Andy Weir, autor do romance sobre o qual o novo filme “Perdido em Marte” se baseia, esforçou-se para dar realismo ao seu mundo ficcional; tudo, desde o tipo de vida vegetal que poderia crescer na crosta árida do planeta vermelho até a força de sua gravidade (um terço da gravidade da Terra), tudo foi baseado nos mais recentes dados científicos.
Entretanto, quando chegou a hora de escolher quando a história teria lugar, Weir teve que se afastar do reino dos fatos e partir para a especulação. Escolheu o dia 7 de novembro de 2035 como o dia em que sete homens de uma tripulação da NASA iriam pousar em Marte.
A realidade é que uma missão tripulada a Marte exige a superação de uma ampla gama de obstáculos tecnológicos, assim como a resolução de problemas éticos e financeiros.
A década de 2030 é a mais falada para a realização da missão em Marte planejada pela NASA, que definiu como meta provisória o ano 2039 para que suas botas espaciais pisassem no chão marciano pela primeira vez. No entanto, a razão da data escolhida pela NASA pode ter como motivo tanto fatores psicológicos como práticos – 2039 ainda soa razoavelmente próximo, em comparação com a década de 2040, por exemplo.
Abhijeet Rathore, ex-engenheiro da Agência Espacial da Índia, acredita que este seja o caso. Ele afirmou em um email que “2040 seria muito distante e prejudicaria a motivação das pessoas e, consequentemente, o financiamento [para a realização da missão]”. É possível que ele tenha razão.
A realidade é que, uma missão tripulada a Marte exige a superação de uma ampla gama de obstáculos tecnológicos, bem como problemas éticos e financeiros, de modo que a década de 2030 é uma data baseada mais em capacidades técnicas do que em uma probabilidade realista.
A grande distância entre a Terra e Marte significa que demorará nove meses até que os astronautas cheguem lá, quando as órbitas de ambos os planetas estiverem alinhadas. Isso significa que o equipamento existente usado nas missões da Estação Espacial Internacional (ISS) terá que ser modificado, e pode levar décadas até que a nova tecnologia seja construída, aperfeiçoada e testada.
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Alguns desses instrumentos já existem. A NASA lançou a “Amanhecer”, a primeira sonda espacial que usa propulsão iônica, para o espaço em 2007. Os propulsores de íons são alimentados por eletricidade, que pode ser abundantemente gerada no espaço exterior através de painéis solares. Esta parece ser uma eficiente substituição para o combustível de foguete, que é demasiado pesado para missões de longa distância.
A propulsão de íons é suficiente para empurrar naves espaciais no espaço, mas é necessário um impulso mais poderoso para descolar da superfície de Marte, no momento do regresso à Terra. A SpaceX já está testando motores Raptor, que usam metano como combustível, uma substância abundante em Marte.
Os astronautas também vão precisar de muito espaço para se movimentarem e exercitarem durante a viagem para Marte – em gravidade zero, o corpo humano pode deteriorar-se rapidamente sem exercícios constantes, e por isso é necessário um “habitat espaçoso”. A NASA já projetou um habitat espacial de 17 por 5 metros, sem incluir o propulsor de íons e a cápsula espacial que transporta os astronautas. Para economizar em massa, o habitat espacial poderá ser feito de material insuflável, e a NASA está atualmente testando um módulo deste material na ISS.
Outros aparelhos espaciais ainda estão apenas na fase conceitual. A NASA planeja enviar um gerador de oxigênio em um rover para Marte em 2020. O dispositivo, chamado de Mars Oxygen In-Situ Resources Utilization Experiment (MOXIE), retirará dióxido de carbono da fina atmosfera empoeirada do planeta, e o transformará em monóxido de carbono e oxigênio puro.
“Nós não podemos transportar todo o oxigênio da Terra. Portanto, há planos para enviar uma carga de antemão, que irá produzir oxigênio para a tripulação que chegará mais tarde”, disse Rathore.
A atmosfera de Marte é muito mais fina do que a da Terra, o que se traduz em uma entrada na atmosfera muito mais rápida, e um atrito e calor muito mais elevados. A aterragem da cápsula espacial em Marte implica usar um escudo térmico especial, que seja leve e resistente o suficiente para desacelerar a descida da cápsula, mas que ao mesmo tempo não pegue fogo no processo.
Escudos de calor para cápsulas de menores já foram utilizados em missões a Marte anteriores, mas os seres humanos são muito mais delicados do que um rover. A NASA está atualmente analisando ideias de estudantes sobre como construir um escudo térmico insuflável grande o suficiente para uma cápsula espacial multiton, através do seu desafio anual “Big idea challenge”.
No entanto, o maior obstáculo para uma missão tripulada a Marte não diz tanto respeito à logística e tecnologia, e sim à saúde e segurança humana. No espaço, os astronautas absorvem a radiação de raios cósmicos que, ao contrário de raios solares, não podem ser facilmente bloqueados e a exposição aos mesmos é um fator de risco para o desenvolvimento de câncer.
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Um estudo feito em 2014 pelo Public Library of Science descobriu que permanecer apenas 18 meses, para as mulheres, e 24 meses, para os homens, na ISS pode gerar um aumento de 3% no risco de câncer, o máximo permitido pela NASA a seus astronautas. Uma viagem de ida e volta a Marte poderia facilmente exceder essa quantidade de tempo.
Mesmo se todos estes desafios puderem ser superados, é preciso saber se o público está realmente disposto a oferecer os fundos necessários para superá-los, e essa é uma outra questão completamente diferente. A construção de um habitat para o espaço e o teste de todos os equipamentos espaciais poderiam facilmente custar centenas de milhares de milhões de dólares, e a NASA já está com pouco dinheiro.
O atraso recente do lançamento da cápsula espacial Orion, que estima-se custar de US $8.5 a $10.3 bilhões, foi atribuído à falta de fundos por Lamar Smith, presidente da House Science Committee. Além disso, o público já manifestou relutância em gastar mais.
Em um inquérito social geral de 2012, apenas 20% dos norte-americanos apoiaram mais financiamento para a exploração do espaço; 40% pensavam que o financiamento foi adequado, e 30% queriam baixá-lo. Durante a Guerra Fria, a NASA pôde contar com um apoio generoso devido ao medo do público em relação à União Soviética; hoje, há apenas um grupo eclético de entusiasmados com a colônia em Marte.