Aquisição da Lenovo chinesa ameaça segurança de produtos da Motorola

03/02/2014 22:46 Atualizado: 03/02/2014 22:46

Com a recente aquisição multibilionária da Motorola por uma gigante chinesa da internet, a Lenovo, mais uma empresa estatal da China conseguiu comprar o prestígio de uma marca internacional. Consumidores da Motorola, no entanto, deveriam olhar o histórico da Lenovo e começar a se preocupar que a marca com que estão familiarizados não oferecerá um produto confiável.

O Google anunciou em 29 de janeiro que venderia a Motorola Mobility para a empresa chinesa Lenovo por US$ 2,91 bilhões. A venda coloca a empresa chinesa no 3º lugar do mercado global de celulares, atrás da Apple e da Samsung Electronics.

Os Estados Unidos, Canadá, Austrália, Nova Zelândia e Reino Unido proibiram computadores da Lenovo em escritórios do governo como uma ameaça à segurança. As razões para a proibição podem transitar para os produtos da Motorola produzidos pela Lenovo.

“A proibição foi introduzida há quase dez anos, após testes de laboratório intensivos de equipamentos com chips da Lenovo que foram documentados com ‘backdoors’ embutidas em hardware e vulnerabilidades de ‘firmwares’”, afirma um artigo da Australia’s Financial Review de julho de 2013, que descobriu a proibição interna.

A reportagem citou fontes não identificadas nas comunidades de defesa e inteligência britânica e australiana, afirmando que a pesquisa classificada encontrou “modificações mal-intencionadas em circuitos da Lenovo”, que vão além de falhas de segurança típicas em eletrônicos, e “poderiam permitir que pessoas tivessem acesso remoto aos dispositivos sem o conhecimento dos usuários”.

Mais recentemente, no entanto, todos os escritórios do governo dos EUA foram proibidos de utilizar sistemas de Tecnologia da Informação da China, devido a ameaças de espionagem e ciberataque. A proibição foi incluída no orçamento federal americano de 2014.

“Eu sei factualmente que não existe uma única organização do governo dos EUA que usa Lenovo”, disse Farinaz Koushanfar, professora-associada de engenharia elétrica da computação na Universidade Rice, em Houston, Texas.

Koushanfar observou que se tratou de uma grande mudança para o governo dos EUA. Laptops da IBM costumavam ser muito usados em escritórios do governo, no entanto, após a Lenovo comprar a divisão de computadores pessoais da IBM por US$ 1,25 bilhão em 2005, eles mudaram para outras marcas, devido a preocupações de segurança.

O trabalho de Koushanfar se concentra fortemente na proteção da propriedade intelectual e nas ameaças de segurança na cadeia de suprimentos.

Ela disse que a recente aquisição pode trazer ameaças adicionais. Embora peças para telefones da Motorola possam ter sido fabricadas na China de qualquer forma, “elas ainda passavam por software de integração e controle nos Estados Unidos, e os chips eram projetados nos EUA”.

Agora, no entanto, a China não apenas fabrica os chips, mas também os projeta. Koushanfar disse: “Agora, eles nem sequer tem o controle sobre o fluxo do projeto.”

Empresas Estatais

A Lenovo é uma “guoyou minying”, ou uma empresa chinesa “estatal gerida privadamente”. Seu vínculo com o regime chinês é por meio de seu maior acionista, o órgão estatal ‘Academia Chinesa de Ciências’ (ACC).

Em março de 2012, 57,81% das ações da Lenovo eram públicas; 8,36% eram do CEO da Lenovo, Yang Yuanqing; 0,25% era de propriedade de seus diretores; e 33,58% pertenciam a ‘Legend Holdings Ltd.’.

A Legend Holdings Ltd. é a “empresa-mãe da Lenovo e a unidade de gestão de ativos da ACC”, afirma um relatório de janeiro de 2013 do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais. “A ACC detinha uma participação de 65% na Legend Holdings em 2009, fazendo da ACC a maior acionista da Lenovo com uma participação de 27%.”

