Será que o desapontamento com a China está por trás da visita apressada do presidente vietnamita à Washington?
Visitas de chefes de Estado normalmente levam meses para organizar, mas o presidente vietnamita Truong Tan Sang está indo a Washington às pressas, logo após um encontro evidentemente turbulento com os líderes chineses. Será que Sang e seus colegas decidiram pagar o preço que os EUA exigem por uma “parceria estratégica”?
No início de junho, funcionários do Departamento de Estado dos EUA disseram a um subcomitê do Congresso que laços mais estreitos com o Vietnã, em particular a venda de armas, estariam suspensos até que houvesse “melhoria continuada, demonstrável e sustentável de sua situação de direitos humanos”. Os funcionários colocaram no registro público a mensagem de que diplomatas norte-americanos têm dialogado privadamente por alguns anos. Seu testemunho em grande parte passou despercebido, exceto pela mídia online, que atiçou o fogo da dissidência no Vietnã.
Coincidentemente, a polícia vietnamita prendeu mais um blogueiro em 13 de junho, acusando Pham Viet Dao de “abusar de seu direito de liberdade de expressão para prejudicar os interesses do Estado”. De acordo com a Associated Press, 43 dissidentes foram presos este ano, o dobro do ritmo de 2012. Além disso, há evidências de que o braço da segurança cibernética da polícia do Vietnã implantou tecnologia de vigilância FinFisher – produzida pela Gamma Internacional do Reino Unido – para inserir software de espionagem em computadores e smartphones de pessoas que acessam blogues dissidentes.
Hanói não tem recebido diligências norte-americanas sobre questões de direitos humanos. Fiéis do Partido Comunista Vietnamita (PCV) têm alardeado que o Vietnã permite grandes liberdades democráticas, temendo que o verdadeiro objetivo de Washington seja derrubar o regime.
A repressão aos blogueiros parecia manifestar uma inclinação do regime em relação à China, o inimigo dos dissidentes do Vietnã. Durante anos, blogueiros dissidentes têm esfolado o regime afirmando sua incapacidade de defender os interesses do Vietnã contra o vizinho gigante. Por exemplo, a solidificação gradual da China de sua reivindicação de “soberania indiscutível” sobre a maior parte do Mar do Sul da China, incluindo as águas ao largo da costa do Vietnã.
As forças navais e aéreas do Vietnã, embora não insignificantes, não são páreas para as chinesas. Ao invés de arriscar um confronto sobre rochas e recifes disputados – e possíveis depósitos de petróleo e gás – os governantes do Vietnã têm procurado frear a agressão chinesa mobilizando o apoio de parceiros da ASEAN (Associação das Nações do Sudeste Asiático) e forjar “relações estratégicas” com os Estados Unidos e outras potências extrarregionais. Os resultados destes esforços diplomáticos têm sido modestos. Dez membros da ASEAN têm se queixado sobre a “centralidade” em assuntos regionais, mas não conseguem estabelecer uma frente comum em relação às extensas reivindicações territoriais da China. Enquanto isso, cauteloso de ser usado para defender ilhotas vietnamitas ou filipinas, os Estados Unidos insistem em “não tomar partido” nas disputas territoriais. Preocupado também que a superpotência ascendente retalie em outras áreas, Washington e a maioria das capitais da ASEAN têm se esquivado de desafiar diretamente a busca por hegemonia de Pequim em águas que ficam entre Hong Kong e Cingapura.
As reivindicações de Pequim são baseadas em registros de visitas de pescadores de séculos atrás. Em contraste, as Filipinas, Malásia, Brunei e Vietnã contam com a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (CNUDM) e outras leis internacionais. Os políticos em Washington concordam que o emaranhado de reclamações deve ser desembaraçado em referência aos preceitos legais. Mas esta postura é prejudicada pelos repetidos fracassos dos EUA em ratificar a CNUDM e dos quatro Estados principais da ASEAN em resolver reivindicações conflitantes entre si. A postura não oferece nenhuma pista para o curso de Washington se Pequim continuar a mordiscar seu caminho em direção a um fato consumado.
Enquanto as tensões aumentam, vietnamitas não-comunistas e uma facção significativa no PCV pediram uma aliança econômica e militar concreta com os EUA. Tem havido progresso em direção à adesão do Vietnã na parceria econômica trans-Pacífico projetada pelos EUA. Embora muitos líderes partidários permaneçam céticos sobre as intenções norte-americanas, nos últimos quatro anos, tem sido notável a expansão das consultas com as forças armadas norte-americanas. Em junho, por exemplo, membros seniores do Estado-Maior do Vietnã visitaram bases norte-americanas.
