Apesar dos bilhões em investimento, China não pode salvar economia mundial

16/09/2015 10:56 Atualizado: 16/09/2015 10:56

Recentemente, a comunidade internacional finalmente começou a ter uma visão pessimista em relação à economia chinesa. As razões para esse pessimismo variam. Alguns acreditam que a campanha anticorrupção de Xi Jinping trouxe instabilidade política e, consequentemente, a recessão econômica. Outros acreditam que a intervenção direta do regime chinês no mercado de ações é a causa da crise econômica.

As pessoas quase nunca consideraram seriamente que é o próprio sistema econômico da China que torna difícil sua sustentabilidade. Apesar das expectativas otimistas de todos, a China nunca foi uma Arca de Noé, capaz de salvar a economia mundial.

O sonho chinês

Com o desemprego em ascensão e uma realidade econômica mais dura para as classes média e baixa da China, muitos chineses estão fazendo piadas sobre o conhecido “Sonho Chinês”, chamando-o de “Pura Ilusão”.

Poucos chineses estão cientes do “Sonho Chinês” que tem circulado na comunidade internacional. Este sonho foi o mesmo na Europa, América e África, onde os governos tiveram a fantasia de que a China iria abrir seu saco de dinheiro para investir em seus países, e impulsionar suas economias e oportunidades de emprego.

A China realmente fez isso. Tem feito grandes investimentos no exterior. Dados da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD) indicam que a China se tornou o terceiro maior investidor estrangeiro no mundo em 2013, logo atrás dos EUA que investiram U$ 338 bilhões e do Japão que investiu U$ 135 bilhões. De 2005 ao primeiro semestre de 2014, o investimento estrangeiro direto da China (IED) somou U$ 515,3 bilhões e os investimentos previstos totalizaram U$ 355.1 bilhões.

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Nos Estados Unidos, Grã-Bretanha e Alemanha, os investimentos da China aumentaram em ritmo mais acelerado. Entre 2007 e 2013, o investimento da China nos Estados Unidos aumentou 14 vezes. Entre os 50 estados norte-americanos, 35 deles receberam investimentos da China, com o estado de Nova York, Califórnia e Texas liderando. Os investimentos da China cobrem extensas áreas, incluindo energia, mercado imobiliário, indústria, finanças, serviços, informação, eletrônica, biotecnologia, projetos verdes e outros, gerando mais de 80 mil postos de trabalho nos Estados Unidos.

A Alemanha também se tornou um país popular para o investimento chinês. Em 2012, a Alemanha foi responsável por 38% dos projetos de Investimento Estrangeiro Direto da China na Europa, muito mais do que a Grã-Bretanha e França juntas.

Um investidor passa em frente a um ecrã digital que mostra os movimentos do mercado de ações em uma corretora de Xangai, em 01 de setembro de 2015 (Johannes Eisele / AFP / Getty Images)
Um investidor passa em frente a um ecrã digital que mostra os movimentos do mercado de ações em uma corretora de Xangai, em 01 de setembro de 2015 (Johannes Eisele / AFP / Getty Images)

Segundo dados do portal alemão “ The Statistics”, a China criou 2.500 empresas na Alemanha, gerando 12 mil novos postos de trabalho desde de final de 2014.

A indústria da banca de investimento ganhou muito com o mercado da China. Em 2014, a indústria teve um faturação recorde de U$ 6 bilhões com a segunda maior economia do mundo. A alemã MERICS China Research Center e o grupo norte-americano Rhodium publicaram um relatório conjunto prevendo que a China se tornará o maior investidor transfronteiriço do mundo até 2020.

A minha resposta a essas previsões otimistas é: Quanto maior a expectativa, maior a decepção. A recessão da China tem causado mau humor em todo o mundo, porque as expectativas do mundo em relação à China eram simplesmente elevadas demais.

O século da China

Pequim quer salvar a economia chinesa, mas não é capaz de o fazer. E o regime chinês está realmente ansioso para se tornar a 2ª potência econômica do mundo.

No entanto, isso parece não estar nas cartas agora.

Quando Xi Jinping e Li Keqiang chegaram ao poder, o solo, os rios, os lagos, o oceano e o ar do país estavam todos fortemente poluídos, e os três pilares principais que suportaram o desenvolvimento econômico da China durante quase 30 anos faliram.

