Apesar do falatório, esqueça sobre reforma na China

07/03/2014 11:44 Atualizado: 07/03/2014 11:44

Não seria maravilhoso? Menos poluição. Mais dinheiro para os consumidores gastarem. Um final tranquilo para a desenfreada especulação imobiliária e o crescimento relativamente rápido do PIB. Há apenas um problema: As metas estabelecidas pelo primeiro-ministro chinês Li Keqiang em seu discurso de quarta-feira antes do Congresso Popular Nacional (CPN) não podem ser alcançadas, porque contrariam as leis da economia e da natureza humana.

Claro, os problemas com os planos ambiciosos do premiê Li estão todos inter-relacionados e as soluções apresentadas na maior parte provocam novos problemas. A única coisa que eles têm em comum é uma economia cronicamente não competitiva que sufoca a inovação e a produtividade.

Consumo

Comecemos com o consumo. Os líderes chineses têm sempre falado sobre impulsionar o consumo interno, ao passo que sua participação no PIB caiu de 47% em 1990 para 34% em 2011. Se tudo correr conforme o planejado, esse valor estaria acima de 60% em 2030.

Mas se você quer que as pessoas gastem mais, elas têm de ganhar mais dinheiro. Os salários aumentaram consideravelmente nos últimos anos, mas ainda não refletem o valor real criado pela força de trabalho chinesa. A maior parte deste valor é capturada por oligarcas e funcionários corruptos.

Se os salários subirem para níveis que permitam as grandes massas a gastar com vigor, a China não seria mais capaz de cumprir sua meta de crescimento. As empresas chinesas já são notoriamente pouco competitivas nos mercados mundiais, porque carecem de know-how e inovação para impulsionar verdadeiros aumentos de produtividade.

Moeda barata, terra barata, mão-de-obra barata e crédito barato constituíram as bases do rápido crescimento da China nas últimas três décadas. No entanto, esses elementos não apenas deixaram de serem baratos como antes, como também não servem para conduzir uma economia baseada no conhecimento.

Salários significativamente maiores levariam à falência muitos empregadores no setor privado antes que o aumento da renda elevasse a demanda agregada. E uma coisa é certa, pessoas que não têm emprego, não consomem muito.

O segundo problema com o consumo é que os chineses são forçados a economizar mais de sua renda, porque não existe um sistema de segurança social. Este não é um tema muito popular em Pequim, portanto, ele não aparece destacado no discurso de Keqiang.

Destruição ambiental

Então, falemos dos 3,8% do PIB em destruição ambiental irreversível que a própria China estimou em 2009, antes de fechar a boca rapidamente e interromper o relatório. Como muitas empresas no Ocidente sabem muito bem, você tem de pagar caro para uma economia mais verde. Em longo prazo, os benefícios superam os custos, mas o custo em curto prazo é enorme.

Novamente, as empresas chinesas não estão em forma para arcar com os custos de uma economia mesmo relativamente mais verde, porque elas são cronicamente ineficientes, não muito rentáveis e têm dívidas no montante de 150% do PIB. Para compreender a ineficiência agregada com que a economia chinesa opera, podemos olhar o consumo de commodities.

Em 2010, o PIB chinês constituía 9,1% da economia mundial (hoje é de 13%). No entanto, a economia utilizava 37,4% do cobre do mundo, 42,1% do alumínio, 57% do cimento e 42,4% do aço, segundo o Bank of America. Praticamente todos os outros países constroem mais com menos, e custará um alto preço fazer as empresas chinesas se equipararem, se é que isso é possível.

Crescimento e crédito

Por último, mas não menos importante, esqueça sobre reduzir a especulação imobiliária sem causar uma catástrofe na máquina de crédito da economia.

O milagre econômico chinês foi sempre baseado na impressão de dinheiro e criação de crédito. Mas quando o crescimento começou a crepitar em 2008, os planejadores centrais promoveram uma farra de crédito sem precedentes que expandiu todo o sistema bancário em US$ 15,4 trilhões ou 140% do PIB. Como comparação, o crédito bancário total nos Estados Unidos cresceu US$ 2,1 trilhões e está a menos de 100% do PIB.

Como de costume, imóveis eram a garantia preferida para a criação de empréstimos que sustentam a expansão do crédito, o que levou a preços estratosféricos. Porque este modelo funcionou tão bem – novos projetos de desenvolvimento equivalendo ao crescimento do PIB –, em breve não importava mais que ninguém fosse usar os espaços recém-criados. Assim, cidades-fantasma, como Ordos na Mongólia Interior, vieram a ter uma taxa de vacância de 30%. O mercado imobiliário na China é na maior parte apenas especulação.

Se você estourar a bolha, no entanto, e sufocar essa especulação, você transforma o crescimento exponencial do crédito – e, portanto, o crescimento do PIB – em compressão exponencial do crédito, semelhante ao que ocorreu na crise dos subprime nos EUA, com a diferença de que a crise na China é múltiplas vezes maior. Então, em vez de reformas, a única coisa que resta para Pequim fazer é continuar chutando a lata. Até que a estrada se acabe.