Acusações de monopólio na China servem ao monopólio no poder

08/08/2014 17:06 Atualizado: 08/08/2014 17:06

O Comitê Nacional de Desenvolvimento e Reforma (CNDR) da China tem estado bastante ocupado ultimamente protegendo os consumidores chineses do “comportamento monopolista” de empresas ocidentais. Ou não.

Na verdade, as acusações contra as empresas americanas Microsoft e Chrysler e as empresas de automóveis alemães Audi e Daimler visam claramente a garantir outro monopólio: o monopólio do Partido Comunista Chinês (PCC) no poder.

Se há uma coisa que economistas de diferentes escolas de pensamento concordam é que monopólios são ruins; principalmente para o consumidor, mas também para a economia como um todo. Uma empresa maximiza seu lucro criando perdas para os consumidores e outros produtores potenciais semelhantes.

Por isso, deveria ser uma boa notícia se a China apertasse o cerco contra a Microsoft e a Daimler para reduzir os preços para os consumidores. No entanto, estamos falando da China, portanto, as coisas não são tão simples assim.

Primeiro de tudo, precisamos esclarecer algumas coisas. Mesmo se os revendedores de carros conspirassem para vender peças de reposição a um preço mais elevado, isso seria um comportamento oligopolista, não um comportamento monopolista. Além disso, mesmo se a oferta de uma série de peças (digamos, apenas as de carros Mercedes) for um monopólio – o que é –, clientes ainda têm a opção de comprar outro carro, que tenha peças de reposição mais baratas.

Se todos os fabricantes de automóveis na China conspirassem para manter os preços de peças de reposição altos, então, novamente, estaríamos falando de um oligopólio e não de um monopólio.

No caso da Microsoft, que o regulador estatal acusa de ter uma posição de monopólio com seu sistema operacional Windows, isso se torna ainda mais ridículo. De acordo com vários estudos, a grande maioria dos PCs na China opera com versões piratas do Windows, por isso, a Microsoft dificilmente está se beneficiando.

Empresas estatais

Claro, o erro de rotulagem da alegada transgressão é apenas uma brincadeirinha se comparado com os verdadeiros monopólios na China: o sistema bancário, as telecomunicações e a exploração de recursos naturais.

Sim, há cinco bancos estatais diferentes e um punhado de bancos privados menores, mas o PCC controla efetivamente os cinco grandes e eles desfrutam de acesso monopolista do financiamento do banco central. Desta forma, você vê taxas de juros reais negativas sobre os depósitos por toda a parte, e os consumidores têm o privilégio de financiar os empréstimos no país e o frenesi de construção – o que representa uma perda substancial do poder aquisitivo da população.

Outro exemplo é a China Mobile, que acumula dezenas de bilhões de dólares em dinheiro e paga dividendos consideráveis a seu proprietário majoritário: o governo. Por que não passar algum desse excedente para os consumidores? Não, muito obrigado.

Claramente, o CNDR está tão ocupado investigando as montadoras estrangeiras que não têm a capacidade de olhar para estes assuntos triviais.

É a economia

Tudo o que serve ao regime no poder tem sua serventia, e neste caso o assédio a algumas empresas estrangeiras percorre um longo caminho para alcançar duas coisas.

Em primeiro lugar, as investigações e penalidades potenciais (1-10% do total das receitas de 2013) agradarão um aliado da China: a Rússia. A Rússia tem sido golpeada com sanções desagradáveis recentemente pelo Ocidente, por isso, provavelmente ela mexeu alguns pauzinhos para mostrar aos países ocidentais que não está sozinha nesta refrega econômica.

Mas, mais importante, a China também se beneficia quando obriga essas empresas a baixarem seus preços. O mercado imobiliário em queda na China está ferindo a confiança dos consumidores e alguns no terreno indicam vendas decrescentes de grandes propriedades, o que inevitavelmente leva a maior desaceleração.

Preços mais baixos poderiam impulsionar os gastos dos consumidores em itens mais caros, embora apenas por um curto prazo, e o regime do PCC precisa de uma economia vivaz para reduzir as chances de agitação social.

Empresas se submetem

Mas a parte realmente triste da história é que a maioria das empresas está se curvando para atender aos desejos do regime chinês. A Daimler e a Audi já anunciaram cortes de preços em peças de reposição. A Microsoft disse que está cooperando com o regime.

Empresas de automóveis alemãs são especialmente vulneráveis às demandas. Audi, BMW e Daimler venderam 630 mil carros na China no ano passado e quase todo seu crescimento vem de lá.

Mas eles não são os únicos. Além da censura desenfreada na China (como o Facebook que foi banido do país), o LinkedIn admitiu recentemente que também censura os contas de seus usuários ocidentais se estes publicarem certa informações sensíveis ao regime chinês, por exemplo, sobre a prática espiritual do Falun Gong.

Exemplo do Google

Após ter sido forçado a realizar autocensura e sofrer numerosos ciberataques, o Google saiu da China em 2010. Mas sua receita aumentou 250% desde então, além de outras métricas financeiras.

Seria bom ver mais empresas ocidentais seguirem a abordagem do Google. Infelizmente, para as empresas que têm de vender produtos físicos, elas não podem facilmente mudar para outro local, e isso é uma ilusão.