O regime chinês tem particular interesse no uso de suas empresas estatais (EE) para comprar e investir em empresas estrangeiras. No primeiro semestre de 2013, a saída de investimento estrangeiro direto (IED) não-financeiro da China foi de US$ 45,6 bilhões, o que foi um aumento de 29% desde 2012, segundo o relatório anual de 2013 da Comissão Econômica e de Segurança EUA-China.

O motivo da China, afirma o documento, “é a aquisição de recursos e entrar em novos mercados no exterior”, e ao fazer isso “a China aumenta seu controle direto sobre empresas estrangeiras”. Outro motivo, afirma o texto, está relacionado com a manipulação da moeda e é destinado a “combater a depreciação do dólar em relação ao [renminbi, a moeda chinesa] e obter maior rendimento do que é o conseguido com o Tesouro dos Estados Unidos”.

A linha turva entre as empresas públicas e privadas da China levantam preocupações mais complexas, no entanto.

Os aspectos relacionados ao comércio dos investimentos estrangeiros da China “muitas vezes se mesclam com questões de segurança nacional”, afirma o relatório. Isto inclui “os esforços de coleta de inteligência estrangeira e espionagem – que têm como alvo a tecnologia, propriedade intelectual, segredos comerciais e outras informações confidenciais dos EUA – podem ser ocultados sob o pretexto de investimento estrangeiro em empresas contratadas e aprovadas pelo governo americano”.

Um plano do Partido Comunista

A recente aquisição da Motorola pela Lenovo está alinhada com um plano de longo prazo recentemente anunciado pela liderança chinesa, que inclui a compra de empresas de tecnologia estrangeiras para impulsionar as marcas de empresas estatais da China.

A aquisição segue uma tendência emergente em que empresas estatais chinesas estão comprando ou investindo pesadamente em empresas norte-americanas. Além isso, algumas empresas chinesas estão fazendo campanhas “Made in America”.

Por exemplo, em junho de 2013, a Lenovo abriu uma linha de produção de computadores na Carolina do Norte, dando a seus produtos um selo “Made in America”. Uma tentativa da empresa de telecomunicações chinesa ZTE de fazer parceria com uma empresa de Baltimore para vender um sistema de videoconferência “Made in America” foi interrompida pelo governo dos EUA.

“Isso é uma preocupação”, disse Daniel Katz, especialista em terceirização da produção. Os Estados Unidos não estão apenas perdendo negócios para a China por meio da terceirização da produção, disse ele, “mas também estão perdendo as empresas”.

Embora os novos negócios possam parecer bons negócios na superfície, eles também estão alinhados com uma nova diretriz do Partido Comunista Chinês (PCC), segundo seu 12º Plano Quinquenal.

A diretiva do PCC exige uma abordagem em três frentes para aumentar o investimento da China no exterior, afirma um relatório de 2013 do Congresso dos EUA. A primeira parte é para que as empresas de fabricação chinesa invistam no estrangeiro para construir marcas reconhecidas; a segunda parte é investir em pesquisa e desenvolvimento fora da China; e a terceira é definir metas para a aquisição de empresas estrangeiras para avançar a economia de alta tecnologia desejada pela China.

“O governo chinês emprega muitas ferramentas para efetivar essas metas, incluindo obter autorização para empresas chinesas investirem no exterior”, afirma o relatório.

E observa que a China representa um desafio único quando se trata de detectar problemas de segurança quando uma empresa estrangeira quer adquirir uma empresa dos EUA, uma vez que as empresas estatais da China “podem borrar a linha limítrofe entre segurança nacional e econômica”.

“A possibilidade de haver interesses do governo envolvidos ou uma estratégia coordenada por trás dos investimentos chineses geram preocupações de segurança nacional”, afirma o relatório. “Por exemplo, as tentativas das empresas chinesas de adquirir tecnologia estão intimamente próximas dos planos do governo chinês de subir na cadeia de agregação de valor de sua produção.”