As campanhas políticas brasileiras vêm, eleição após eleição, apresentando um mesmo enredo: na busca irrefreada de votos, o candidato faz gordas promessas, mas, quando no poder, entrega magras realizações. É incrível como nossos políticos são criativos na hora de prometer, mas agudamente incompetentes no momento de honrar a palavra empenhada. O filme da ilusão do povo é conhecido e, como 2014 é ano eleitoral, sempre é tempo de revê-lo e, dessa forma, tentar melhorar o seu final.
Ora, em época de tamanho acesso à informação, o festival de vazias promessas eleitorais só pode ser atribuído à má-fé, à mentira ou, na melhor das hipóteses, ao descaso com a verdade. Ocorre que não deveria ser assim. A lei, sem meias palavras, estabelece firmes requisitos normativos com vistas a impedir o falseamento do jogo democrático. Objetivamente, no registro eleitoral, os candidatos a prefeito, governador e presidente da República devem apresentar as respectivas propostas defendidas (art. 11, IX, da Lei 9504/1997). Uma vez registradas pela Justiça Eleitoral, as propostas e programas de governo traduzem ato jurídico perfeito, vinculando o candidato aos termos prometidos, bem como ao rol de preceitos políticos traçados na Constituição.
Entre tais preceitos, a Emenda Constitucional nº 16, de 4 de junho de 1997, modificando a redação do art. 14, § 5º, da CF/88, autorizou a possibilidade de reeleição do presidente, governadores e prefeitos. Acontece que a referida norma constitucional não atua como salvo-conduto a todo e qualquer governante que aspira a recondução eleitoral. Na democracia, a reeleição é, em tese, um fenômeno de natureza extraordinária, pois a regra é a alternância do poder. Aliás, a rotação dos partidos no governo é uma autêntica medida de proteção da moralidade pública, evitando a criação de feudos de interesses espúrios e distantes da necessária decência política.
Falando nisso, é sabido que a Constituição é um todo normativo que, para ser eficazmente interpretada, precisa de um olhar sistêmico e hermeneuticamente integrado. Nesse contexto constitucional concatenado, o art. 37 da Lei Maior estabeleceu a moralidade como um princípio cogente da administração pública direta e indireta. Consequentemente, exsurge a radiante certeza de que candidato mentiroso ou inconfiável, por não cumprir e honrar a palavra empenhada perante a Justiça Eleitoral, não tem condições morais de participar do jogo democrático e, muito menos, almejar ser reeleito.
Em outras palavras, a reeleição foi criada para ser séria e não maquiada por tintas de falsidade. O problema é que seriedade parece ser uma palavra proibida no mundo da política, um mundo no qual os decentes são tratados como tolos, enquanto os safados ganham holofotes de celebridades. Enfim, a lógica da política brasileira é completamente invertida, fragilizando os preceitos éticos que deveriam conduzir e pautar uma vida pública dirigida à promoção da honra, da honestidade e da verdade democrática. Aqui chegando, a questão que fica é uma só: até quando a mentira compensará no Brasil?
Sebastião Ventura Pereira da Paixão Jr. é advogado especializado em direito do estado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e em direito previdenciário pela Universidade de Caxias do Sul (UCS). Escreve sobre questões econômicas, políticas e jurídicas relativas à proteção das liberdades, da democracia, do progresso econômico e social e do Estado de Direito
Esse conteúdo foi originalmente publicado no portal do Instituto Millenium