Até a semana passada, este tipo de flerte militar-a-militar, concebido para sinalizar a Pequim que Hanói tem opções, parecia ter atingido seus limites naturais – visitas amigáveis e algum treinamento em atividades não-combativas como operações de busca e salvamento. Um ano atrás, o Vietnã rejeitou a proposta do ex-secretário da defesa Leon Panetta de sediar rotações de tropas e navios de guerra norte-americanos.
Mais uma vez nesta primavera, Pequim tem flexionado seus músculos marítimos. Estranhamente, Hanói mal reagiu. Em maio, o Vietnã registrou queixas por pura formalidade sobre o tratamento áspero dado a pescadores vietnamitas e negou num relatório da PetroVietnam que navios chineses houvessem assediado um dos navios de pesquisa da empresa estatal de petróleo. O porquê disso ficou claro em 14 de junho, quando Hanói anunciou que o presidente Sang faria uma visita de Estado à China.
A viagem de Sang em meados de junho, a primeira de um alto líder vietnamita desde que Xi Jinping foi empossado como presidente da China em março, foi carregada de ritual e significado por mais de um milênio de tais missões. Os vietnamitas são orgulhosos com justiça de uma tradição de resistência bem-sucedida contra invasores do exército chinês. Também ao longo de sua história, eles muitas vezes induziram a China a respeitar a autonomia do Vietnã projetando deferência. No mês passado, Hanói se prostrou vigorosamente.
A orquestração da visita de Sang sugere que, não obstante os atritos, os líderes do Vietnã permanecem esperançosos de que os líderes da China não trairão um partido tão similar ao seu. Não houve grande estresse na “relação estratégica global” dos dois países. As assinaturas foram postas num maço de acordos de rotina.
Além de algumas repreensões, Sang pareceu sentir-se em casa em Pequim. Xi Jinping prometeu que a China “tomaria ativamente medidas eficazes e drásticas” para reduzir o desequilíbrio de US$ 16 bilhões no comércio bilateral. Tais promessas foram feitas antes sem grande efeito. No Mar do Sul da China, Sang não tinha nada para mostrar, exceto um acordo sobre uma linha direta para discutir incidentes envolvendo pescadores. Ao rejeitar menções a CNUDM, que ambos os países são signatários, e outras prescrições do direito internacional, como a fundação de uma solução territorial, Pequim deu um passo atrás nas garantias dadas ao Vietnã há 20 meses, quando Hanói concordou na negociação bilateral de reivindicações às Paracels, ilhas que a China tomou do Vietnã do Sul em 1974. Estas conversas não fizeram progressos visíveis e, admitindo o fato, Xi Jinping e Truong Tan Sang concordaram em intensificá-las.
A decisão do Politburo vietnamita de enviar Sang a Washington sugere que os líderes do Vietnã ficaram abalados pelo que Xi Jinping e seus colegas disseram a Sang em privado e estão mais favoráveis a lidar com os EUA numa relação de defesa mais íntima. O líder dissidente iria a julgamento no dia anterior da viagem de Sang ser anunciada, mas o julgamento foi adiado indefinidamente. Os líderes do Vietnã podem esperar que o presidente Barack Obama se contente com tais gestos cosméticos. Se assim for, eles estão provavelmente equivocados.
Como a administração admitiu ao Congresso no mês passado, “o povo norte-americano não apoiará uma melhoria dramática nas relações bilaterais sem progressos demonstráveis em matéria de direitos humanos”. Na verdade, os EUA não precisam de um vínculo militar mais robusto com o Vietnã para defender seus interesses no Mar do Sul da China. Eles podem se dar ao luxo de assumir uma postura de longo prazo e surpreender os cínicos permanecendo firmes sobre os direitos humanos. Com John Kerry e Chuck Hagel, veteranos da Guerra do Vietnã, agora na supervisão da política externa e de defesa dos EUA, é bem provável que isso seja exatamente o que os EUA farão.
David Brown é jornalista freelance e diplomata norte-americano aposentado que trabalhou no Vietnã por muitos anos. Copyright © 2013 Centro Whitney e Betty MacMillan para Estudos Internacionais e Regionais da Universidade de Yale
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