Os analistas que previram que o século 21 seria o “século da China” não estão dispostos a aceitar o fato de que um país só pode sustentar seu desenvolvimento econômico sob duas condições:

Uma delas é que esse país deve ter uma enorme vantagem em termos de recursos. Isso inclui ter uma boa consciência da conservação de recursos, e ter excelência nos sistemas industriais, assim como os Estados Unidos e o Canadá, por exemplo.

A outra, é que deve ter tecnologia de ponta, como os Estados Unidos têm hoje em dia, e como o Reino Unido tinha antes da Segunda Guerra Mundial.

Tanto o Reino Unido como a China já foram apelidados de “fábrica do mundo”. O Reino Unido obteve o título devido à sua vantagem tecnológica durante a revolução industrial, enquanto a China ganhou o título apenas por ser a fábrica de montagem do mundo, portanto não pode ser comparada com o Reino Unido deste período. Uma vez que o custo do trabalho e do imobiliário deixar de ser barato na China, o capital internacional fluirá para outros lugares onde os custos são mais baixos.

A prosperidade da China, derivada de ser a fábrica do mundo, depende inteiramente da vantagem com os custos, ou seja, imobiliário e mão de obra baratos. A fim de aumentar o desenvolvimento econômico, a China tem, de forma imprudente, consumido recursos básicos. Como resultado, a água, o solo e o ar estão seriamente poluídos, e os minerais foram esgotados. De acordo com as estatísticas da Comissão de Desenvolvimento e Reforma Nacional, a China tem 118 cidades com seus recursos esgotados – cerca de 18% de todas as cidades do país –, afetando uma população de 154 milhões.

Outro ponto importante é que a China tem dinheiro para investir no exterior porque Pequim imprime dinheiro. Ganhou, portanto, outro título: o país nº1 do mundo na impressão de dinheiro.

Em janeiro de 2013, o 21st Century Business Herald da China realizou uma análise estatística em relação aos dados de 2008-2012 dos grandes bancos centrais do mundo. A conclusão foi: desde 2009, a oferta de moeda do Banco Central China havia ultrapassado o Japão, os Estados Unidos, e a zona do euro. A China se tornou a maior “máquina de fazer dinheiro” do mundo. Em 2012, o valor de novo dinheiro criado no mundo foi de mais de 26 trilhões de yuans, sendo a China responsável por mais da metade.

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Recessão

A China abriu sua economia ao resto do mundo há quase 40 anos. Antes de 2008, os países desenvolvidos todos sonhavam com  a possibilidade da China se tornar o paraíso de seus investimentos e o maior mercado de bens de consumo. Entretanto, depois de descobrirem que ambiente de investimento da China está longe do ideal, eles a abandonaram, um após o outro.

Depois da crise financeira mundial de 2008, muitos países voltaram a depositar suas esperanças na China, desta vez para salvar a economia global. No entanto, as pessoas intencionalmente ignoraram o fato de que, em comparação com os países que queriam ser salvos de uma recessão, como os pertencentes à União Europeia, a Nova Zelândia, ou a África do Sul, a China é um país muito mais pobre, com mais de 800 milhões de pessoas gastando menos de U$ 2 por dia. Além disso, a poluição ambiental é extrema, e possuem poucos ou nenhum benefício social.

No dia 22 de janeiro de 2015, um artigo publicado pelo Wall Street Journal em chinês, intitulado “O capital da China está em movimento novamente”, evocava este “Sonho Chinês”, dizendo: “Precisamos de um Bretton Woods Três para obter crescimento global com a China fornecendo o capital, e os EUA novamente absorvendo uma parte substancial do mesmo.”

Este sonho é completamente absurdo. Só agora estamos testemunhando o início dos deslizamentos da economia da China, em direção a uma recessão de longo prazo.

Esta é uma tradução resumida do artigo publicado por Qinglian em seu blog pessoal. Qinglian é uma proeminente economista e autora chinesa. Atualmente vivendo nos Estados Unidos, ela é autora de “China’s Pitfalls”, que fala sobre a corrupção na reforma econômica da China da década de 1990, e “The Fog of Censorship: Media Control in China”, que trata sobre a manipulação e restrição da imprensa na China. Ela escreve regularmente sobre questões sociais e econômicas  da China contemporânea.