Um funcionário da inteligência canadense afirma que, embora as tentativas de Pequim de interferência estrangeira possam não ter tido um impacto decisivo no resultado da eleição de 2021 no Canadá em um determinado local, essas atividades secretas ainda podem fazer com que o candidato eleito se sinta em dívida com o regime comunista.
Em uma audiência a portas fechadas, o Inquérito Público sobre Interferência Estrangeira recebeu um resumo de entrevistas com funcionários da inteligência que diziam: “mesmo que a interferência estrangeira não tenha levado diretamente à eleição de um determinado candidato, essa interferência poderia, no entanto, ter um impacto sobre o relacionamento com esse candidato e, por extensão, sobre as comunidades que ele representa”.
Por exemplo, ele observou que “a interferência estrangeira da RPC [República Popular da China] poderia afetar as ações de um candidato durante seu mandato se ele se sentisse em dívida com a RPC por ter ajudado em sua eleição”.
As observações fizeram parte do depoimento de um analista sênior de inteligência, não identificado, de um setor do Serviço de Inteligência de Segurança do Canadá encarregado de coletar, avaliar e relatar informações relevantes para a China, incluindo casos de interferência política estrangeira. O funcionário é o diretor geral do Escritório Regional de Toronto do Serviço Canadense de Inteligência de Segurança (CSIS, na sigla em inglês).
A testemunha disse que um indivíduo que se acredita ser um representante de um estado estrangeiro havia apoiado campanhas em vários locais durante a eleição de 2021. Embora as atividades do agente maligno pudessem parecer legítimas, o funcionário disse que “os relacionamentos e as atividades se tornaram mais claramente uma preocupação de segurança nacional com base no contexto”.
O depoimento do funcionário do CSIS também descreveu as preferências políticas em evolução da China e sua postura “agnóstica em relação aos partidos”, indicando que Pequim busca influenciar as eleições dos candidatos com base em seu alinhamento com os interesses estratégicos do regime, e não em suas afiliações partidárias.
“A sensação de que o resultado preferido da RPC era um governo minoritário formado pelo LPC [Partido Liberal do Canadá, na sigla em inglês] pode significar que o LPC foi percebido naquela eleição como sendo mais favorável à RPC do que o Partido Conservador do Canadá (CPC)”, afirmou o resumo.
“Esses relatórios não significam que os esforços da RPC estavam concentrados apenas na promoção dos candidatos do LPC. Também estavam sendo feitos esforços para construir relacionamentos com o CPC para suavizar a posição do partido em relação ao PRC.”
A investigação sobre a interferência estrangeira foi lançada no ano passado em resposta a relatos da mídia sobre a interferência de Pequim nas eleições federais de 2019 e 2021. O funcionário do CSIS prestou depoimento durante a fase inicial da investigação em fevereiro e março. Atualmente, a investigação está se concentrando em depoimentos sobre alegações de interferência.
Documentos resumidos de inteligência apresentados na investigação dizem que as autoridades chinesas no Canadá canalizaram aproximadamente CA$250.000 para financiar 11 candidatos durante a eleição de 2019.
Necessidade de “mais ferramentas”
O funcionário do CSIS disse que a “natureza ambígua” das atividades da China e o conhecimento prévio necessário para entender a “natureza subversiva” desses atos tornam o combate à ameaça de interferência estrangeira de Pequim um desafio.
O funcionário disse que o CSIS precisa de mais ferramentas para combater a ameaça.
“Por exemplo, a interferência estrangeira não é um delito criminal e a lei do CSIS está desatualizada”, diz o resumo.
Frente unida
O documento cita outro funcionário do CSIS dizendo que as táticas da organização United Front da RPC incluem “preparar e incentivar sutilmente agentes e representantes” a realizar atos em benefício de Pequim sem que eles “sejam diretamente solicitados”.
“Isso pode dificultar a atribuição de interferência estrangeira à RPC”, diz o resumo.
O funcionário, que é o diretor geral do CSIS Prairie Office, também disse que a agência de inteligência está limitada em suas ações devido a “riscos operacionais”.
O funcionário “descreveu casos em que o CSIS sabia que uma atividade era realizada em nome de um estado estrangeiro, mas não podia agir com base nessa informação”, diz o resumo.