentada sobre a relação entre Zhang e o diretor de polícia. O boato, no entanto, se tornou viral.
A polícia não respondeu às especulações. Milhares de comentários que pediam uma investigação sobre os vínculos de Zhang com a polícia foram excluídos da internet e os internautas reclamando da censura.
O blogueiro ‘@Jia Dahu’ tentou resumir os três elementos-chave do descontentamento dos internautas sobre a história até o momento. Como frequentemente ocorre na China, os pensamentos parecem representar mais um senso rudimentar de desconfiança e frustração quanto às autoridades chinesas do que uma teoria alternativa convincente do ataque.
A primeira queixa é que a delegacia de polícia está do outro lado da rua do McDonalds e que mesmo assim os criminosos não tinham medo da polícia. Alguns internautas viram nisso uma evidência de que eles teriam laços de algum tipo com a polícia. Em segundo lugar, está o fato de que Zhang possui um Porsche Cayenne – o que significaria que eles seriam razoavelmente ricos, o que na China normalmente também significa que eles teriam laços com o governo e o regime. E, em terceiro lugar, foi relatado que os atacantes não pararam de bater na jovem mesmo depois de a polícia chegar. Isto significaria que “eles têm algum poder”, escreveu Jia. Seus comentários foram amplamente compartilhados no Sina Weibo.
Outros ainda levantaram preocupações sobre a mídia estatal oficial ter associado estreitamente o ataque à seita que Zhang afirmou pertencer. O blogueiro ‘@Changji Geshi’ disse que a lei é para julgar e punir as ações das pessoas quando estas prejudicam os outros e não para julgar o conteúdo de seus pensamentos.